Autor: Aleksandar Holiga*

Era uma noite quente em Viena, e o relvado do estádio Ernst Happel parecia o cenário de um acidente de viação. Homens de camisola azul jaziam na relva, de cara para baixo, ou de joelhos, fitando um ponto no vazio. A Croácia tinha acabado de perder nos penaltis, diante da Turquia, nos quartos de final do Euro 2008 e um homem estava pior do que todos. Darijo Srna soluçava de forma descontrolada, rodeado pela equipa médica. O selecionador, Slaven Bilić, baixou-se, deu-lhe uma palmada amigável na nuca e puxou-o pela mão. Até o árbitro Roberto Rosetti se aproximou para o animar. Mas, nessa noite, Srna chorou e chorou até as lágrimas secarem.

Um ano depois voltou a chorar, mas de de alegria, enquanto o Shakhtar Donetsk festejava a conquista da Taça UEFA. «Sou emotivo por natureza,» admitiu. «E por vezes levo as coisas demasiado a peito, porque enfrentei muitos problemas. Mas isso também me fortaleceu.» Dele, diz o selecionador croata, Slaven Bilić: «Não há pontapés ou entradas duras que o parem. Atiram-no ao chão, ele parece acabado, mas depois levanta-se e continua a correr, como um Robocop.»

Srna é um lutador, a determinação no relvado é um reflexo do tipo de pessoa que é fora dele, profundamente consciente da fragilidade da vida. O pai, Uzeir, passou por horrores inimagináveis durante a II Guerra Mundial e foi a maior inspiração do jogador. Enquanto adolescente, Darijo ajudava a família na venda de legumes, poupando o suficiente para comprar o primeiro par de chuteiras. «O meu pai zangou-se e levou-as de volta. Mas acabou por trazer outro par, o melhor que a loja tinha.» Quando recebeu o primeiro grande cheque como profissional, Srna comprou um Mercedes ao pai. Srna tem um irmão, Igor, com síndrome de Down, a quem dedica todos os golos. Tem o seu nome tatuado no peito, bem como os nomes da mulher, Mirela, e da filha, Kasja. E ainda a imagem de uma corça, o significado da palavra srna, em croata.

No relvado, começou como extremo, e depois passou para lateral direito, embora o lugar habitual na seleção seja o de médio. Em 2003, Darijo trocou o Hajduk Split, onde se formou, pelo Shakhtar. Cresceu com a equipa ucraniana, ganhando vários campeonatos e a Taça UEFA. Ainda assim, quando foi promovido a capitão, em 2010, nem toda a gente ficou satisfeita: «Os media duvidavam de que eu estivesse à altura, mas o Slaven mostrou enorme confiança em mim», afirmou Srna. Durante a qualificação para o Euro 2012, a equipa de Bilic sofreu, em especial a partir do momento em que a recessão atingiu a Croácia e o país mergulhou no pessimismo. As críticas à seleção tornaram-se mais agressivas do que nunca. Srna admitiu: «Em alguns momentos, senti-me como se estivesse a ser julgado por seis homicídios. Não me envergonho admitir que tive apoio psicológico, isso ajudou-me a aliviar a pressão.»

A pressão tornou-se sufocante quando a Croácia enfrentou a Turquia na decisão do apuramento, a desforra pela derrota nos penalties em 2008. A equipa de Bilić venceu por 3-0 fora de casa, transformando o segundo jogo numa simples formalidade. Mas a vitória não foi suficiente para encerrar a questão: «Ah, não!», garantiu Bilic. «O jogo de 2008 vai perseguir-nos pelo resto das nossas vidas.» Srna, por seu lado, assume a ambição: «Sejamos honestos, temos de apurar-nos neste grupo, temos qualidade para isso,» afirmou. «Mas seria realmente fantástico se conseguíssemos dar um passo em frente e chegar às meias-finais!». O sonho parece improvável, mas os de Srna têm tendência a tornar-se realidade. Se o mesmo acontecer com este, talvez então os demónios de Viena possam dar-lhe descanso.

*Aleksandar Holiga é editor do tportal.hr da Croácia. Este artigo está integrado na Euro2012 Network, cooperação entre alguns dos melhores meios jornalísticos dos 16 países participantes na competição.