Francisco Cruz não estranha, mas nota a diferença: ao contrário do que acontecia, este ano não recebeu a habitual chamada de Djaló. «Ligava-me antes de cada derby a dizer que ia marcar ao meu clube», conta. «Respondia-lhe que até podia marcar dois, desde que o Benfica fizesse três».

O dirigente do Estação, um pequeno clube da cidade da Covilhã, foi também olheiro do Benfica e é um apaixonado pelo clube encarnado. Descobriu Yannick quando ainda nem sequer era adolescente, levou-o para a beira interior e introduziu-o no futebol de onze. Conheceu-o benfiquista, aliás.

«Quando cá chegou torcia pelo Benfica. Ele jogava futebol de sete no Forte da Casa, em Lisboa. Nós tínhamos aqui três miúdos num lar que o conheciam e nos disseram que ele queria vir jogar futebol de onze. Fomos lá vê-lo e acabamos por trazê-lo para o nosso lar. Chegou ainda iniciado.»

Francisco Cruz lembra-se de um miúdo «muito bom rapaz». «Era calmo, amigo do amigo, boa pessoa. Tinha chegado há pouco da Guiné, procurava ambientar-se a um país novo, onde estava sozinho. Mas não era criança de andar sempre a chorar pelos cantos», recorda ao Maisfutebol.

«Tinha saudades, claro, e às vezes comentava que sentia muito a falta do irmão mais novo. Mas tentava lidar com isso da melhor forma. Lembro-me que em Lisboa tinha algumas dificuldades na escola, quando chegou aqui integrámo-lo na escola pública com mais quatro amigos e saiu-se bem.»

Francisco Cruz era o encarregado de educação de Yannick e era também professor dele na escola. «Ele dizia que eu era o pai branco dele», sorri. «Andava sempre em cima dele. Mas enquanto aqui esteve teve sempre notas satisfatórias, depois regressou a Lisboa e voltou a ter dificuldades.»

Dores, mágoas e sofrimentos de outros regressos

Ora por falar em regressar a Lisboa, Francisco Cruz lembra que na altura Yannick Djaló podia ter feito logo o caminho para o Estádio da Luz. «Eu era olheiro do Benfica e propus o Yannick aos dirigentes. Eles vieram vê-lo jogo, mas disseram que tinham as vagas de estrangeiros preenchidas.»

«Pediram para esperarmos algum tempo. Mas tempo era uma coisa que o Yannick não tinha. Logo a seguir chegou o Sporting e ele foi para Alvalade. Curiosamente já antes podia ter ido para o F.C. Porto. Quando jogava no Forte da Casa, eles interessam-se. Mas a coisa não se fez e veio para cá.»

Com a ida para Alvalade, Djaló tornou-se o que já antes ameaçava: um dos melhores jogadores da sua geração. «Sempre foi muito rápido e com técnica. Aqui no Estação resolvia-me os jogos todos». Em Alvalade explodiu e chegou a ser chamado ainda muito novo por Laszlo Boloni aos séniores.»

Em cinco anos de equipa principal de Sporting, Yannick fez vários derbies com o Benfica mas só por uma vez marcou: aconteceu em 2008 e logo a dobrar, num jogo de excelente memória para os sportinguistas quando venceram um jogo da Taça de Portugal por 5-3, numa segunda parte louca.

Agora, e pela primeira vez, Yannick vai entrar vestido de encarnado em Alvalade. O que pode ser um choque. «Ele quando aqui estava era benfiquista. Mas depois foi para o Sporting, eu perguntava-lhe se não sentia ainda uma coisinha pelo Benfica e ele respondia que não. Que era sportinguista.»

Como qualquer sportinguista, queria que o rival de todos os dias perdesse exatamente todos os dias. «Agora vai estar com muita vontade de fazer um golo.» Ele que um dia disse ser filho do Sporting. Os adeptos nunca o receberam como se recebe um filho: hoje podem assobiá-lo mais do que nunca.