«Em alguns treinos jogo com uma prótese e brinco com os meus amigos dizendo-lhes que com duas pernas qualquer um joga».

A frase é de Nico Pueta, exemplo máximo de superação no desporto. Nasceu em Buenos Aires, em 1983, com uma malformação congénita, que não permitiu que a sua perna esquerda se desenvolvesse como a direita. Os médicos desde cedo lhe vaticinaram uma vida numa cadeira de rodas, mas o jovem Nico nunca baixou os braços e aos 14 anos, depois de várias tentativas desde os nove, acabou por ser admitido na equipa de râguebi de San Andrés. Ao fim de quinze anos, continua por lá, a jogar só com uma perna.

«Foram cinco anos a perseguir esse objetivo. Aos meus pais criaram um cenário muito negro quando nasci, até que um médico lhes explicou que só eu é que podia decidir o que podia e não podia fazer. Operaram-me um par de vezes para alongar a perna e tive uma infância convencional. Mas chega uma altura em que tu próprio te sentes diferente e eu não o queria. Quando os meus amigos da equipa de râguebi do colégio foram para uma digressão ao Uruguai, decidi que não queria perder mais nada. Assumi a diferença e comecei a tentar jogar de todas as formas», contou o atleta numa reportagem publicada no jornal «Marca».

Chegou a experimentar atletismo, esqui, natação, mas acabou por optar pelo râguebi, depois do apoio do treinador Eduardo López Vallejos. Nicolas movimenta-se normalmente com a ajuda de uma prótese, mas no râguebi joga sem a prótese, uma vez que os regulamentos não permitem o recurso a objetos estranhos ao jogo. Nicolas adaptou-se com o recurso a técnicas de outros desportos, como o basquetebol. «Jogo só com uma perna. Os meus companheiros não me pedem que seja o mais rápido, mas sim que, num raio de quatro metros, uma vez que jogo na terceira linha, salte para placar um adversário. Em alguns treinos jogo com prótese e brinco com os meus amigos, dizendo-lhes que com duas pernas qualquer um joga», conta ainda.

Os adversários, numa primeira fase, olharam-no com estranheza, mas logo perceberam que «se estava em campo só com uma perna era porque a minha equipa confiava em mim. Não sabiam se me podiam placar ou não, mas na Argentina ninguém gosta de perder, nem a feijões. E se não me placam, eu continuo e passo a bola», prosseguiu.

O râguebi acabou por abrir muitas portas ao esforçado Pueta que, em 2007, acabou por ser reconhecido pelo «International Rugby Board» que o distinguiu com o prémio «Espírito do râguebi». «Na Argentina há muita gente que não sabe como me chamo, mas todos sabem que no San Andrés joga um rapaz sem uma perna», destaca o atleta de trinta anos.

O verdadeiro sonho de Nicolas não era apenas jogar râguebi, mas sim ser uma pessoa normal e é esse objetivo que continua a alimentar uma motivação sem limites, que o levam a ultrapassar todas as limitações impostas pela natureza. «Para mim, todos estes prémios têm o mesmo valor do que senti quando fiz o primeiro jogo, frente ao San Luis. Lembro-me tudo, desde o minuto um ao oitenta».

Na fase final da carreira, Pueta quer devolver ao râguebi tudo o que a modalidade lhe ofereceu, quer seja como treinador ou dirigente. «O râguebi é um desporto inclusivo. Jogam o alto, o baixo, o gordo, o fraco...e também um tipo só com uma perna».

Veja uma reportagem com o grande Nico Pueta: