Os mitos eternizam-se e alguns até ganham contornos de lenda. Quando se fala na final de Viena, recordar o discurso de Artur Jorge ao intervalo é entrar por um caminho recôndito do balneário portista. Muito se diz, pouco se sabe ao certo. Que o F.C. Porto entrou diferente todos viram. Porquê é a pergunta dos 100 milhões.

Juary revela que o treinador fez um forte «ataque» ao ego dos jogadores. «Perguntou-nos a todos a idade», conta o brasileiro ao Maisfutebol.

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«Depois disse aos mais velhos que esta era a última oportunidade para entrarem na história do Porto e para fazer algo pela carreira deles. E aos mais novos disse-lhe que era o primeiro passo. Tinham de dar tudo em 45 minutos», explica.

E ainda lembrou aos jogadores onde estavam: «Aquilo era uma final da Liga dos Campeões. O Artur Jorge conhecia-nos bem e sabia como íamos reagir. Disse que podíamos ganhar o campeonato todos os anos e mesmo assim não ficaríamos na história como se ganhássemos aquela Taça. Voltamos ao relvado só com o pensamento em ganhar. E conseguimos.»

Ora, com todo aquele discurso no intervalo, já não seria preciso muito mais na hora de Juary entrar em campo. O que já de si era uma novidade, porque o brasileiro esteve em risco para a final.

«Quando ia entrar o Artur Jorge já não falou muito. Disse-me que sabia que eu ia decidir. Ele tinha falado muito comigo porque eu estava com um problema no tornozelo,mas ele queria muito que eu jogasse», conta.

«O meu sonho é voltar ao F.C. Porto»

Na época passada, aquando do regresso do F.C. Porto ao Estádio do Prater, para enfrentar o Rapid Viena, o clube azul e branco convidou todos os campeões europeus para acompanhar a equipa. Juary também foi. E diz que não foi importante. «Foi importantíssimo», atira entre risos.

«Foi belíssimo. Foi como voltar alguns anos atrás. Rever companheiros extraordinários, pisar aquele relvado, sentir outra vez a atmosfera Porto que só quem lá passou sabe como é. E sentir outra vez o carinho de um homem fantástico como é o Pinto da Costa, que tem um respeito e carinho muito grande por aquela equipa. Foi das melhores prendas que tive», confessa.

E por isso não tem dúvidas. Ia outra vez. «Só estou à espera do telefonema», brinca.

«Tenho muitas saudades do F.C. Porto. Tenho um sonho, guardado no fundo da gaveta, de um dia voltar a trabalhar com o F.C. Porto, seja aí, no Brasil ou em Itália. Foi o clube que mudou a minha vida. Todos os dias digo à minha mulher que gostava de voltar. Eu aprendi a esperar e pode ser um dia Deus tenha uma luz virada para mim outra vez e eu possa voltar», acredita.

Para já, Juary vai conseguindo êxitos em planos bem mais modestos do que aquela noite na capital austríaca. Foi campeão regional com o Sestri Levante, equipa italiana na zona de Génova. E para o ano vai treiná-la na III Divisão Nacional.

Mantém contactos com alguns ex-companheiros, especialmente Paulo Ricardo e Semedo. «Fico contente de o ver na equipa principal. Mas não me surpreende. O F.C. Porto valoriza os que o ajudaram a construir a história do clube», diz Juary.

E depois, por iniciativa própria, pede para deixar uma mensagem para a nação portista: «Não esqueçam nunca aquela noite de Viena. Foi o coroar do trabalho de um grupo fantástico de jogadores que merecia uma vitória assim. E o sinal que no futebol é possível sonhar. Eles eram os favoritos e até em adeptos estávamos em minoria. Mas eles não tinham adeptos como os nossos.»