Entre uma carreira e um contrato: o que faz um jogador feliz?
Box-to-box
É engraçado estarmos todos aqui, não é? Eu nestas linhas. Vocês desse lado a lerem-me. Enfim, a vida tem graça: tem acasos de uma simpatia tremenda.
Por falar em vida, encontrei-me outro dia a pensar nela quando vi três senhoras a sair de uma fábrica, para um café durante a pausa de almoço, abraçadas e a rir muito alto. Uma delas até cantava.
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Nessa altura interroguei-me sobre o que é preciso para sermos felizes. Provavelmente menos do que pensamos. Nós e aqueles que ganhando fortunas ainda ambicionam mais.
Os jogadores, por exemplo.
Jaime Pacheco disse um dia com enorme propriedade, como muitas vezes o faz, que no tempo dele os atletas sonhavam fazer uma carreira: agora sonham fazer um contrato.
Sonham dar o salto, e a seguir outro salto, e ser for possível ainda mais um salto.
Podiam construir uma carreira rica em afetos, podiam deixar marca num clube, podiam até criar um legado para a história.
Mas preferem fazer um contrato. Ficando apenas com dinheiro para deixar de herança.
Nesta altura vejo-me o obrigado a falar de três craques do futebol português: Adrien Silva, Brahimi e William Carvalho.
Em comum têm o facto de nos últimos tempos terem trocado de empresário. William Carvalho deixou Jorge Mendes e passou a ser representado por Pere Guardiola. Adrien Silva deixou Jonathan Maarek e mudou-se para o Stellar Group. Brahimi, por fim, deixou a Doyen Sports e passou a ser representado também pelo Stellar Group.
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Por que o fizeram? É impossível não associar a troca de empresários ao facto de nos últimos mercados terem estado no elevador da prata: na órbita de uma transferência.
Em nenhum dos casos se concretizou e provavelmente por isso ficaram insatisfeitos. Talvez até magoados. Ressentidos e melindrados. A vida não é só graça, também tem destas coisas: e a cabeça do ser humano é um lugar perigosíssimo.
Por isso procuraram associar-se a uma empresa que, acreditam os jogadores, possa cuidar melhor dos interesses deles.
Afirmam-se disponíveis para abdicar do carinho que recebem no FC Porto e no Sporting e entregam-se ao desconhecido: em troca, claro, de um contrato melhor. William Carvalho e Adrien Silva até são capitães de equipa, têm uma história no clube, têm uma enxurrada de memórias, enchem as bancadas de entusiasmo, respeito e veneração. Mas tudo isso, pelos vistos, não chega a ser muito.
O que me recorda uma frase de Stan Collymore.
«Pedi à direção do Leicester para ser transferido, mas não quero deixar o clube.»
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Inglaterra começou por abrir a boca de espanto. Depois sorriu. Por fim foi tomar chá.
Os jogadores preferem fazer um contrato em vez de fazer uma carreira. Provavelmente sem saber o que os pode fazer realmente felizes.
«Box-to-box» é um espaço de opinião de Sérgio Pereira, editor do Maisfutebol, que escreve aqui às sexta-feiras de quinze em quinze dias