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Fora do jogo  |  

Das estradas da Volta à Pedreira sempre de microfone na mão

Depois de ter trabalhado oito anos na prova rainha do ciclismo nacional, Armando César tornou-se speaker do Sporting de Braga. Chegou a trocar o nome de Quim pelo de Beto e tem gravado na memória... um Portugal-França de andebol. Eis a história de quem trabalha a vender a voz

Pelas estradas da Volta, pavilhões ou no Estádio Municipal de Braga, é comum encontrar Armando César de microfone em punho, animando tudo o que é evento desportivo. Armando César é speaker oficial do Sporting Clube de Braga há 13 anos. É, como o próprio diz, um «prostituto da voz». «Comecei a fazer rádio com 15 anos. Era uma rádio-pirata que mais tarde, acabou por ser legalizada. Fiz muitos relatos de futebol e de andebol até a rádio ser vendida a um grupo. Passei a fazer eventos desportivos. Fui speaker da Volta a Portugal durante oito anos antes de surgir o convite do Sporting de Braga. A animação do clube estava entregue a uma empresa que me viu trabalhar na Volta. Desafiou-me a ser speaker, aceitei e fui ficando », conta ao Maisfutebol. Além de ser presença assídua nos jogos da equipa principal, Armando, de 45 anos, desdobra-se em tarefas. «De quando em vez faço voz-off para a nova plataforma do clube, a Next, e comentários nas transmissões dos jogos», explica.  

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Armando César a trabalhar num jogo da Liga (Foto: arquivo pessoal)

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Sempre que há uma partida, este funcionário dos minhotos está na Pedreira cerca de duas horas antes. «Tento sempre chegar com antecedência. Tenho um coordenador que me dá o cronograma com as atividades que temos para o jogo em questão. Há diferentes programas e atividades, que incluem ações de interatividade com os sócios ou passatempos. Estou ali pelo relvado e começo a comunicar com os adeptos desde o aquecimento da equipa até ao final do jogo», esclarece. «Geralmente estou ali pelo túnel junto ao relvado até ao apito inicial. Procuro ver quando a equipa vai aquecer ou entra para o jogo para ir pedindo o apoio do público. Temos tudo programado mesmo em termos musicais, a nível das coreografias e é necessário estar atento a tudo. Durante o jogo fico na bancada atrás de um dos bancos», acrescenta. É comum o speaker comunicar durante o jogo, contudo, nem sempre o pode fazer. «Intervimos quando há golo, substituição ou há indicação do tempo adicional. Já nos jogos internacionais, temos de ler avisos para as claques adversárias e comunicados caso existam manifestações de racismo. Não podemos intervir tanto como noutros desportos», diz. Armando tem marcado na memória o Portugal-França, da fase de apuramento para o Europeu, jogado no multiusos de Guimarães. E usa-o como exemplo para a pouca comunicação que há em estádios. «Faço muitos jogos da Federação Portuguesa de Andebol e é completamente diferente. Podemos intervir quando há uma defesa, um ou golo ou para pedir o apoio do público. O Portugal-França ficou-me na memória. Cheguei ao fim sem voz: gritei cada defesa como se fosse um golo de Portugal. Estávamos só a jogar contra a França… Imagine o multiusos de Guimarães a rebentar pelas costuras e eu a berrar ‘Quintana’. O futebol não é tão intenso», refere.  

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Armando César na apresentação dos equipamentos do Sp. Braga (Foto: arquivo pessoal)

Armando César lamenta que seja «complicado mudar mentalidades para melhorar os espetáculos de futebol» e aproveita para contar episódios caricatos em 13 anos de carreira. «Houve um jogo contra o Sporting há quatro ou cinco anos. O Sp. Braga marca mesmo no final. O alinhamento prevê que entre uma música, que deixe as pessoas exaltarem e só a seguir é que eu grito. Saiu-me ‘golo’, fugindo ao que estava previsto. Lembro-me de o meu coordenador olhar para mim e pensar ‘este tipo passou-se’. Não somos blocos de gelo», justifica, sorrindo. Já aconteceu, por exemplo, cometer uma pequena gralha aquando do anúncio da entrada dos guarda-redes para o aquecimento. Corria a época 2012/13 e Quim, antigo internacional português, não achou graça nenhuma. «Tínhamos sempre dois guarda-redes no aquecimento: o Kritciuk e o Beto, que estava prestes a sair para o Sevilha. O Quim era o terceiro guarda-redes. Precisamente nessa semana o Beto foi para o Sevilha. O Quim e o Kritciuk estavam no túnel prestes a subir ao relvado. Eles entram e eu peço um grande aplauso para o Kritciuk e para o Beto. O Quim olha para mim e levanta-me o polegar como quem diz ‘estiveste bem’. Gelei completamente», lembra, entre risos. O speaker do Sporting de Braga sublinha que nunca teve qualquer problema na voz, embora os malefícios do tabaco já se começassem a fazer sentir. «Até há sete anos fumava cerca de dois maços por dia. Já tinha o catarro normal de quem fuma. O médio perguntou-me ‘vives disso?’ e eu não entendi. ‘Vives da tua voz, não é?’ voltou a perguntar. Costumo dizer que sou um prostituto da voz. ‘Se fosse a ti pensava bem em deixar isso’, disse-me. À entrada do 1 de maio, antes de um Sp. Braga B-FC Porto B, dei o maço de tabaco a um segurança. Sentia tosse a meio, mas nunca fiquei sem voz», relata.  

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Armando César em interação com o público do estádio Municipal de Braga (Foto: arquivo pessoal)

Em jeito de balanço, qual é a importância de um speaker? «O speaker tem de ser bom quando tem pouco gente no estádio. Com 15 ou 20 mil pessoas é fácil, basta dizer Braga e aquilo explode. O speaker ganha importância quando os jogos estão mornos ou têm menos importâncias. Nesse momento é fulcral puxar pelas massas quando estão mais confortáveis ou calmas. Temos de colocar a ‘temperatura’ lá em cima. O speaker é uma mola. Por exemplo, no Portugal-França o Quintana defendia, eu gritava e ele sorria para mim. Acho que o speaker dá motivação aos jogadores», concluiu. Armando César atenta para a capacidade que o speaker tem de ter para cativar o público quando a equipa não está tão bem. «É mais difícil quando as equipas têm períodos menos positivos. Felizmente o Sp. Braga tem crescido a olhos vistos e têm feito campanhas espetaculares. Aliás, já tenho uma final da Liga Europa no currículo. Mas nos ciclos negativos não é fácil conquistar o público. Grito Braga e eles assobiam. Como se dá a volta? É preciso ser persistente e falar com alma para saberem que estamos a sentir. Se desistirmos, a bola começa a ganhar volume e vira-se contra nós», frisa. Que a voz nunca falte a quem vive o desporto com paixão.  

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Fora do jogo é uma rubrica do Maisfutebol que dá voz a agentes desportivos sem participação direta no jogo. Relatos de quem vive por dentro o dia a dia dos clubes e faz o trabalho invisível longe do espaço mediático. Críticas e sugestões para smpires@mediacapital.pt ou vem.externo@medcap.pt.

Artigo original: 11/02; 23:50

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