Por: Pedro Morais

José Carlos Gonçalves Rodrigues, conhecido no mundo do futebol simplesmente por Zeca, encontra-se em processo de naturalização pela Grécia.

O médio que fez toda a formação no Casa Pia, clube onde chegou com 10 anos e ficou durante 12 temporadas (1998-2010). No defeso da época 2009/2010 assinou pelo Vitória de Setúbal, mas, apesar de cumprido o sonho de chegar à I Liga, acabaria por não ficar muito tempo no clube sadino, fazendo as malas no verão seguinte.

O destino? A Grécia, mais concretamente o Panathinaikos, histórico clube helénico, à altura treinado por Jesualdo Ferreira. Foi no Pana que Zeca encontrou o seu Olimpo futebolístico e, a cumprir a sexta temporada no emblema de Atenas, está para ficar. Renovou recentemente até 2019, é capitão e, além de Nikos Marinakis, é o único sobrevivente da «era Jesualdo».

É figura de proa da equipa, pela qual fez 214 jogos, mas o destaque conquistado nunca lhe valeu uma internacionalização pela seleção A portuguesa. A única ocasião em que vestiu as cores de Portugal foi pelos sub-23, no International Challenge Trophy, em 2011.

Em entrevista ao MAISFUTEBOL, o jogador português de 28 anos abriu o jogo e falou da falta de oportunidade na seleção portuguesa, da naturalização, da possível internacionalização pela Ethniki, e da vida na Grécia.

Como surgiu a oportunidade Panathinaikos?

Surgiu quando estava no Vitória de Setúbal. Na altura, o treinador era o Bruno Ribeiro e ele um dia disse-me que podia acontecer alguma coisa boa na minha carreira. Não percebi do que ele estava a falar, mas, passado uns tempos, o meu empresário ligou-me a dizer que tinha surgido uma proposta do Panathinaikos. O treinador era o professor Jesualdo Ferreira e foi ele que quis a minha contratação. Tenho muito a agradecer-lhe porque devo-lhe grande parte do que sou hoje

O Zeca e o Nikos Marinakis são os únicos sobreviventes da era Jesualdo (2011/2012). Esta temporada, é o único totalista além do guarda-redes Lukas Steele e manteve a braçadeira. Sente que começa a fazer parte da história do clube?

Tenho vindo a ganhar o meu espaço no clube e as coisas têm corrido bem. Estou cá há seis anos e consegui ser capitão, o que para mim é um motivo de orgulho e uma grande responsabilidade. Mas estou longe de ser uma figura da história do clube, principalmente porque ainda só consegui um título, infelizmente. Ficar na história passa muito por aí, não é só pelos jogos. Gostaria de ficar marcado no clube, mas neste momento sinto-me mais uma pessoa que faz parte da família.

Seis anos depois, a naturalização é um processo normal?

É uma decisão natural, este é o meu 6.º ano cá na Grécia, renovei recentemente até 2019 com o Panathinaikos e estou muito bem no clube e no país. Gosto muito de estar aqui, sinto o carinho dos gregos e tudo o que tenho e sou como jogador é graças ao Panathinaikos e à Grécia.

A seleção grega é um objetivo?

O processo de naturalização surgiu mesmo para me tornar cidadão grego. Ninguém falou antes comigo da seleção. Seis anos depois queria tornar-me cidadão. O meu presidente falou comigo e começamos a tratar dos papéis. Quem sabe no futuro surja a oportunidade de ser chamado à seleção.

A oportunidade para representar Portugal nunca surgiu?

Nunca fui contactado por ninguém da FPF para ir à seleção. É natural. Portugal é um país com muitos talentos e há muitos jovens jogadores de grande qualidade a aparecer constantemente. Nunca se proporcionou, mas se calhar, foi bom nunca ter jogado por Portugal.

Foi bom porquê?

Assim tenho oportunidade de representar outro país e poder ajudar outro grupo, sentir-me útil. Sinto que posso ser mais importante na Grécia do que em Portugal. Na Grécia também não é fácil, há muita qualidade, mas sinto que aqui posso ser mais preponderante.

Em que ponto se encontra o processo de naturalização?

O processo está em andamento, mas agora tenho uma audiência, no dia 9 de novembro. Vou ter de falar lá com os júris em grego sobre a história da Grécia. Depois, dependendo como correr, vão dar caminho à papelada e ao processo. O passo seguinte é a chegada do passaporte. Mas acredito que a partir daí tudo vai correr mais depressa.

Alguns dos portugueses que vão para a Grécia têm algumas dificuldades em estabilizar porque a realidade, principalmente futebolística, é muito diferente. O que o fez ficar?

Quando cheguei à Grécia houve um choque de realidades porque me deparei com uma situação muito diferente da que vivia em Portugal. O futebol e o ambiente em torno dele são muito distintos. Tentei perceber junto dos adeptos o porquê de terem muita raiva acumulada e este sentimento de impotência contra o sistema. Aqui as pessoas falam muito do sistema. E rapidamente acabei por me identificar com os adeptos, com o clube e com as pessoas do clube. É um emblema honesto, que tenta fazer tudo da melhor forma. A luta deles é a minha luta e foi isso que me fez ficar

O clássico Panathinaikos-Olympiakos é um dos mais famosos em todo o mundo pelo ambiente. Para um jogador, qual é a sensação de disputar uma partida assim?

É um ambiente que qualquer jogador gostava de viver. É algo inexplicável, do outro mundo. Viver algo assim é fantástico. Entrar em campo num jogo assim dá um certo nervosismo, porque é um jogo que se vive muito fora das quatro linhas

Relativamente ao futuro do Zeca, passa pela Grécia?

Quero ficar aqui, tenho essa ambição. Por mim, acabo a carreira no Panathinaikos, era algo que gostava muito. Mas nunca sabemos o que pode acontecer, o que o futuro nos reserva. A verdade é que não me vejo noutro sítio que não aqui.

Identifica-se com a vida na Grécia e com as pessoas?

A vida cá é boa e gosto mais daqui do que de Portugal. Tenho a família em Lisboa, o que é um problema grande, mas quando estou em Portugal sinto a falta da Grécia. Este país é bonito, há vida nas ruas e as pessoas são muito acessíveis, muito simpáticas e amáveis. E quando são amigas, são mesmo amigas. Se gostam, gostam, se não gostam, não gostam.

A crise grega gerou muitos problemas no país. Afetou-o de alguma forma?

Nunca vivi concretamente a crise, nunca tive a perceção direta de como ela é, mas percebo pelos funcionários do clube, pelos amigos, pelas pessoas. Na zona em que eu vivo vêem-se alguns sinais da crise. Já não há tanta gente na rua, nos cafés. Ainda há muita gente, mas não tanta como antes. As coisas não estão fáceis.

Essa fase trouxe algumas imagens de conflitos.

Nessa altura mais atribulada, os gregos andavam nervosos. Houve aqueles problemas na praça Sintagma e as pessoas andavam ansiosas. Agora já não se vê tanto isso. Claramente os gregos não estavam habituados a este tipo de problemas. É um povo que gosta de viver e aproveitar a vida. Gostam de jantar fora, de festejar, de ir a discotecas.

Relativamente à formação, cruzou-se com o Pedro Santos (Sp. Braga) no Casa Pia. Mantêm uma relação próxima?

O Pedro Santos é o meu melhor amigo. Aliás, sou padrinho do filho dele. Falamos quase todos os dias e não só sobre futebol. Temos uma amizade longa.

Tem seguido o começo de época do Pedro?

Tenho acompanhado o início de época dele e, de facto, tem sido a figura de maior destaque do Sp. Braga. Não só do Sp. Braga, mas também do campeonato. Contribui com muitos golos e assistências. Mas eu já estava à espera disto. Esperava que desse o salto mais cedo, mas ele nunca teve essa oportunidade de se afirmar. Estou muito feliz por ele, sem dúvida merece vôos mais altos. Tem qualidade para jogar num dos três grandes.