Nos últimos dez anos o Sp. Braga habituou os seus adeptos, e no fundo todo o futebol português, a morder os calcanhares aos grandes, tendo mesmo conseguido ficar em segundo lugar na época de 2009/10. Com António Salvador a presidente o clube ganhou estabilidade, capacidade organizativa e deu um salto competitivo. Mas tudo isso está a ser posto em causa esta temporada.

Após um defeso em que não foi possível fazer encaixes importantes com a venda de jogadores, a equipa renovou-se e os resultados não estão a aparecer. Com José Peseiro saíram figuras importantes como Quim, Leandro Salino, Ruben Amorim, Hugo Viana, Mossoró e Paulo César, enquanto que Jesualdo Ferreira teve de se contentar com a reconstrução de um plantel que tem muitos jogadores jovens e em que as contratações mais sonantes são Eduardo, Joãozinho, Luiz Carlos, Salvador Agra, Edinho e Pardo.

Se o quarto lugar da época passada já os tinha afastado da Liga dos Campeões, a eliminação prematurada da Liga Europa esta temporada foi um sinal de que algo não estava a correr bem. A equipa até teve um bom arranque, com três vitórias consecutivas, mas desde essa altura só conseguiu vencer mais três vezes, e um desses triunfos foi na Taça de Portugal, com os amadores do Gafetense. Desde o final de agosto, os arsenalistas sofreram seis derrotas, tendo concedido doze golos.

Desde que António Salvador é presidente só por uma vez houve uma época tão má e aí (2007/08) o treinador foi despedido à oitava jornada, mais precisamente no início de novembro. O paralelo com a presente temporada é demasiado fácil de fazer, mas Jorge Costa não resistiu tanto tempo como Jesualdo, depois de uma derrota na Taça da Liga, quadro desaires no campeonato e um na Liga Europa. Na altura em foi despedido tinha onze pontos somados no campeonato, o que lhe garantia o oitavo lugar. Foi um ano mau, em que o clube acabou por ficar no sétimo lugar depois de ter tido três treinadores: Jorge Costa, António Caldas e Manuel Machado.

Saídas importantes

É uma evidência que o Braga volta a estar em crise. São quatro derrotas consecutivas no campeonato, sete golos sofridos e apenas um marcado. Jesualdo Ferreira é naturalmente contestado, mas os problemas vão muito para além das eventuais falhas que o treinador possa ter cometido. «Mudaram alguns jogadores muito importantes na estrutura e quando se vem de épocas de crescimento, claro que tudo é completamente alterado pelos resultados que não ajudam em nada os jovens jogadores que entretanto entraram», avalia José Nuno Azevedo, histórico jogador dos arsenalistas.

«O futebol para muita gente resolve-se passando a ganhar em vez de perder. Claro que o treinador terá a sua quota parte como responsável, mas não considero que seja só por aí o problema do Braga. Como idealizador de uma nova forma de jogar, com a mudança do modelo de jogo, claro que o treinador é uma peça importante, mas dizer que está ali o problema parece-me pouco», afirma, passando a dar nomes à crise:

«A explicação também passa pelas saídas de Hugo Viana, Mossoró, Salino e Quim. Não é só pela falta de qualidade, mas também na fórmula que tinha de existir, com jogadores vendáveis para que o processo de sustentabilidade continuasse. Na época passada, com exceção de Éder, poucos jogadores haveria que fossem vendáveis e isso refletiu-se no orçamento. Sem vendas importantes e sem Liga dos Campeões foi difícil manter uma estrutura forte. O modelo visa, com a chegada de novos jogadores, voltar a ter um Braga vendedor para suster esta dinâmica do passado. A renovação deste ano passa por aí, mas os resultados não estão a aparecer e isso prejudica o crescimento dos novos jogadores».

Com quatro vitórias e cinco derrotas no campeonato, o Braga soma apenas doze pontos e está demasiado longe dos primeiros lugares. «A equipa tem qualidade para mais, mas acho que neste momento o grau de exigência que existe em Braga não se coaduna com os resultados, mesmo sabendo que era previsível esta oscilação devido à menor menor experiência existente no plantel», sublinha o ex-jogador.

A agravar esta situação está o facto das próximas duas deslocações no campeonato serem à Luz e ao Dragão. «Tudo isso é real. São jogos muito difíceis que podem piorar o momento atual», frisou, José Nuno, não acreditando que a indefinição do presidente quanto à sua continuidade no clube tenha afetado a equipa: «Isso não pode ser justificação, mas claro que não é uma situação confortável surgir essa dúvida de um momento para o outro».

Habituados a vencer

Os «guerreiros do Minho» já não estavam habituados a viver fora dos lugares cimeiros e por isso se viram lenços brancos nas bancadas do Estádio AXA este domingo, após a derrota com o Rio Ave.

«Aquilo que o Braga é hoje não permite estes resultados. No tempo em que o Braga tinha um ano bom e outro menos bom as pessoas toleravam com mais facilidade, mas hoje tem de estar sempre nos primeiros lugares. As pessoas não estão minimamente preocupadas se têm ou não Hugo Viana ou Mossoró, e não vêem que a equipa está a ser construída com jogadores como Rafa, que tem 20 anos e está na primeira temporada no clube. As pessoas não querem saber, só querem ganhar», considera Zé Nuno.

Olhando para os últimos dez anos, é um facto que os arsenalistas já não viviam um momento tão negativo há muito tempo. Claro que António Salvador pega no clube e traz Jesualdo Ferreira quando o Braga bate no fundo e está prestes a descer de divisão, acabando por ficar em 14º na época de 2002/03, mas a partir daí foi sempre a crescer. Com Jesualdo, o Braga ficou em 5º lugar uma vez e em quarto duas vezes. Seguiu-se um quarto lugar em 2006/07, com Carlos Carvalhal. A exceção surge um ano depois, na tal época em que Jorge Costa é despedido após a oitava jornada, é substituido por António Caldas, que depois é rendido por Manuel Machado. Ainda assim, nesse ano os arsenalistas ocupavam o oitavo lugar à nona jornada.

O resto da história é como que um sonho concretizado: quinto lugar em 2008/09 (Jorge Jesus); segundo lugar em 2009/10, a melhor classificação de sempre, com Domingos Paciência, que no ano seguinte leva a equipa à final da Liga Europa e ao quarto lugar; terceiro lugar em 2011/12 e mais uma quarta posição na temporada passada. Em todos esses anos, os arsenalistas apresentava-se bem mais forte à passagem da nona jornada e em duas ocasiões chegava mesmo a liderar a Liga (2005/06 e 2009/2010).

Novembro, o mês de todos os pesadelos de Jesualdo

A título de curiosidade, o mês de novembro é sempre difícil de ultrapassar para o treinador do Braga. Se é neste mês em que está a ser contestado, foi também neste mês que foi despedido do Málaga, mais precisamente no dia 2 e após a nona jornada. Algo similar aconteceu no Panathinaikos, sendo destituído do cargo de treinador principal no dia 14, após empate caseiro na 10ª jornada e quando somava já 15 pontos de desvantagem para o líder Olympiakos. Finalmente, o mesmo sucedeu em 2002/03, quando estava no Benfica e perdeu com o Gondomar a 24 de novembro, sendo eliminado da Taça da Portugal.