O dia 29 do Mundial-2014 em cinco pontos:

1.
Por que é que, simplesmente, não se acaba com o jogo do terceiro e quarto lugares? Que sentido faz a existência de uma partida entre derrotados, na véspera da grande final? Não será isso contraditório com o espírito de um Mundial em que se destaca a excelência do futebol ao mais alto nível? A partida que Brasil e Holanda realizarão este sábado em Brasília é aquela que ninguém desejava jogar. Porque quem chega a esta fase esteve demasiado perto de atingir a final para se poder consolar com a disputa do último degrau do pódio. Se uma Supertaça europeia é um duelo de vencedores, o terceiro/quarto é uma penosa obrigação de derrotados. Neste caso, com circunstâncias que agravam o cenário. O Brasil ainda em estado de choque pela humilhação de Belo Horizonte: pode ser penoso ver outra vez o escrete neste Mundial, ainda em casa, já com o sonho do hexa esfumado com estrondo. E quanto à Holanda, basta recordar o que disseram Van Gaal, Robben e Snejder logo após a eliminação por penalties para concluirmos que este será mesmo o jogo que ninguém queria. Acabem com ele, era preferível.

2. O Brasil tem mais a perder do que a ganhar com o encontro de sábado com a Holanda. Uma nova derrota, então se for por números expressivos, seria descida aos infernos para aquele que é, para muitos, o pior escrete das últimas décadas. Neymar, que esta quinta visitou os colegas em Teresópolis e deu a cara para assumir estar a viver «a pior semana» da sua vida, gostava que a partida de Brasília servisse para os jogadores brasileiros poderem, ao menos, «terminar a Copa a sorrir». Mas há um perigo numa eventual vitória brasileira nesta partida esquisita entre derrotados que queriam mesmo era o título mundial e não terceiro posto: é que este Brasil precisa mesmo de perceber o que lhe aconteceu com a Alemanha, e no resto do Mundial. Se continuar a fugir para a frente (como parece estar a acontecer, perante declarações de Scolari e Parreira do «Mineirazzo»), então aí não vai mesmo dar para aprender com a humilhação. Mas muito dependerá da vontade e da coragem do «senhor que se segue». Tite, talvez?

3.  A Holanda começa a ter o estigma do «quase». Há quatro anos, quase que era campeã do Mundo (perdeu na final, aos 116, já perto dos penalties, para a Espanha). Perdeu as finais de 74 e 78, curiosamente (mas não por acaso...) para os dois finalistas de 2014, Alemanha e Argentina. É vista pelos adversários como das equipas mais temíveis, mas nos grandes momentos, geralmente falha. Não pode ser só coincidência. Neste Mundial, a Holanda começou no 80 (goleada redentora à Espanha), mas aquela segunda parte arrasadora escondeu deficiências claras do jogo holandês no primeiro tempo (fase durante a qual a Espanha foi melhor, quase sempre). Van Gaal teve méritos (o golpe de génio de lançar Krul para retirar o foco em Navas como potencial herói, nos penalties com a Costa Rica), mas também algumas culpas (desvirtuou o ponto forte da Holanda, que é a qualidade do seu futebol ofensivo). A Holanda justificou chegar ao «top4», mas não merecia ser campeã. Teve, por isso, o que mereceu. 

4. Alemanha-Argentina não será a final mais sonhada num Mundial organizado pelo Brasil, mas é claramente uma final que dá garantias. À decisão no Maracanã chegam a melhor equipa da prova no plano coletivo e nos processos consolidados (a Alemanha, pois claro) e uma Argentina que nunca chegou a convencer quem gosta de futebol-espetáculo, mas que tem em Messi o verdadeiro «ás de trunfo»: aquele que, estando em campo, pode mesmo decidir a qualquer momento, mesmo que, por vezes, isso não pareça provável. A Alemanha parte com alguma dose de favoritismo. Por quase tudo: porque tem sido a equipa mais forte e regular de toda a prova; pelo lastro que aqueles inacreditáveis 1-7 ao Brasil lhe deram; pelo histórico com a Argentina em Mundiais (os germânicos eliminaram a formação das Pampas há quatro anos, há oito e, claro, venceram a Argentina na final de 90). Mas a Argentina tem alguns trunfos, também: o principal é mesmo Messi, claro; também a História, na medida em que nunca uma seleção europeia foi campeã do Mundo em solo americano; a final de 86, já agora (3-2 sobre a RFA). Então se Di Maria recuperar a tempo de estar na final, o favoritismo alemão pode até ser reduzido a uns 51/49… 

5. Ironia: num Mundial de top até aos oitavos (nos primeiros 56 jogos, provavelmente o melhor de sempre), a qualidade foi baixando a partir da fase decisiva. Suprema ironia: vai à final uma equipa (a Argentina) que esteve nos dois piores jogos da prova (com a Bélgica e a Holanda). O futebol está sempre a surpreender-nos.

«Do lado de cá»
é um espaço de opinião da autoria de Germano Almeida, jornalista do Maisfutebol, que aqui escreve todos os dias durante o Campeonato do Mundo. Germano Almeida é também responsável pelas crónicas «Nem de propósito» e pela rubrica «Mundo Brasil», publicadas na revista MF Total. Pode segui-lo no Twitter ou no Facebook.