Se Gene Kelly cantava à chuva, Óliver Torres escolhe a música, dança e joga o futebol dos eleitos. Enquanto o palco deixou, o espanhol foi Nureyev e Nijinski, bailarino e coreógrafo, artista da bola.

Óliver jogou, fez jogar, transportou o FC Porto para uma vitória determinante nas contas - desportivas e financeiras. 4-1 ao Lokomotiv, a qualificação a um ponto de distância e a certeza de que com o espanhol em campo a equipa tem mais arte e saber.

O FC Porto foi sobretudo Óliver, mas não só. Foi também o jogo de ancas de Corona na direita (o terceiro golo é um trabalho delicioso do mexicano), a verticalidade irracional de Marega (ofereceu o primeiro golo a Herrera e marcou o segundo) e foi o grito de Iker Casillas, fundamental nos piores momentos da equipa. Que existiram, sim, particularmente por responsabilidade de um irreconhecível Alex Telles.

FICHA DE JOGO E INCIDÊNCIAS AO MINUTO: 4-1

O Lokomotiv, perdoem-nos o estafado recurso à Guerra Fria, teve problemas nucleares. Da cabeça aos pés, radioatividade perigosa para um corpo de fragilidade evidente, embora com partículas de qualidade e resistência: os irmãos Miranchuk, o peruano Farfán e, já agora, Eder.

Antes que os russos carregassem no botão vermelho e desencadeassem um conflito evitável, o FC Porto disparou pela direita e só depois perguntou quem era. Passe de Maxi Pereira pelo meio das pernas de um russo, Marega sem travão de mão a chegar antes do guarda-redes e a tocar para o golo do regressado Herrera. Dois minutos de jogo.

Começava precisamente aí a sinfonia em múltiplos andamentos de Óliver Torres. A recuperar bolas, a levantar a cabeça, a sentir a chuva a escorrer-lhe pela face e a sorrir para o jogo.

Passes de certeza cirúrgica, a 25 e 30 metros, como se adivinhasse a direção e a intensidade do vento. Bola na esquerda, bola no pé direito de Óliver e bola a agarrar a direita, entregue com um lacinho e um cartão de boas festas ao recetor.

Foi assim, na batuta do pequeno espanhol, que o FC Porto levou o jogo para onde quis, pelo menos até ao intervalo. O Lokomotiv ainda ameaçou duas vezes por Anton Miranchuk, constantemente libertado por Telles, mas os pequenos sustos não passaram disso mesmo.

Marega ainda fez o 2-0 antes do intervalo, bem servido por Herrera, e só depois o FC Porto entrou na sua pior fase. Mais chuva, mais vento, pior relvado e menos Óliver. Aproveitou o Lokomotiv para atacar mais e reduzir numa bola parada (onde estava a marcação a Farfán?).

DESTAQUES DO JOGO: Óliver, visão e precisão

Com 30 minutos para jogar e uma situação geopolítica mais delicada, teve de ser Jesus Corona, um entertainer de excelência, a dizer basta e a erguer um muro na fronteira entre a esperança russa e a segurança portista.

67 minutos, roubo e passe de Óliver – com que então artista e ladrão de carteiras, hein? – para Corona sentar Idowu num lugar escuro da plateia e subir, também ele, ao palco maior. 3-1, jogo decidido, fechado e apenas reaberto para entrar Otávio. O brasileiro voltou a saltar do banco e a fazer um golão.

Missão cumprida pelos dragões, noite grande para Óliver Torres, vitória justíssima, mas com momentos perigosos entre os 45 e os 65 minutos. Na próxima ronda o FC Porto recebe o Schalke 04 e um ponto basta para voltar a estar nos oitavos-de-final.

«I’m singing in the rain, singing in the rain!»