Deve ser inevitável: a generalidade das pessoas não resiste a um comentário, sobretudo se desconhecer o tema.
As decisões do «apito final» foram ainda pouco «mastigadas», a sua fundamentação é longa e apesar das explicações do presidente da Comissão Disciplinar da Liga poucos terão conhecimentos suficientes para analisar os documentos e emitir uma opinião válida do ponto de vista jurídico.
É o meu caso, não tenho problema em admiti-lo.
Mas há aspectos que podem ser sublinhados.
1. A Comissão Disciplinar revelou coragem ao analisar o processo «apito dourado» e produzir esta versão «final». Como se viu pelas reacções de dirigentes e adeptos, neste caso a coragem não é um detalhe. Estamos a falar de, entre outras pessoas, Pinto da Costa e Valentim Loureiro. Nas duas últimas décadas ninguém teve tanto poder como eles e contam-se pelas mãos os que os enfrentaram.
2. Mesmo para quem não é especialista em direito desportivo, resulta evidente que a Comissão Disciplinar trabalhou durante meses neste caso. Recolheu provas, ouviu testemunhos, produziu acórdãos. Nesse sentido, prestou um bom serviço ao futebol português. Quanto mais não seja por motivar uma discussão vezes de mais adiada.
3. Ao contrário do que se passa na justiça civil, chegou a conclusões. Apenas disciplinares é certo, mas bem mais depressa e com menos meios.
4. Seja qual for o desfecho do processo no Conselho de Justiça, suscitou uma reflexão, que era urgente, sobre os regulamentos disciplinares do futebol profissional. De resto, a CD critica asperamente o articulado sobre as regras de conduta vigentes e prometeu entregar uma proposta de alteração, a analisar pelos clubes.
Claro que para quem olha de longe, provavelmente será impossível entender como pode o árbitro ser suspenso por corrupção consumada e o dirigente castigado por tentativa de corrupção.
A CD sustenta longamente as suas teses, agora caberá aos visados contrariá-las e ao Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol a decisão final. Era bom que isto fosse feito depressa, mas de forma serena. E séria, se não for pedir de mais.
As avaliações laterais sobre a Comissão Disciplinar parecem-me acessórias. Os comentários feitos por Pinto da Costa, Valentim Loureiro e João Loureiro sobre «fugas de informação», «vaidade» e coisas do género são compreensíveis à luz da estratégia de defesa. Mas sem grande interesse e nula substância. Devem entrar na longa lista de críticas ao árbitro depois de um jogo que se perde.
Como é evidente, o presidente da Comissão Disciplinar não é o problema em toda esta história. Pode ser que o tempo me desminta, mas até prova em contrário limitou-se a fazer o seu trabalho.
Como nos bares do velho oeste, pede-se o favor de não disparar sobre o pianista. Ele não tem culpa se a melodia que ecoa no futebol português resulta tosca e vagamente triste.