Morreu a primeira mulher a disputar um grande prémio de Fórmula 1. Maria Teresa de Filippis faleceu neste sábado aos 89 anos. Há cerca de dois meses, aquela que se esperava ser a próxima mulher na classe rainha do desporto automóvel de velocidade deixou de sê-lo.

Sousie Wollf abandonou o circo e o grupo (muito) restrito de mulheres na F1 ficou mais pequeno; sem a sua próxima e, agora, sem a sua primeira-dama.

Maria Teresa de Filippis começou nas corridas aos 22 anos. Em 1954, terminou em segundo lugar nos campeonatos italianos de automobilismo. O desporto automóvel não lhe ficou indiferente e foi contratada pela Maserati

A jovem italiana aprendeu com Juan Manuel Fangio, que ganhou o seu último mundial em 1957. Em 1958, Filippis correu no Mundial de Fórmula 1 (tinha 32 anos). O pentacampeão mundial argentino ter-lhe-á dito que ela «andava depressa de mais», que «corria demasiados riscos».

De Filippis falhou na sua estreia a qualificação para o Grande Prémio do Mónaco (segunda prova da temporada – ficou na metade que não se qualificou (16 participaram no GP). À quinta prova do Mundial, tornou-se a primeira mulher a correr um GP de F1.

No (XIX) GP da Bélgica – Spa-Francorchamps – não houve tempo mínimo de qualificação e participaram todos os pilotos. De Filippis saiu do último luar da grelha de partida, com mais 44 segundos do que Tony Brooks, na pole position. Brooks também ganhou a prova onde De Felippis se estreou com um décimo lugar. Foi a última a terminar – outros dez não passaram a bandeira de xadrez.

De Filippis queixou-se de descriminação de género para impedi-la de estar no GP de França para a corrida seguinte. Voltou a participar numa prova três corridas depois. E qualificou-se para o GP de Portugal, que correu até à sétima volta, quando desistiu; o mesmo que lhe aconteceu no GP seguinte, em casa, em Itália, 57 voltas depois da partida.

A italiana já não esteve na última corrida do ano. Esteve na primeira de 1958, já não com a Maserati, mas com um Behra-Porsche. No Mónaco, voltou a não conseguir qualificar-se para a corrida. E a sua carreira de piloto de F1 ficou pela presença em cinco corridas com a disputa de três GP. Uma prova terminada, sem qualquer ponto.

Esses foram os registos. O estatuto que ficou foi o de primeira-dama da Fórmula 1. E as reações à morte de Mara Teresa de Filippis fizeram-se notar: dos conhecidos aos institucionais, para além dos anónimos.
 

 


 



O primeiro ponto para uma piloto seria obtido pela segunda mulher da história da F1: Lella Lombardi, outra italiana.

Com um percurso que passou pela Fórmula 3 e Fórmula 5000, Lombardi correu durante três anos na F1 (com estreia aos 33 anos): 1974-76. Em 1975 conseguiu a primeira pontuação, no GP de Espanha. Ficou em sexto e ganhou meio ponto – a reduzida duração da prova implicava este tipo de pontuação.

Em três anos, Lombardi pontuou com um sexto lugar entre os 12 GP que fez de um total de 17 corridas em que entrou. Depois da estreante e da primeira a pontuar, houve mais três mulheres a inscreverem o nome na F1. Mas nenhuma delas chegou a fazer disputar um GP.

A inglesa Divina Galicia esteve em três Jogos Olímpicos de Inverno antes de ir para o desporto motorizado. A britânica esteva nas Olimpíadas de 1964, 1968 e 1972 no esqui alpino. Chegou a estar nos pódios de duas etapas da Taça do Mundo.

Galicia dividiu a carreia nos desportos de inverno com o desporto automóvel e tornou-se a terceira mulher na Fórmula 1 (aos 32 anos). Fê-lo em duas épocas: em 1976 (um corrida) e em 1978 (duas). Sem qualquer GP disputado por não conseguir qualificar-se dividiu a carreira nas pistas com a Fórmula 2. E acabaria ainda por voltar aos Jogos Olímpicos, em 1992.


Desiré Wilson teve um percurso diferente, apesar dos resultados idênticos. Desde meados da década de 1970 que a sul-africana se dedicou à carreira de piloto. Em 1980 (aos 27 anos), chegou à F1. Para uma única corrida. A primeira piloto abaixo dos 30 anos na F1 teve a sua hipótese no GP da Grã-Bretanha, mas não se qualificou.

Wilson continuou a carreira por outras pistas desde a Fórmula Indy Lights às provas de resistência, como Le Mans, Daytona e Sebring correndo muito nos Estados Unidos.

A última mulher a ter uma hipótese na F1 foi Giovana Ammati. Há quase 25 anos. Em 1992, a terceira italiana desta elite feminina chegou à classe rainha do desporto automóvel de velocidade depois de quatro temporadas na Fórmula 3000: intervaladas entre 1987 e 1991.

A aposta foi da Branham e logo no arranque da época. Mas Ammati acabou por não se qualificar em qualquer dos três primeiros GP. E ficou por aí.

As cinco mulheres na Fórmula 1:


Maria Teresa de Filippis
(Itália)
1958-1959
Maserati e Behra-Porsche
(5 corridas) 3 GP (0 pontos)

Lella Lombardi
(Itália)
1974-1976
March, RAM e Williams
(17 corridas) 12 GP (0,5 pontos)

Divina Galicia
(Grã-Bretanha)
1976 e 1978
Surtees e Hesketh
(3 corridas) 0 GP

Desiré Wilson
(África do Sul)
1980
Williams
(1 corrida) 0 GP

Giovanna Amati
(Itália)
1992
Brabham
(3 corridas) 0 GP

Houve cinco mulheres a correrem na Fórmula 1. Apenas duas chegaram à grelha de partida de um GP. Lella Lombradi morreu há 26 anos, Maria Teresa de Filippis morreu neste sábado. O caminho aberto pelas duas italianas teve seguidoras e ainda as tem. Mas também ainda sem igual.

Depois deste quinteto, houve várias outras pilotos que se sentaram num monolugar da classe rainha, mas não passaram a última barreira: a da competição. Sarah Fisher fez uma corrida de demostração ao volante de um McLaren (2002), Katherine Legge fez testes para a Minardi (2005).

Maria de Villota foi piloto de testes para a Marussisa (2012), Simona de Silvestro foi agregada
pela Sauber (2015) e Carmen Jordá está na Lotus (desde 2015) como piloto de testes.

A mais próxima de ter entrado em competição terá sido Susie Wolff que, aos 29 anos, foi contratada pela Williams como piloto de testes. Em 2014, a escocesa foi a primeira mulher em 22 anos – desde Amati – a estar na pista num fim de semana da F1 (no GP da Grã-Bretanha).

No ano passado, em março, quando o piloto da Williams Valtteri Bottas foi impedido de correr na Austrália pelos médicos da FIA e não tinha ainda autorização para competir na Malásia (por dores nas costas que poderiam interferir com a rapidez em sair do monolugar), Wolff foi apontada como podendo substituir o finlandês.

Mas ainda antes de se saber se Bottas podia ou não correr em Sepang, já a Williams descartava a substituição pela piloto. «Susie Wolff é nossa piloto de testes e não piloto de reserva», afirmou a diretora da equipa, Claire Williams.

A escocesa assumiu na altura da despedida da F1 que esse não terá sido «o momento principal» para a sua decisão, mas não deixou de reconhecer o seu peso. «Foi um dos momentos em que eu vi perfeitamente tornar-se cada vez mais difícil. Eu perguntei-me será que isto vai acontecer alguma vez?
. Foi a dura realidade de que o sonho não ia realizar-se», afirmo perto do final do ano passado à «BBC».

«Foi uma decisão que tomei no final do verão», afirmou Wolff nessas declarações acrescentando que «havia muito poucas oportunidades de continuar na Fórmula 1». «O meu objetivo era estar na grelha de partida e isso não parecia concretizável. Por isso, tive de dar por finalizado. Eu sempre disse que assim que não pudesse ir mais longe eu pararia e essa altura chegou», admitiu.



Giovanna Amati foi a última mulher a correr na Fórmula 1, mesmo que não tenha conseguido qualificar-se para um GP. Wolff foi a primeira desde aquela italiana a estar nas pistas num fim de semana de prova, mas isso não significou estar perto de fazer a corrida.

Bernie Ecclestone, o patrão da F1, já sugeriu fazer um campeonato feminino para compensar a ausência de mulheres na classe rainha da velocidade. Quer Wolff que Michelle Mouton – a antiga piloto de rali agora líder da comissão da FIA para as mulheres no desporto automóvel – já manifestaram discordância.

Já Amati, mostrou abertura a uma ideia que possa levar mais mulheres para a F1. «No presente, há 20 carros na Fórmula 1. Por isso, não consigo prever alguma mulher nos 20 melhores pilotos do mundo. No meu tempo, havia 32 carros, não 20», disse a italiana à «BBC».

Desde Lombardi – há 40 anos – que não há uma mulher a disputar um GP de F1. As previsões de que isso aconteça são difíceis de fazer, como disse Amati. Wolff esteve quase, mas já não está. Lella Lombardi já tinha morrido aos 50 anos. Maria Teresa de Filippis morreu agora. O grupo restrito ficou um pouco mais pequeno.

Fica a evocação da primeira, apesar da publicidade