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Permitam-me discordar

Há tempos cruzei-me com uma história curiosa de um cronista brasileiro. Dizia ele que, numa conversa corrente, um amigo lhe dava conta detalhadamente de um crime qualquer.

«O mundo está cada vez mais violento», sentenciava.

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O cronista discordava.

«Já leste sobre as crueldades da Idade Média? Já estiveste em Auschwitz? O mundo nunca foi tão pouco violento como agora. O homem é que nunca esteve tão bem informado.»

No fundo, caríssimos, é isto: depende tudo da perspetiva. Para quem não esteve numa Gulag e só viveu neste nosso tempo, é fácil pensar que isto agora está muito mau.

Mesmo que já tenha estado bem pior.

Ora vem esta conversa a propósito do futebol português e de uma perspetiva otimista.

O sucesso do último verão, com títulos europeus e finais de competições internacionais, encheu o peito do futebol nacional de orgulho: os protagonistas do jogo estão cada vez mais empertigados e altivos, quase, quase deixando escapar uma certa arrogânciazinha.

Tornou-se banal ouvir treinadores, dirigentes e até comentadores puxar dos galões para perguntar em que atividade é que Portugal tem um sucesso semelhante? Ou para dizer que só no futebol é que o nosso país consegue estar entre os melhores do mundo.

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Nesta altura peço licença para dizer: permitam-me discordar.

Mas antes disso deixem-me só contar outra história. Tenho um amigo francês que vem a Portugal com regularidade. Gosta de futebol, é adepto do PSG, pensa mudar-se para cá e recusa ter um clube português porque só consegue gostar do Paris, como lhe chama.

É no fundo um tipo como nós.

No início do último verão veio a Lisboa com outros amigos franceses. Como sempre a conversa foi parar ao futebol e ele sentiu-se na obrigação de avisar os compatriotas.

«Há algo que têm de saber: em Portugal o futebol é a coisa mais importante do mundo.»

Nessa altura dei comigo a pensar que sim, que aquele francês não andava longe da verdade. Damos uma importância ao jogo que provavelmente não damos a mais coisa nenhuma e gostamos de citar pelo menos duas vezes ao dia o inglês Bill Shankly: que o futebol não era uma questão de vida ou de morte, é mais importante do que isso.

Não seguimos, certamente, mais nenhum fenómeno com tanta atenção, não nos irritamos tanto com mais coisa nenhuma, nem nos desgastamos assim com mais nada. Também nada nos tira do sério com tanta facilidade como o futebol: para o bem ou para o mal.

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Quantas vezes não condicionamos a nossa vida porque dá este jogo ou aquele programa?

Para nós o futebol é realmente o elemento mais importante do mundo. E é, nesse sentido, injusto compará-lo com qualquer outra coisa.

Quando alguém perguntar em que outra atividade o país tem tanto sucesso internacional, o melhor é responder que faz sentido que seja assim: é no fundo um nexo de causalidade. Afinal de contas, a que outra atividade o país dedica tanto tempo, entusiasmo e carinho?

Por isso, lá está, permitam-me discordar: essa perspetiva está distorcida. Porque a nenhuma outra atividade Portugal dedica tanto de si.

«Box-to-box» é um espaço de opinião de Sérgio Pereira, editor do Maisfutebol, que escreve aqui às sextas-feiras de quinze em quinze dias

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