Da ordem de extradição às lágrimas de um golaço ao Benfica
O longo caminho de Coulibaly meteu uma ordem para deixar Portugal em quinze dias. O médio do Vianense ficou, no entanto, e vai ficar: tem a vida toda pela frente
Medo, desconfiança, silêncio. Não é fácil arrancar uma palavra a Mohamed Coulibaly. As lágrimas do golo ao Benfica, do golaço, aliás, dizem tudo, pelo que o médio do Vianense prefere fechar-se sobre ele. Tem uma história que vale a pena contar, uma história de sofrimento e angústia, mas repete que são coisas pessoais. Quem o conhece, diz que se cala por receio e prudência. A vida, no caso dele mais dura e cruel do que o normal, ensinou-o a ser desconfiado. Veio para Portugal com 17 anos, como tantos outros jovens africanos: trazido por um empresário sem ficha na FIFA ou na Federação. Um empresário que no fundo não o é e que só trabalha como tal ao abrigo da conivência de clubes das divisões amadoras. As pessoas preferem não revelar o nome: boa parte delas já foi ameaçada se o fizesse. Enfim, em frente. Há dois anos Coulibaly estava num beco sem saída. Durante três anos tinha vivido ilegal em Portugal, a jogar em clubes das divisões inferiores. Foi precisamente num deles, no Vilaverdense, que foi apanhado pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
PUB
PUB
«Trazem os miúdos para cá e depois não têm capacidade de os sustentar. Esperam conseguir recuperar o investimento ao fim de um ano e isso é quase impossível. Os clubes dos escalões inferiores não têm dinheiro, os jogadores não têm família em Portugal, é muito complicado», adianta. «O Diaby, que agora está no Pedras Salgadas, por exemplo, ganhava 80 euros por mês. O Valenciano tinha acordo com um restaurante, que tratava do almoço e do jantar, e dormia num apartamento, num colchão que estava no chão. Mas depois o clube atrasava-se nos pagamentos e era uma situação terrível.» No entanto, e enquanto duram os campeonatos nacionais, as condições de vários destes jogadores nem é a pior. Na generalidade dos casos os clubes oferecem dormida e têm acordos com restaurantes para garantir o essencial da alimentação. As maiores dificuldades são no fim dos campeonatos, quando terminam os contratos com os clubes. Em vários casos os jogadores deixam de ter casa, onde comer e dinheiro. Era o caso de Coulibaly. «Ele queria jogar futebol, queria ajudar a família e não podia, não recebia nada, andava triste, mal nutrido, enfim.» Foi então que em Mirandela tudo mudou. O costa-marfinense esteve dois meses num apartamento e com o início do campeonato fez um contrato de trabalho, com um salário apresentável e, mais importante, os descontos todos direitinhos.
PUB