Família de futebolistas, perfil discreto e aplicado, percurso difícil mas responsável. Mergulhar no passado de Silvestre Varela é descobrir os cantos do campo dos Pescadores da Costa da Caparica, imaginar o caminho até ao treino, entender a vontade de seguir as pisadas do irmão e perceber que o mérito ainda é suficiente para ultrapassar obstáculos.

«Desde pequeno que o talento dele fez a diferença em tudo. Jogava connosco porque era bom, ia à selecção de Setúbal porque era bom. Nunca precisou de cunhas como é normal nas selecções regionais. Há sempre os paizinhos presentes a ver o treino e a dar uma força por trás. O pai dele nunca foi ver os treinos. Eu dizia-lhe para estar descansado e a verdade é que hoje ele joga no F.C. Porto», recorda José Dias, antigo treinador de Varela, ao Maisfutebol.

Varela, o regresso? «Sempre foi um lutador»

Luís Lopo, outro homem que lapidou as qualidade do extremo portista, partilha a mensagem. A família de Silvestre Varela não vivia do futebol. Mas aprendeu a admirar a arte. «Os pais eram atentos. Não estavam obcecados com isto mas não queriam que faltasse nada, dentro das possibilidades. Tanto aqui como quanto foi para o Sporting», conta.

Passava por todos e deixava o irmão marcar

José Dias levava Varela para os treinos, no Pescadores. «Ele e mais uns poucos. Era um carro cheio. O Varela vinha com 4, 5 anos, ainda nem podia jogar. Vinha porque adorava aquilo», explica.

Com Varela vinha o irmão gémeo, Sílvio, que tinha alguns problemas de aprendizagem. «Ele necessitava de acompanhamento especial, mas ali era uma criança totalmente normal. No jogo, o Silvestre passava por toda a gente e entregava-lhe a bola para ele marcar. Depois era uma festa», recorda José Dias.

«Ainda hoje os pais agradecem mais o que fizemos pelo Sílvio do que pelo Silvestre», completa.



O treinador que agradeceu por terem tirado o craque

Quando se fala em dar a volta por cima à actual situação no F.C. Porto, José Dias não tem dúvidas e conta logo um episódio que mostra a força de Varela. «Ele está a ser injustiçado e sabe o que é combater injustiças. Nunca fez dramas, nem guerras desnecessárias. Estava tranquilo e respondia com o trabalho dele», diz.

«Lembro-me de um jogo em que até um treinador que cá tivemos lhe fez uma injustiça. Tirou-o ao intervalo, perdemos o jogo e, no final, o treinador da equipa adversária veio falar comigo e agradecer por termos tirado o Varela. «Assim foi mais fácil», disse ele. E tinha sido, claro. Com o Varela tínhamos ganho», lamenta.

Para além de Sílvio, Varela tem mais dois irmãos. Um deles, Carlos, também esteve no Sporting. Luís Lopo conta a história do dia em que Carlos Varela foi levado para Alvalade e Silvestre ficou debaixo de olho.

«Fazíamos um torneio de Páscoa, em futebol 7. Fomos à final com o Sporting, que já tinha o Quaresma, por exemplo, e o Saleiro creio. E ganhámos. Não me lembro se marcou ou quantos golos fez, mas foi aí que começou a interessar ao Sporting», conta. José Dias recorda o mesmo torneio, mas mais pela exibição do irmão, Carlos: «Secou o Quaresma e foi logo levado para lá.»

Actualmente Varela anda menos pela Costa da Caparica. «Quando estava no Estrela vinha cá muitas vezes. Mas mesmo no F.C. Porto, quando vem às vezes encontro-o na Igreja ao domingo. Sempre humilde. Houvesse mais como ele», diz, sem hesitar, José Dias.

Luís Lopo fala de uma recordação especial: «Estava nos primeiros tempos do Sporting, encontrou-me no centro comercial e disse-me logo: «Mister, não se vá embora. Tenho uma camisola do Sporting para lhe dar.» Esperou que eu acabasse as compras e passou por minha casa para me dar a camisola que ainda hoje guardo.»

Silvestre Varela