Se há palavra que se associa ao Chipre, neste momento, é «medo». «Desde sábado de manhã, quando soubemos da notícia que medidas foram tomadas, tanto eu como todas as pessoas do Chipre ficámos preocupados e atentos. Não podemos fazer nada», contou ao TVI24.pt o futebolista português Nuno Morais, que vive em Nicósia, onde representa o APOEL.

«Os bancos estão fechados, as contas estão bloqueadas. Não podemos fazer transferências pela Internet. Só as caixas multibanco é que funcionam». Até ver, há mais movimento do que o habitual para levantar dinheiro, mas não mais do que quatro ou cinco pessoas na fila. «Nada de exagerado», sublinha. O seu companheiro de equipa Hélio Pinto, um dos mais de 50 portugueses a atuar em clubes cipriotas, confirma a ideia: «Por agora, só quem for para os lados do parlamento, onde há manifestações, é que se apercebe da tensão. No geral, as pessoas andam tranquilas. Como hoje é feriado, a única diferença passa pelo movimento nos multibancos. As caixas por onde passei, ou têm grandes filas ou já não têm dinheiro», esclarece.

Sempre com a nuvem do medo a pairar sobre os cipriotas, Nuno tem receio de perder o dinheiro que tem no banco: «Claro que sim. Mas é aquela questão: mais vale perder pouco do que o dinheiro todo. Que sejam tomadas as providências para que percamos o mínimo possível e possamos transferir o dinheiro daqui, depois de termos a certeza de que está seguro». Hélio Pinto também está convicto de que o corte, mais ou menos doloroso, será inevitável: «Estamos à espera para saber quando podemos mexer nas contas. A decisão política foi adiada para terça-feira, mas a convicção das pessoas é de que a medida está tomada e não volta atrás», admite.

Nuno Morais, que já passou pelo Chelsea, reforça o pessimismo: «Queríamos o dinheiro intacto. Não temos culpa do que aconteceu e do que está a acontecer. Trabalhamos para ganhar o dinheiro e honestamente. Desejaríamos que não lhe tocassem, mas, à partida, pelas medidas que estão a tomar...». Ainda assim, o seu colega Hélio Pinto admite viver uma situação menos angustiante do que muitos cipriotas: «Por sorte, na semana passada, sem saber que isto ia acontecer, passei no banco e graças a Deus levei algum dinheiro para casa. Se não fosse isso, já não teria possibilidade de ir às compras, como deve acontecer com muitas pessoas nesta altura», conta.

Também em relação a companheiros de profissão, Hélio admite haver portugueses mais pressionados: «Pelas conversas que vamos tendo, percebemos que o APOEL deve ser dos únicos clubes onde não há salários em atraso. Por isso, se alguns colegas já pensavam em sair daqui, depois disto devem ter ainda mais vontade de procurar outros clubes», conclui.

O clima é de apreensão. «Não se sabe o que vai acontecer». Certo é que os bancos estão fechados até quinta-feira e o Parlamento adiou para esta terça-feira o debate e votação do plano de resgate europeu ao país, no valor de 10 mil milhões de euros, que estabelece, entre outras medidas, um imposto extraordinário de 9,9% sobre os depósitos acima dos 100.000 euros e de 6,7% para os valores abaixo, bem como um aumento do imposto sobre as empresas até 12,5%.

A corrida aos depósitos e a dureza do resgate arrasaram os mercados esta segunda-feira. Para os analistas, as condições da ajuda podem matar a economia cipriota. E há quem alerte que, apesar de o Chipre representar menos de 0,5% da economia da Zona Euro, pode ser a pedra na engrenagem que fará descarrilar toda a união monetária.

É a primeira vez, na Europa, que os depositantes privados são envolvidos no pagamento da dívida.