2 de Maio de 1962. Há 50 anos, o Benfica vencia o Real Madrid e sagrava-se bicampeão europeu. Leia a memória dessa final que foi a última conquista europeia das águias, a partir da publicação original no livro «Sport Europa e Benfica», do Maisfutebol.

Quando Coluna tocou para Eusébio, Di Stéfano deu um salto em frente para sair da barreira. A bola passou-lhe por baixo do pé, bateu nos pitons e ressaltou na relva. Sobrevoou os braços estendidos de Araquistain e entrou na baliza. O Benfica selava naquele instante a conquista da segunda Taça dos Campeões consecutiva. O simbolismo da passagem de testemunho escapou a quase todos os observadores, mas foi descrito por «don» Alfredo na sua autobiografia. A consagração do novo rei da Europa acabara de passar pelos pés do rei deposto.

A vitória começou a ser cultivada pela fé. Cavém surgiu em campo com uma barba crescida, cumprindo a promessa que lhe fora sugerida em sonhos.

Poucos seriam tão hábeis como Guttmann na capacidade de motivar jogadores. O mote foi repetido vezes sem conta em Amesterdão: «Eles estão velhos.» Era verdade. Puskas e Di Stéfano tinham 35 anos cada, o Benfica contava com Simões e Eusébio, respectivamente com 18 e 19. Era uma questão de tempo, dizia Guttmann. Os monstros não iam aguentar os 90 minutos.

Simões dá razão ao mestre: «Tecnicamente não foi um grande jogo, até porque o relvado estava muito mau. Mas impressionou-me a velocidade, invulgar para aqueles tempos. Esse ritmo ajudou o Benfica», assegura.

Do lado «merengue» havia prudência apesar do favoritismo. Puskas avisava que o Benfica era o pior adversário para os espanhóis. O pé esquerdo do húngaro foi o primeiro protagonista da final, com dois golos em 23 minutos. Mas uma recarga de José Águas reequilibrou o encontro. Os madridistas ficavam em sentido. Cavém ia assustá-los ainda mais, com um espantoso remate de pé esquerdo, mas Puskas completaria o «hat trick» e o Real chegava ao intervalo a vencer por 3-2.

No balneário, outra vez Guttmann: «Fez uma palestra espantosa. Disse-nos que íamos vencer porque éramos melhores e tínhamos mais força. Repetia várias vezes: ¿Vamos ganhar, vamos ganhar!¿ Foi uma segunda parte espectacular», conta José Augusto. Sempre presente nos momentos-chave Coluna tocou a rebate com um tiraço. «De vez em quando ainda se lembram de projectar por aí as imagens. Apanhei bem a bola. Foi um grande golo», confirma.

O Benfica estava mais forte. Faltava aparecer Eusébio, a selar com dois golos a entrada em cena nos grandes palcos. O primeiro foi de penalty. No segundo, os pitons do ídolo abençoaram-lhe o remate e viraram uma página no futebol europeu.

Quando o holandês Léo Horn apitou para o fim os 398 passageiros do navio Índia, que viajaram para a Holanda em excursão, estavam eufóricos. Os emigrantes também. No meio da festa e da invasão de campo, um susto: Ângelo, envolvido pela multidão, caiu no túnel e chegou a perder a consciência. «Apareceu preso numa valeta, a gritar ¿tirem-me daqui¿, e lá o foram buscar. O Zé Águas também foi arrastado e foi o Costa Pereira que acabou por receber a Taça porque nós andávamos todos aos ombros daquela malta.», conta José Augusto.

Eusébio nem percebeu, tinha nas mãos um troféu maior do que a taça: a camisola de Di Stéfano. O manto branco ficava bem ao novo rei.

Benfica-Real Madrid, 5-3

2 de Maio de 1962

Estádio Olímpico, em Amesterdão (Holanda)

Árbitro: Leo Horn (Holanda).

BENFICA: Costa Pereira; Mário João e Ângelo; Cavém, Germano e Cruz; José Augusto, Eusébio, Águas «cap», Coluna e Simões.

Treinador: Bela Guttmann.

REAL MADRID: Araquistain; Casado e Miera; Felo, Santamaria e Pachin; Tejada, Del Sol, Di Stefano, Puskas e Gento «cap».

Treinador: Emil Osterreicher.

Ao intervalo: 2-3.

Marcadores: 0-1, Puskas (17); 0-2, Puskas (23); 1-2, Águas (25); 2-2, Cavém (34m); 2-3, Puskas, (38); 3-3, Coluna (50m); 4-3 Eusébio (62 g.p.); 5-3, Eusébio (68).