O último Estoril-Benfica foi escrito em letras maiúsculas. Em plena guerra pelo campeonato e pela permanência, as duas equipas defrontaram-se no Algarve. Muito longe da Amoreira, que vai receber neste domingo novo episódio entre as duas formações. Houve muitos berros pela mudança de estádio e porque José Veiga, então diretor-desportivo do Benfica, tinha sido até outubro de 2004 accionista dos estorilistas. Houve muita gritaria no fim por causa da arbitragem. Valeu, no entanto, o último grito de Pedro Mantorras no campeonato de 2004/05. «Mesmo a coxear, naqueles momentos finais, ele entrava e tinha a felicidade de marcar. Era mesmo um talismã», lembra ao Maisfutebol o treinador-adjunto dos encarnados da altura.

Numa semana, o jogo estava para ser no Restelo ou no Jamor. Na outra, a equipa da Linha garantia que seria na Amoreira. No dia seguinte, o jogo estava confirmado para o Algarve. O Sporting lutava com o rival pelo título e indignou-se. A classificação à entrada para a ronda 30 dizia: Benfica, 55 pontos; Sporting, 54; Sp. Braga, 54, FC Porto, 51. Mantorras tinha quatro golos na Liga.

«O jogo decorreu como muitos outros perante um adversário que lutava para se manter. As coisas complicaram-se porque o Estoril marcou primeiro», recorda Álvaro Magalhães ao Maisfutebol. «Era um jogo importante, no qual não podíamos perder pontos», acrescentou o adjunto de Giovanni Trapattoni na altura, agora treinador na Naval.

Um angolano em Abril

Paulo Sousa tinha feito o 1-0 aos 12 minutos; Rui Duarte foi expulso aos 18. O Estoril estava com dez e o técnico italiano, pouco depois, fez algo decisivo no jogo. E no campeonato. Aos 32 minutos, tirou Nuno Assis e lançou Mantorras. «Ele só podia fazer uns 20 minutos, mas nesse jogo entrou mais cedo», continuou Álvaro Magalhães.

Numa noite fria de janeiro, Pedro Mantorras regressou aos relvados após paragem prolongada e marcou o último golo na vitória sobre o Boavista (4-0). Quase dois meses depois, voltou aos golos. Agora titular e a abrir o marcador frente ao Gil Vicente (2-0). Até que chegou abril. Havia 3-3 com o Marítimo quando aos 87 minutos o angolano detonou a Luz com o 4-3 final. Era dia 3. A 16, a U. Leiria vencia 1-0 e, nos descontos, lá veio Pedro Mantorras para dar um empate precioso na corrida pelo título. A 24 de abril, o tal «jogo do Algarve».

«Ele fazia trabalho específico, não havia outra maneira. Se entrasse de início, não aguentava o jogo todo. Tinha muitas dificuldades físicas. Por isso, reservávamos o Mantorras para as partes finais. Era um jogador de quem gostávamos», referiu Álvaro Magalhães.

O volume a aumentar

Luisão empatou o jogo aos 76 minutos. Aos 78, o Estoril ficava com nove jogadores, por expulsão de João Paulo. Aos 83, Mantorras voltou a encontrar o destino. A bola foi ter com ele e, na área, só teve tempo de meter o pé esquerdo à bola e desviá-la para a baliza. 2-1.

Era o quinto golo de Mantorras na Liga 2004/05. Valeram sete pontos. Álvaro Magalhães reconhece a importância do angolano, não só nas contas do título, como no balneário. «Os jogadores gostavam muito dele. Tinha muita alegria no trabalho, apesar das dificuldades. Por causa das lesões, os outros apoiavam-no. Muitas vezes a equipa estava apática e era preciso um abanão. Vinha o Mantorras. O incrível é que ele tinha a felicidade de marcar.»

O Estoril-Benfica de 2004/05 ficará para sempre marcado pela polémica mudança de recinto. Mas também pelo fim de uma história de sonho de Pedro Mantorras, cujo último sorriso a festejar um golo nessa liga subiu o volume ao campeonato: a partir daí jogado em declarações calorosas e decisões ainda hoje debatidas consoante o encarnado ou o verde, consoante se vê uma falta de Luisão ou um erro de Ricardo.

Quanto ao angolano, voltaria a marcar golos. Mas cada vez menos. E sem valerem campeonatos como esse quinto de 2004/05.