Este é o lado B do ano no desporto. Homicídio, terror, crime, mentira. Casos de polícia, muitos. Também momentos em que a tensão no relvado se tornou física. Cardozo no Jamor com Jesus, Jesus em Guimarães com a polícia. Afinal, mais um caso de polícia. No ano que teve até um estranho assalto à sede da Federação, como nos filmes, o Maisfutebol selecionou 10 casos lá fora e cá dentro, mais um. Sujinho.

Armstrong: o «Sim» depois da mentira


O mito acabou de cair a abrir o ano. Lance Armstrong escolheu uma entrevista a Oprah Winfrey para admitir aquilo que as organizações anti-doping já tinham dado como adquirido e que ele negou durante anos. A perguntas diretas, respondeu várias vezes com um monossílabo que destruía tudo o que representou. Sim, dopou-se em cada uma das suas sete vitórias no Tour. O homem que foi durante tanto tempo, para muitos, a imagem perfeita do desportista que supera as adversidades e se supera a si próprio para chegar ao topo era protagonista afinal de uma grande mentira, como ele próprio a definiu. A confiança no ciclismo, mas de alguma forma também nos heróis do desporto, não será a mesma depois de Armstrong.



Pistorius, morte no Dia de São Valentim

O mundo acordou para uma notícia chocante a 14 de fevereiro de 2013. A namorada de Oscar Pistorius, Reeva Steenkamp, tinha sido morta a tiro na casa onde viviam. O atleta sul-africano foi detido. Disparou quatro tiros através da porta da casa de banho naquela madrugada. Ele diz que confundiu Reeva com um ladrão, a acusação fala em homicídio depois de desentendimentos entre o casal. Saiu sob fiança e aguarda julgamento o outro mito abalado em 2013. A história perfeita de Oscar Pistorius, o atleta que contornou uma deficiência e ganhou a batalha para correr ao mais alto nível, também morria aqui.

Terror na maratona

O terror voltou a assombrar o desporto a 15 de abril, quando a meta da Maratona de Boston foi abalada por duas explosões. Morreram três pessoas, quase duas centenas ficaram feridas na sequência de um atentado que, por momentos, fez o mundo reviver o medo e a incerteza de que se alimenta o terrorismo. Vimos imagens dramáticas em direto de uma prova onde estava a portuguesa Dulce Félix, que terminou em nono e já tinha cortado a meta quando tudo aconteceu. A polícia norte-americana encontrou dois suspeitos, dois irmãos de origem chechena. O mais velho foi morto em tiroteio. O segundo é Dzhokhar Tsarnaev, então com 19 anos, que foi detido e aguarda julgamento.



Corrupção desportiva, já não dá para ignorar

2013 foi o ano em que se tornaram recorrentes as notícias sobre o tema, e aquele em que as instituições do futebol o assumiram como um problema à escala global. Das revelações da Europol em fevereiro, que detetaram  380 jogos manipulados só na Europa e disseram que era só a ponta do icebergue, a novo raide da polícia no futebol italiano, em dezembro, já não dá para ignorar. A manipulação de jogos no futebol tendo em vista o lucro com apostas é uma realidade, associada a redes criminosas internacionais e com ligações cuja dimensão começamos agora a adivinhar. Em 2013 as suspeitas chegaram também a Inglaterra e Espanha. A UEFA, que baniu dois clubes turcos das competições europeias (Besiktas e Fenerbahçe) por envolvimento em manipulação de resultados, diz que monitorizou 32 mil jogos de primeiras e segundas divisões e só 0.7 por cento levantaram suspeitas, mas define a luta contra o «match fixing» como prioridade.

Diego Costa, el español

Chegou a Portugal ainda adolescente e brasileiro, em Espanha cresceu para se afirmar como a grande figura do fantástico At. Madrid de Diego Simeone, que conseguiu crescer mesmo depois de perder Falcao. Marcou golos que se farta, mas foi também protagonista de um dos casos do ano, quando virou costas ao Brasil e a Luiz Felipe Scolari, depois de já ter vestido a camisola do escrete em dois particulares, e decidiu jogar pela seleção de Espanha. Foi convocado por Del Bosque em novembro, mas acabou por cair da lista por lesão. A novela alimentou de novo, ao mais alto nível, o debate sobre naturalizações no futebol e as fronteiras de uma seleção.

Cardozo, Jesus e a polícia

A época do Benfica acabou com a imagem de Óscar Cardozo, de cabeça perdida, a empurrar Jorge Jesus no fim da derrota frente ao V. Guimarães para a final da Taça de Portugal, o terceiro título perdido nos 15 dias de pesadelo vermelho, depois do campeonato e da Liga Europa. À indefinição sobre o futuro do próprio Jesus seguiu-se um defeso inteiro com Cardozo num limbo. Acabou por ficar, depois de pedir desculpas no canal do clube. Foi reintegrado já com a época a decorrer, três meses depois do Jamor.



Jesus ficou e voltaria a ser protagonista por se tornar mais físico no relvado, desta vez não como vítima. A 22 de setembro, em Guimarães, no fim da vitória do Benfica (1-0, curiosamente com o primeiro golo de Cardozo desde o regresso), Jesus resolveu colocar-se entre um adepto que invadiu o campo e os stewards e agentes que tentavam retirá-lo, envolvendo-se em confronto físico com as autoridades. Dessa vez, até Cardozo foi tentar acalmar os ânimos. A justiça desportiva aplicou 30 dias de castigo a Jesus, considerando que não houve agressão, na justiça civil o processo ainda corre.



Bruma: sai, não sai, não fica

A 11 de julho, depois de alimentar as expectativas sobre o seu talento no Mundial sub-20, Bruma falhava o regresso aos treinos e, em simultâneo, avançava com uma reclamação de nulidade do contrato que o ligava ao Sporting até ao fim da época 2013/14. Catio Baldé, o tutor da jovem promessa dos leões, e Bebiano Gomes, o advogado, tornaram-se protagonistas do defeso, com Bruma em parte incerta. A 24 de agosto a CAP dava razão ao Sporting. E, no início de setembro, o caso resolveu-se de forma salomónica. Bruma não ficava no Sporting nem saía livre. Em vez disso, rumava ao Galatasaray, num negócio de 10 milhões, que pode chegar a 13. O Sporting resolvia um problema e Bruma, 19 anos, voltava a poder jogar e crescer.

Izmailov, dragão mas pouco

O negócio foi fechado no início de janeiro. Marat Izmailov deixava o Sporting, ao fim de cinco épocas e meia que se tinham tornado problemáticas em Alvalade, entre lesões e questões mais ou menos pessoais que o foram afastando da equipa. Miguel Lopes fez a viagem em sentido inverso. No Dragão, o russo ganhou um Y no nome e, na primeira meia época, ainda foi opção regular: fez 15 jogos, sete como titular. Nesta temporada desapareceu. Uma aparição em campo a 18 de setembro, quando saiu do banco em casa do Áustria Viena aos 67m, depois disso nada. Deixou de aparecer nos treinos, sem que tenha havido uma explicação oficial do clube. Passaram três meses.

Assalto à Federação

Parece coisa de filme. A 10 de fevereiro, a Federação anunciava que a sua sede tinha sido assaltada durante a noite, e levados o computador do presidente Fernando Gomes e da sua assistente. Insinuava um objetivo «claro e específico» por trás do assalto e reproduzia declarações de Gomes a acompanhar, dizendo que não cederia a «estratégias de intimidação». Dias depois o mistério adensava-se, com a informação de que afinal também tinha desaparecido o computador de Vítor Pereira, o presidente do Conselho de Arbitragem. No início de dezembro foi detido um suspeito e, ao que parece, recuperados os objetos furtados. Veremos se foi o epílogo daquele que é seguramente o mais estranho caso do ano no futebol português.

Queiroz, o gesto e a seleção da Coreia

Carlos Queiroz apurou o Irão para o Mundial 2014 e será um de três selecionadores portugueses na fase final, com Paulo Bento e Fernando Santos. Mas não sem polémica, mais uma vez. Antes da decisão frente à Coreia do Sul, o treinador português envolveu-se numa troca de palavras com o seu homólogo coreano, Choi Kang-hee, no aquecimento para o duelo decisivo rumo ao Mundial. A tensão já vinha do primeiro jogo, no Irão, quando Choi acusou os adversários de comportamentos intimidatórios. De caminho, Queiroz insinuou que a Coreia levantou o pé no jogo com o Uzbequistão. A 18 de junho, o Irão foi vencer à Coreia do Sul (1-0) e garantiu o apuramento em primeiro lugar no grupo. Queiroz não resistiu a dirigir-se ao banco coreano com um gesto que os adversários qualificaram de obsceno, pedindo à FIFA que investigasse. O caso deixou marcas. Choi foi afastado depois da derrota com o Irão e mais tarde as duas federações sentiram necessidade de fazer algo para aplacar a tensão, assinando um protocolo bilateral de intercâmbio desportivo.

Mudaram nomes, a conversa continuou sujinha

Um 11º caso para assinalar um ano de muitos gritos no futebol português. Talvez não mais que o costume, mas com novos nomes na discussão. João Capela, árbitro do dérbi de abril, esteve no centro de uma das grandes polémicas de 2013. Jesus disse que foi «limpinho» e deu o pretexto para Vítor Pereira denunciar um campeonato «sujinho, sujinho», quando entregou na sala de imprensa a Liga, antes de a vencer. Num ano em que a arbitragem pareceu mais exposta do que já esteve, apesar do marco que foi o avanço na profissionalização, as críticas, mais uma vez, não dependeram da cor, só de resultados desfavoráveis. A chegada de novo presidente a Alvalade também contribuiu para aumentar o ruído. Bruno de Carvalho falou, e muito, criticou, e muito. Pelo meio cortou relações com o FC Porto por causa de um incidente pessoal com um dirigente dos dragões. E acabou o ano na sala de imprensa de Alvalade a falar em vergonha. Novidades, talvez para o ano.