Ainda a propósito das dificuldades dos jogadores após o final da carreira, não vou falar de Cadete ( até porque concordo com o que foi escrito pelo Vítor Hugo Alvarenga), mas de uma solução diferente: Shakespeare.

Calma, não desista já. Vai ver que não é assim tão absurdo. A história tem a ver com um jogador de futebol americano que decidiu abraçar uma carreira no teatro depois de ter pendurado as chuteiras. Eddie George foi estrela no futebol universitário, onde venceu o Troféu Heisman para o melhor jogador de 1995, quando representava a universidade de Ohio State. O running back entrou na liga profissional (NFL) pela porta grande e aí veio a representar os Houston Oilers (mais tarde Tennessee Oilers e finalmente Tennessee Titans) e os Dallas Cowboys.

George foi um jogador importante e influente no final da década de 1990 e início de 2000. Foi quatro vezes escolhido para estar no jogo que reúne os melhores da época (Pro Bowl), correu mais de dez mil jardas com a bola nas mãos e entre outros feitos viu o seu número (o 27) retirado da equipa universitária (o que significa louvor pelo seu trabalho), para além de ter marcado presença no Super Bowl (em 1999, pelos Titans, contra os vencedores St. Louis Rams).



Ganhou muito dinheiro durante a sua carreira e conseguiu conquistar um lugar como comentador da Fox Sports pouco depois de ter terminado a carreira. Mas Eddie não ficou satisfeito com essa solução e foi proativo na busca de soluções, primeiro ao tirar um MBA que lhe deu ferramentas para apostar nos negócios, depois apostando no teatro. Sim, no teatro, e com a ambição de interpretar papéis escritos por Shakespeare. Coisa fácil…

O monstro dos relvados é agora um ambicioso ator, como demonstrou no The Nashville Shakespeare Festival, onde interpretou Otelo.



E porquê Shakespeare? «Porque é o mais difícil de fazer», explicou o ex-jogador, de 40 anos, em entrevista à CBS, confessando que descobre algumas semelhanças entre os desafios que encontrava em campo e os que tem de enfrentar no palco.

George sentiu-se como Otelo quando deixou de jogar: desesperado, sem rumo, esbanjando dinheiro, bebendo e cortejando outras mulheres (sendo casado). «Só pensava em encontrar uma forma de aliviar a dor e preencher o vazio», confessa, recordando a fase de depressão que o levou a recorrer à terapia.

A carreira de ator começou há oito anos, com participações menores em filmes de pouca expressão, mas tudo mudou quando visitou a Broadway. «Vi Jude Law em Hamlet. Fiquei tão envolvido que decidi que aquele era o meu caminho se quero ser ator. Agora quero fazer o melhor como ator shakespeariano», abordou.

George encara o teatro com o mesmo profissionalismo com que viveu o desporto. É uma obsessão. Na rua repete as falas, em casa estuda a métrica, no restaurante memoriza poses. Já não precisa correr com a bola nas mãos, evitar adversários e ganhar terreno. Basta-lhe articular as palavras na perfeição, dar o dramatismo correto à personagem e usar as falas na altura certa. Segundo os especialistas existe potencial, mas Eddie George precisa melhorar pormenores. Neste momento o seu trabalho é suficiente, mas não tecnicamente inspirador.

Nunca ninguém fez este percurso no desporto e não é díficil torcer pelo sucesso de Eddie, que para além de tudo isto é uma figura muito acarinhada pela sua simpatia e disponibilidade. É um caso de sucesso entre muitas histórias perdidas, recheadas de infelicidade. George tem objetivos, sonhos e utiliza a força de vontade que o levou a vingar no desporto para responder à sua nova vida. Uma solução que pode ser encontrada por muitos.

Ah, e também não se sai mal a cantar. Suspeito que lá bem no fundo terá vontade de um dia surgir num musical da Broadway.