Dez milhões de euros. Raras vezes a contratação de um treinador terá sido, ao mesmo tempo, tão dispendiosa e tão lucrativa. A verdade é que Ruben Amorim já retribuiu à confiança do Sporting o investimento feito e com lucros apreciáveis. O regresso à Liga dos Campeões garantiu, desde já, nunca menos de 23 milhões de euros.

Ruben é, de resto, a face maior do grande sucesso do Sporting 2020/21. A equipa tem, da cabeça aos pés, a marca registada do jovem treinador e isso é o maior elogio que alguém pode fazer a um treinador.

Ideias há muitas e grande parte delas são boas. O mais difícil é ser capaz de passá-las ao plantel e, numa segunda fase, fazer com que todos os jogadores acreditem nelas. Ruben fez uma e outra coisa, com uma facilidade notável.

O Maisfutebol escolhe as sete figuras-chave do novo campeão nacional. E começa pelo nome obrigatório.

1. RUBEN AMORIM: comandante de mentes

Demérito dos rivais? Também. Mérito do Sporting e do seu treinador? Sobretudo isso. Aos 36 anos, Ruben já tem um palmarés de meter inveja a muitos: um campeonato nacional e duas Taças da Liga. Mais do que os resultados, o que fica deste primeiro título é a consistência – desportiva, emocional, mental – que o técnico ofereceu a uma equipa (e a um clube) que têm sobrevivido numa montanha-russa de comportamentos esquizofrénicos ao longo das últimas duas décadas.

Ruben sabe que deve moderar o comportamento no banco de suplentes, mas essa é mesmo a única observação negativa que há a fazer-lhe. A forma como montou e geriu o onze inicial, a capacidade de criar empatia com o grupo de trabalho e o à-vontade genuíno e simpático com que lidou com a comunicação social durante toda a temporada só merece um adjetivo: excecional.

Um comandante de méritos inquestionáveis. O menino que começou a seguir na Ford Transit do pai o futebol para todo o lado.

2. SEBA COATES: fundamental atrás e à frente

A sexta temporada do internacional uruguaio em Alvalade é também a melhor de todas. De longe. A tentação será agora destacar a preponderância que o defesa central teve no ataque (sete golos), mas o mais justo será começar pelo mais importante: a estabilidade defensiva.

O defesa errático, às vezes até desconcentrado, desapareceu. Coates fez uma época de elevadíssimo nível, cometendo pouquíssimos erros na liderança do trio defensivo e, agora sim, acabando por ser fundamental nos momentos em que subiu para jogar a ponta-de-lança.

Na duríssima vitória em Barcelos por 2-1, Coates marcou os dois golos na reta final (83 minutos e 90 + 1); depois fez aos 90 + 3 o 2-1 decisivo sobre o Santa Clara; marcou também o primeiro golo (aos 83 minutos) na recuperação que deu o 2-2 contra o Belenenses. Fundamental, um grande capitão.

3. PEDRO GONÇALVES: raça nortenha

O Sporting acertou em cheio ao contratar o médio-ofensivo (que afinal é avançado) ao Famalicão. Começou a marcar à quarta jornada e nunca mais parou. É um jogador curioso mesmo para quem o analisa. Nos jogos em que estava mais apagado, Pedro lá conseguia identificar um espaço vazio e fazia uso do seu remate mortífero. Jogava pouco e marcava.

Essas foram as exceções. Nas tardes/noites mais inspiradas, Pote foi dinâmico, instigador e revoltado. Aquela raça nortenha foi muitas vezes determinante. Ruben, aliás, chegou a falar nisso e a destacar o arreganho de Pedro e de outro nortenho, Nuno Santos.

Chega a esta altura com 18 golos no campeonato e a lutar com Seferovic pela Bola de Prata. Campeonato fantástico. O filho da dona Maria roupeira está um craque.

4. JOÃO PALHINHA: afirmação internacional de um leão

Depois de duas épocas de muito bom nível em Braga, o médio defensivo esteve com um pé fora do Sporting, mas acabou por ficar. E em boa hora o fez. Agarrou naturalmente a titularidade no Sporting e foi chamado pela primeira vez à Seleção Nacional – conseguiu já três internacionalizações e um golo.

Palhinha foi imenso, um poço de força no meio-campo. Fantástico na proteção ao setor mais recuado, fundamental na pressão e recuperação de bola, importante a receber e entregar. Um médio cada vez mais afirmativo e símbolo da regeneração dos leões.

É uma das extensões prioritárias de Ruben Amorim dentro do campo. Viu-se envolvido num caso infeliz, não por culpa própria. Viu um amarelo no Bessa, que o afastaria do dérbi contra o Benfica, mas o Sporting recorreu e o Tribunal Arbitral do Desporto deu-lhe razão.

5. MATHEUS NUNES: o talismã dos jogos grandes

O médio de 22 anos foi uma espécie de 12º jogador. Grande qualidade técnica, forte fisicamente, um executante com um futuro radiante à espera. Matheus Nunes marcou três golos esta época e reparem bem na ‘pontaria: dois foram ao Sp. Braga e um foi ao Benfica. Dois deles decisivos.

Só lhe faltou marcar ao FC Porto e, no Dragão, esteve muito perto de fazê-lo. É um dos grandes nomes da temporada e um candidato óbvio a ser muitas vezes titular na próxima temporada, se permanecer em Alvalade.

Há três anos, Matheus Nunes estava a fazer o último jogo pelo Ericeirense. Como as coisas mudaram. Uma mina de ouro que um dia foi chumbado no Benfica.

6. PEDRO PORRO: a fúria requintada de um espanhol

O lateral direito que ainda pertence aos quadros do Manchester City fez uma época de grande regularidade e de grande nível. Foi tão boa que justificou a estreia na principal seleção de Espanha. Não está ao alcance de qualquer um.

Porro consegue juntar a fúria, imagem de marca do futebol espanhol pré-Barcelona de Guardiola, ao requinte técnico. Defende com arreganho e níveis de concentração altíssimos, comete poucos erros, e integra-se com qualidade no processo defensivo. Tem pulmão mais do que suficiente para fazer todo o lado direito no 3x4x3 de Ruben Amorim.

Além disso, Porro destacou-se nas bolas paradas. O golo de livre direto em Famalicão foi um dos melhores do campeonato.

7. ANTONIO ADÁN: um ‘gran portero

A chegada a Alvalade foi vista com desconfiança. Não pelo seu valor em absoluto, mas porque vinha de duas temporadas sem competir: dois jogos oficiais no Atlético Madrid de 2018 a 2020. Mas a qualidade estava (está) ainda toda lá.

Estamos a falar de um guarda-redes criado no Real Madrid e que ainda fez 18 jogos na equipa principal dos merengues, antes de passar depois por Cagliari (Itália), Betis e Atlético. Fez uma grande época no Sporting, com pouquíssimos erros (em Famalicão e na receção ao Belenenses errou com gravidade, sim) e com exibições de grande qualidade.

Adán não é um guarda-redes espetacular, de defesas aparatosas, mas tem consciência em tudo o que faz: na forma como sai e agarra no ar, na coragem com que mergulha aos pés dos adversários, até na segurança que dá na saída de bola com os pés. E integrou-se muito bem no balneário.

É, como dizem em Espanha, ainda um ‘gran portero’.