O Maisfutebol apresenta uma entrevista a Leonardo Jardim realizada a 8 de abril de 2013. Um mês e meio mais tarde, o madeirense é apresentado como treinador do Sporting:

O Leonardo vivia na Madeira, sempre ligado ao mar, e aos 33 anos arrisca uma mudança para Chaves. Foi uma mudança radical. Assustou-se?

«Foi a decisão mais acertada da minha carreira. Possibilitou-me dar um impulso decisivo na minha evolução. Aos 19 anos comecei a treinar na formação, aos 21 fui para adjunto do Eduardinho na III Divisão (Santacruzense) e depois fui sempre subindo até chegar ao Camacha, com 27 anos. Estive lá cinco anos e aos 33 saí para Chaves. Senti que na Madeira não podia subir mais. O Marítimo e o Nacional não têm o hábito de apostar em treinadores da região. Por isso a decisão de ir para Chaves foi essencial».

Como é que um jovem madeirense se adapta à vida em Trás-os-Montes?

«Lembro-me que foi o senhor Carlos Alves quem me foi buscar ao aeroporto. Eu ia no banco de trás e durante a viagem só via montanhas e árvores. Durante a subida ao Marão pensei para mim: onde é que te vens meter? Saíste do calor e vens para o meio da serra, para este frio. Era março. Bem, mas foi a melhor decisão, repito. O Desp. Chaves e o Beira-Mar tiveram uma grande importância naquilo que sou como treinador».

Ao chegar ao continente estabeleceu como limite chegar à I Liga em cinco anos. Porquê?

«Tinha uma carreira sustentada na II Divisão B, mas na Madeira. Ao vir para o continente não tinha condições financeiras para andar com a minha família atrás de mim. Por isso tinha de fazer um acordo com a família: ou conseguia a minha afirmação no futebol e a independência financeira, para que estivéssemos juntos, ou não conseguia e voltava para a Madeira. Teria uma vida ligada ao futebol e a dar aulas, sem problemas. Nunca colocaria em risco a minha organização familiar. Cinco anos era, para mim, o tempo razoável para chegar à I Liga».

Que balanço faz desde esse dia em que chegou a Chaves?

«Fantástico. No primeiro ano cheguei ao Desportivo a poucos meses do fim. Subi a equipa do segundo para o quinto lugar. Falhámos a subida por pouco. No ano seguinte estive a época inteira e subimos. Para mim foi fundamental. Eu queria passar da II B à II Liga. Isso abriu-me portas em alguns clubes e optei pelo Beira-Mar e por Aveiro. Tive outros convites e um deles foi bastante falado. Neste caso, o do Gil Vicente».

Por que razões escolheu o Beira-Mar?

«O presidente Mano Nunes acreditou no meu trabalho e deu-me carta branca para organizar a época. O clube tinha escapado da descida à II B por pouco. Recebi total apoio dele. Acabámos por subir de divisão e essa subida manteve o clube vivo. Se não tivéssemos subido¿ não sei como o Beira-Mar se salvaria. Subimos e também eu cheguei à I Liga».

Já me admitiu que chegou a ter quatro meses de salários em atraso no Beira-Mar. Como se gere um plantel nessas condições?

«Os salários em atraso passaram a ser mais um elo de ligação entre todos nós. Em dezembro já tínhamos três meses por pagar e estávamos perto do primeiro lugar. Disse aos jogadores que se chegássemos em janeiro no primeiro lugar, e o clube não pagasse, podíamos rescindir por justa causa e arranjar outro clube. Afinal, eramos líderes. Entrou uma nova direção e as contas foram acertadas. O problema voltou a surgir depois, mas estávamos à frente e o discurso foi diferente: vamos subir de divisão e vamos ter o nosso esforço premiado. No fim do ano subimos e o dinheiro apareceu. Pagaram tudo. O grupo aguentou e 90 por cento dos jogadores continua na I Liga.»