5 de Fevereiro de 2008. A morte sai à rua e apanha Vitor Hugo desprevenido. O jovem, então com 18 anos, encara a tragédia nos olhos. Um hediondo acidente de viação vitima a namorada e deixa-o entre a vida e a morte. A tormenta atira-o para a cama de um hospital. O quadro clínico traçado assemelha-se a uma sentença de pena capital: traumatismo craniano fortíssimo, um pulmão perfurado e o fémur direito fracturado.

O destino puxa-lhe o tapete debaixo dos pés, Vitor Hugo cai, arrasado pelas dores do corpo e a negrura da alma. Uma história de morte é sempre uma história sem um final feliz. Mas o exemplo de Vitor Hugo, jogador do Paredes, merece ser contado. Ele sim, é o campeão.

Mais de dois anos depois, o jogador do Paredes consegue voltar a competir. A entrevista ao Maisfutebol é um testemunho de fé e perseverança. «Sinto-me orgulhoso pela minha recuperação. Sofri muito, chorei, pensei que não voltaria a jogar futebol. Enfim, estou aqui. Esta época quero ir jogando aos bocadinhos, 10/15 minutos. No próximo ano vou estar em grande.»

«Não me lembro nada do acidente»

«A morte saiu à rua num dia assim, naquele lugar sem nome para qualquer fim; uma gota rubra sobre a calçada cai, e um rio de sangue de um peito aberto sai.»

A genialidade de Zeca Afonso espelha o estupro suportado por Vitor Hugo naquela assombrada tarde de Carnaval. Perdeu a namorada, perdeu dois anos de futebol e quase perdia a vida.

«Não me lembro de nada do acidente. Recordo-me de tudo o que fiz nesse dia, até passar um cruzamento em Penafiel, a cerca de um quilómetro do embate. Depois disso, apagou-se tudo da minha cabeça», relata ao nosso jornal, ainda com os traços de revolta bem vincados no discurso.

«Lembro-me todos os dias da minha namorada, pois ela era minha vizinha. Levanto-me e vejo a casa dela. Assistir ao sofrimento dos pais dela é duríssimo e o irmão ainda hoje está perturbado. Faço tudo o que posso por eles, temos uma relação óptima.»

Vitor Hugo não soçobrou. Resistiu a tudo: à perda da companheira e às mazelas gravíssimas.

Aqui te afirmamos dente por dente assim, que um dia rirá melhor quem rirá por fim; na curva da estrada há covas feitas no chão, e em todas florirão rosas de uma nação.

Um ferro de 30 cms na coxa e o médico salvador

Solta-se o vitupério, o inconformismo, a esperança. A exortação da felicidade e da realização.

«Três meses depois do acidente, os médicos foram claros e disseram-me que o futebol para mim tinha acabado. Informei as pessoas do Paredes e foi aí que contactaram o dr. Leandro Massada. Foi ele que me recuperou para o futebol, juntamente com o fisioterapeuta Alcino Duarte e o senhor Fernando Valente, meu treinador. Deram-me esperança e agarrei-me a ela», evoca Vitor Hugo, mergulhado no regresso ao passado.

«Andei com um ferro de 30 cms na coxa durante largos meses. Mesmo na hora do regresso aos treinos. Passados sete/oito meses do acidente comecei a correr, devagar e cheio de dores. Era o desejo que me fazia esquecer o sentimento.»

Vitor Hugo dividia o tempo entre o ginásio, a piscina e tímidas aparições no relvado. Assistiu de fora à subida de divisão do Paredes; chorou na hora de receber a faixa de campeão. «Nunca joguei. Mas treinei muito, em condições físicas horríveis. Chegava à cama, à noite, e gritava com dores», lamenta.

Agora, é hora de vingança. Vitor Hugo só quer que o deixem jogar à bola. Está desde os 11 anos no Paredes e dizem ser um médio-esquerdo de grande talento. Chega de sofrimento, de pensar na morte e no destino soez.

Esta é a história de um campeão.