A Abecásia é a nova campeã do mundo de futebol.

Estranho, não? Mas verdade...se excluirmos os países federados na FIFA. Terminou no domingo a segunda edição do Mundial da ConIFA (Confederação das Associações de Futebol Independentes) e, a jogar em casa, a Abecásia sagrou-se, pela primeira vez, campeã do mundo.

Ok, é muita informação nova. Vamos então, passo por passo.

Em 2014 um grupo de seleções de países, territórios, dependências, estados não reconhecidos, minorias ou regiões que não são reconhecidas pela FIFA nem pelos organismos que tutelam o futebol nos respetivos continentes, disputou um torneio entre si, a que chamou Campeonato do Mundo. Já tinha havido tentativas semelhantes no passado, pelo que não foi algo inédito. 

Ostersund, na Suécia, foi o palco do primeiro campeonato do mundo deste futebol, digamos, alternativo. O Condado de Nice, histórica região francesa próxima da cidade com o mesmo nome, venceu. Curiosamente, desta feita não participou, embora tenha conseguido a qualificação.

Sim, porque pela primeira vez foi necessário disputar uma fase de apuramento para encontrar os 12 finalistas que viajaram, então, para a região da Abecásia, na Geórgia, que apenas é reconhecido como país por Rússia e Venezuela. Deveriam ser 16, mas quatro acabaram por não participar. Condado de Nice, Ellan Vannin (ilha de Man),os dois finalistas da primeira edição, e Aymará (povo da região dos Andes) desistiram por entenderem que não havia condições de segurança para viajar para a Abecásia. Mais tarde, a seleção cigana também anunciou que não estaria na prova, devido à dificuldade em ter os documentos legais necessários para fazer a viagem

De fora do torneio já tinham ficado outras seleções de regiões do globo bem conhecidas que integram a ConIFA, casos do Mónaco, Gronelândia, Quebec, Tibet, Darfur ou Zanzibar, entre outros.

Quem foram, então, os participantes?

GRUPO A

Abecásia. Seleção da casa e futura campeã. Tinha sido apenas 8ª em 2014 mas agora venceu todos os jogos. Localiza-se na costa do Mar Negro, dentro do território da Geórgia. A Rússia reconhece-lhe a independência.

Arménia Ocidental. Seleção fundada apenas no ano passado. Representa a diáspora arménia, mas o território localiza-se dentro da Turquia.

Ilhas Chagos. Arquipélago localizado no oceano Índico, cuja posse é disputada por Reino Unido e Ilhas Maurícias, outro arquipélago naquela zona. São mais de 60 ilhas e uma população estimada de 3 mil pessoas.

GRUPO B

-Curdistão. Região autónoma do Iraque que luta pela independência há vários anos. Tem uma população estimada em 5.5 milhões de pessoas. Venceu um outro Mundial alternativo, em 2012, não organizado pela ConIFA.

-Coreanos Unidos do Japão. Uma seleção baseada num clube, o FC Korea, fundado na década de 60 por norte-coreanos que fugiram do país, por causa da ditadura, para o Japão. Compete num campeonato regional nipónico, em Kanto.

-Szekely. Povo húngaro que, historicamente, se deslocou para a Transilvânia, na Roménia, onde vive. A seleção foi fundada em 2014.

Seleção dos Coreanos do Japão em ação nos quartos de final

GRUPO C

-Chipre do Norte. Uma seleção histórica do futebol alternativo. A região, autoproclamada país independente, localiza-se no território do Chipre. A Turquia é o único país do mundo que reconhece a soberania.

-Padania. Uma das mais fortes seleções do «futebol fora da FIFA», com várias vitórias em anteriores torneios. Representa a região do Vale do Pado, no norte de Itália.

-Raécia. Antiga província do Império Romano, cujo território se localiza, atualmente, dividido por cinco países: Itália, Suíça, Alemanha, Áustria e Liechtenstein.

GRUPO D

-Panjab. Seleção fundada no Reino Unido por descendentes da diáspora Punjabi, que vai da Índia ao Paquistão. Só no Reino Unido há mais de 2,1 milhões de punjabis.

-Lapónia. A conhecida terra do Pai Natal também tem a sua seleção, que até já venceu um torneio semelhante a este em 2006. O território estende-se por países como a Noruega, Finlândia, Suécia e Rússia.

-Somalilândia. Um estado autoproclamado, reconhecido como uma região autónoma da Somália, país africano. Possui bandeira, hino, capital (Hargeisa) e uma população estimada de 4,5 milhões de habitantes.

O guarda-redes da Lapónia mostrou qualidade

Como decorreu o torneio?

Todos os grupos tiveram uma seleção claramente abaixo das demais, mas o maior «bombo da festa» deste Mundial foram as Ilhas Chagos, do grupo A, que perderam 9-0 com a Abecásia e 12-0 com a Arménia Ocidental. Provando que não servem de «medida» para avaliar rendimentos alheios, a Abecásia venceu o grupo depois de bater a seleção arménia por 1-0.

O grupo B foi dominado pelo Curdistão, como esperado, sendo que os Coreanos do Japão conseguiram o apuramento para os quartos-de-final, também, com uma vitória por 1-0 sobre Szekely.

Chipre do Norte e Padania seguiram em frente no grupo C, onde a Raécia fez apenas figura de corpo presente: 6-0 com a Padania, 7-0 com Chipre do Norte. Por fim, no grupo D, a seleção de Panjab foi a mais forte, mas a Lapónia também seguiu em frente.

O formato do torneio permite às seleções eliminadas fazerem mais jogos para definir a posição final. Das quatro seleções afastadas na fase de grupos, a melhor acabou por ser a Szekely.

Assim:

12º classificado- Ilhas Chagos

11º classificado – Raécia

10º classificado – Somalilândia

9º classificado - Szekely

Seguiram-se, então, os quartos de final, com dois jogos decididos nos penaltis: Padania surpreendeu o Curdistão e Chipre do Norte bateu os Coreanos do Japão. A Abecásia passou a Lapónia (2-0) e Panjab afastou a Arménia Ocidenteal (2-3), num dos jogos mais emocionantes do torneio: estiveram a vencer 3-0, permitiram a recuperação mas salvaram-se atempadamente.

Assim:

8º classificado: Curdistão

7º classificado: Coreanos do Japão

6º classificado: Arménia Ocidental

5º classificado: Lapónia

E chegaram, então, as meias finais. A Abecásia continuou a valer-se do fator casa que empurrou a equipa para o triunfo frente ao Chipre do Norte. Novamente por 2-0, tal como nos quartos de final. No outro jogo desta fase, Panjab apurou-se para a final, batendo a Padania por 1-0.

O Chipre do Norte haveria de garantir o terceiro posto na prova e a final, num estádio a abarrotar, teria contornos épicos.

A festa após a final

A Abecásia esteve a perder até dois minutos do fim, altura em que fez a igualdade a um. O jogo foi para os penáltis e, para aumentar o dramatismo, no final da terceira ronda, Panjab vencia por 3-1. Ou seja, bastava marcar um dos dois últimos penáltis ou esperar que a seleção da casa voltasse a falhar.

Nem uma coisa, nem outra. A Abecásia marcou as duas tentativas e Panjab falhou as suas! Entrou-se então em regime de «morte súbita». Só à terceira tentativa houve vencedor: Aaron Minhas falhou o penálti para Panjab, Vladimir Argun marcou e a Abecásia tornou-se campeã do mundo. Até houve invasão de campo…

O resumo da final:

O top-4:

4ª classificado – Padania

3º classificado – Chipre do Norte

2º classificado – Panjab

1º classificado – Abecásia