FC Porto-Gil Vicente, 2-0 (crónica)
Um dragão dos nossos tempos: heroico na gestão das contas
Sem sufoco nem heróis. Sem instantes inesquecíveis ou forças sobrenaturais. Este FC Porto é tão fiável, tão equilibrado, que joga de relógio na mão e lápis atrás da orelha. Sabe ser superior em todos os capítulos e lê cada período com a gentileza de um cavalheiro enamorado.
Investiga, identifica, pune e retrai-se. Tudo perturbadoramente natural e previsível, ao nível da mais domingueira comédia romântica. O Gil Vicente vergou-se ao 2-0, como podia ter-se vergado a outro resultado, mais ou menos dilatado. Estava tudo previsto no guião azul e branco.
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O dragão gere as contas imbuído de um pragmatismo familiar, como se isto do futebol não fosse mais do que um pequeno negócio geracional. Neste caso, é evidente, não podemos desligar o acerto de contas com o compromisso europeu de quarta-feira, em Viena.
Encomenda despachada na primeira parte, devidamente selada com os golos de Varela e Jackson. Tudo o resto foram cenas secundárias de um espetáculo virado mais para a forma do que o conteúdo.
Na verdade, e é esta a ideia mais forte, o Porto fez o necessário, o que lhe estava imposto desde o início. Só se o Gil Vicente tivesse marcado, e até teve uma boa fase nos primeiros 20 minutos do segundo tempo, é que os tricampeões teriam voltado a acelerar. Assim, contentaram-se com o expetável, o mínimo.
Nada a declarar, nada a acrescentar.
Aliás, até na forma utilitária como os golos foram alcançados - Varela em recarga a si mesmo e Jackson a encostar sem oposição - somos remetidos para ideia de um produto essencial e básico.
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Nada foi supérfluo ou excessivo. O Porto detesta esbanjar, é uma equipa de recursos sólidos e contas em dia, pelo menos quando a mais não é obrigado. As notas soltas, fora do tom, saíram do estreante Quintero (Lucho foi poupado de início) e do regressado Varela.
O colombiano, confirma-se, é mesmo geniozinho. É fantástico em espaços curtos, rapidíssimo a pensar e a definir. Vai ser um caso sério, a médio prazo. Varela, ainda assim, terá sido o mais inspirado, ao fazer um golo e a ter uma mão cheia de ações convincentes.
Veja como foi o jogo AO MINUTO
Do Gil Vicente pouco há a dizer. Entrou sustentado numa base frágil (os dois centrais titulares estavam indisponíveis) e cedo tremeu. Até cair. João de Deus tentou emendar a mão ao lançar Bruno Moraes, um dos melhores, mas aí já a pintura estava borratada e irrecuperável. Como o Ecce Homo, de Borja, em Espanha.
Os minhotos quiseram algo mais do jogo a partir do reatamento, sem dúvida, mas mesmo esse empertigamento se diluiu rapidamente. Bastou ver o FC Porto a acelerar ligeiramente o ritmo e a tentar dar alguma animação a uma história vulgar, onde o mais forte usa e abusa do mais fraco.
O Porto fez o que quis da partida e parte para a Áustria de mente fresca, pernas robustas e, acima de tudo, contabilidade irrepreensível.
Nos dias que correm, coisa assim até pode passar por um ato de heroísmo. Afinal, esqueçam a primeira frase da crónica.
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