O atentado terrorista desta quarta-feira em Túnis que fez duas dezenas de mortos e cerca do dobro de feridos (na primeira avaliação possível) foi vivido de perto por José Morais, treinador português que trabalha na capital da Tunísia. O técnico do Espérance de Tunis assume o medo que este ataque impôs aos estrangeiros e já pensa mesmo em deixar o país africano e regressar a Portugal.

Dois terroristas que posteriormente foram abatidos mataram vários turistas nesta quarta-feira de manhã; uns que estavam num autocarro à porta do Museu Bardo, o mais famoso da Tunísia, e outros já dentro da instituição. Falamos com José Morais por volta das 20 horas locais (menos uma em Lisboa). E ele conta-nos como está a passar as horas seguintes ao choque. «É uma situação difícil porque tem implicações para a segurança das nossas famílias», diz ao Maisfutebol com o reforço da repetição: «A nossa preocupação é em relação às famílias.»

A nossa significa a dos estrangeiros na Tunísia. «Foram o alvo dos terroristas e isso deixa-nos preocupados», confessa José Morais: «Tenho família. Tenho a minha mulher e a minha filha em casa.» À hora a que falamos, o treinador português conta-nos que ainda está para ser feita uma comunicação ao país pelo presidente da Tunísia... José Morais tinha jantado há pouco tempo, também poucas horas depois de ter começado o estágio com a sua equipa em Túnis. O Espérance joga nesta quinta-feira com o Marsa.

Os jogos do campeonato mantêm-se, como continuaram nesta quarta-feira, apesar do atentado. «À partida, não há nada que nos diga que não há jogos. Se o governo não parar as competições é porque garante a segurança. Mas nós queremos saber mais sobre o que é que vai acontecer», esclarece o técnico luso.



«A minha cabeça tem de estar no jogo. Mas também não está...», confessa. E explica: «Toda a tarde tive a família a ligar-me e a dizer Vamos embora!» «Vou esperar. Há uma paragem [das provas nacionais por causa das seleções] dia 23 e eu vou decidir se regresso e se não volto mais. Mas, na segunda-feira, a minha família regressa de certeza. Eu vou pensar...», garante José Morais.

«Isto aconteceu hoje. Eu saí do treino e fiquei a saber. Cheguei a casa e encontrei a minha mulher preocupada. Falei com ela, falei com pessoas do clube. Vim para o estágio. Os dirigentes têm contado o que se está a passar», resume o treinador para fazer-nos um ponto da situação sobre o que já se sabia na altura sobre o atentado.

Quando falamos, dois cúmplices no ataque que tinham fugido já estavam dados como detidos. José Morais não só nos revela isso, como faz o relato da versão divulgada sobre o ataque: «O alvo era o governo. Mas como a segurança era muito grande dirigiram-se para o lado do museu [edifício vizinho do parlamento tunisino]. Mataram oito pessoas que estavam num autocarro. Depois dos primeiros disparos, fugiram para o museu e fizeram 30 a 40 pessoas reféns lá dentro. As autoridades depararam-se com mais 12 mortos lá dentro depois de terem matado os terroristas e entrado.»

Estavam dados como mortos pelos atacantes dois cidadãos tunisinos – um guia no autocarro e uma funcionária de limpeza no museu – e 18 cidadãos estrangeiros. «As opiniões passadas dizem que não vale a pena haver preocupações. Porque são terroristas que estão cá, que estão identificados (porque se uniram aos extremistas e que regressaram) e que estão a ser perseguidos por este governo.»

Turismo na mira dos ataques

Os dois detidos são «jovens na casa dos 23 anos». «Não se pode dizer que tenham experiência» deste atos, concede o treinador português juntando outro episódio: «Eles estavam armados com armas Kalashnikov e, segundo testemunhas, um deles tinha dificuldades em disparar: demorou dois minutos para conseguir fazer a arma disparar.»

Quando falamos, ainda não há reivindicações do ataque, apenas se diz que podia ser «um ramo da Al-Qaeda. O que já se conclui é que os alvos do terrorismo na Tunísia dividem-se entre os alvos militares, governamentais e turísticos: «Este é um governo pró-democracia, mais aberto. E a economia passará sempre por atrair o turismo. A época turística está a começar, está a chegar o calor, o tempo de ir para as praias.»

«O governo tomou posse há poucos meses, toda a gente está expectante com um governo escolhido pelo povo depois de vários de transição. Todos têm expectativa no país. Isto foi uma facada nas pretensões do próprio país», conta-nos José Morais destacando a «grande preocupação dos tunisinos, que não se reveem neste tipo de ações».



«Vamos esperar que seja um ato isolado», desabafa o técnico do Espérance, mas sem deixar de contar que a insegurança já não é de agora. E quando o perigo ficou mais perto, lembra que, agora, se o jogo desta quinta-feira «fosse fora de casa era complicado...» «Quando há jogos perto da fronteira com a Líbia, há sempre um problema ou outro e as forças militares estão ativas. Com isto agora... Em Túnis não tinha havido problemas, mas, agora, a segurança ficou em causa». «E ainda não se sabe o que pode vir a acontecer.»

O português revela que a segurança na zona onde mora foi reforçada nesta quarta-feira. «É uma zona residencial para estrageiros, que é fechada, onde há um hotel, onde as medidas de segurança aumentaram: os carros estão a ser revistados de forma muito mais rigorosa, por exemplo». José Morais confessa que o «medo» é o de que «isto se torne organizado». Porque, entre os vários relatos que dão conta dos acontecimentos, há também outros: «Já se fala que os extremistas podem começar a raptar estrangeiros...»