«CHUTEIRAS PRETAS» é um espaço de Opinião do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Pode seguir o autor no Twitter. Calce as «CHUTEIRAS PRETAS».

Cada pessoa é um mundo por descobrir. Um mundo certamente cheio de vida, para lá das virtudes, defeitos, convicções. Entre o glorioso, o vulgar e o vilipêndio, lá carregamos o nosso ser, atrás de uma utopia chamada perfeição, por certo.

Os Jogos Olímpicos são o microcosmo do primeiro parágrafo. Vilões e heróis de carne e osso, gigantes na piscina, na pista de atletismo, na bicicleta, no court de ténis. E gigantes tantas vezes com pés de barro.

Há cinco anos tive o privilégio de ser figurante neste filme. Porque de um filme se trata. Mas um filme que recusa o exibicionismo da câmara lenta. Para quem o vive e nele trabalha, são 30 dias em flash forward, a saltitar de cenário para cenário, na perseguição do beatificado Santo Graal, os protagonistas das reportagens.

A experiência no Rio de Janeiro foi a melhor na minha carreira de 20 anos no jornalismo. A mais estimulante, a mais recompensadora. Claro que ter estado no mesmo dia com Usain Bolt, Rafa Nadal e Michael Phelps ajuda-me a rubricar o veredicto, mas os Jogos vão muito para além do óbvio.

A reportagem está onde menos se espera e isso eleva o grau do fascínio ao limite do quase insuportável. O jornalista vicia-se na adrenalina, julga tudo e todos, ausculta quem o rodeia, snifa histórias e dramas pessoais a cada esquina. Os Jogos são o olimpo dos contadores de estórias. É tão entusiasmante como cansativo. 

Volto ao Rio com nostalgia. Uma nostalgia boa, sem acrimónia. É um tubo de saudade, longo, pejado de coleções que guardo na memória e preservo no arquivo do meu coração.

Volto ao Rio nas conversas com o Norberto Lopes (JN) e o Pedro Sequeira (DN), os amigos e camaradas que mais de perto me acompanharam na epopeia. E volto ao Rio nas mensagens trocadas com o João Cláudio, o taxista-poeta do Mengão, e na amizade que cultivei com Bebeto, apenas e só um dos maiores avançados da história do futebol.

Podia eleger qualquer um deles para o papel maior de herói dos meus Jogos. Mas escolho outro e eles não me levam a mal. Cada pessoa é um mundo por descobrir, dizia, e Ewerton Nascimento foi uma descoberta marcante.

Conheci-o numa das incontáveis casas de banho do Parque Olímpico. Sempre de sorriso nos lábios, vassoura nas mãos e esfregona no carrinho que, diligentemente, empurrava no entra e sai que a intimidade do visitante distraído recomendava.

Dia sim, dia sim, lá estava Ewerton. O faxineiro. Até que o gelo se quebrou e eu perguntei ao Ewerton quem o Ewerton era. As respostas saíram a custo e acabaram AQUI.

No domingo de manhã, ao vibrar com os saltos em triplicado de Patrícia Mamona, dei por mim a pensar nele. Por onde andará o herói dos meus Jogos?