A História de Um Jogo é uma rubrica do Maisfutebol. De 15 em 15 dias, escolhemos um dos encontros do fim de semana e partimos em busca de histórias e heróis de campeonatos passados. Desta vez, o Paços de Ferreira-FC Porto, 3-2, que valeu uma «chapada jeitosa» a Sérgio Conceição.

Era uma dessas noites de sexta-feira de Liga, mais fria pela ausência de público nas bancadas do P. Ferreira-FC Porto na Mata Real. Era aquela altura em que tudo o que se dizia em campo, não ficava no campo: todos se ouviam e todos os ouviam a eles. A jogadores, treinadores, árbitros e à própria bola. O som do jogo chegava-nos na TV quase como se lá estivéssemos.

Era uma noite em que o FC Porto vinha da Champions [2-0 ao Olympiakos], mas partia atrasado. O Benfica de Jesus só tinha vitórias e era líder com 15 pontos; os dragões terceiros com 10. Aqui chegados, a março de 2022, é possível olhar para trás e perceber onde esse mundo de outubro de 2020 se inverteu: para o Benfica, no Bessa, para o FC Porto, na Mata Real.

Na mesma jornada, com 72 horas de diferença. Duas derrotas sonoras, que tiveram reações opostas. As águias ainda não exorcizaram os fantasmas que apareceram no Bessa, o dragão não mais voltou a perder no campeonato. Mas também passou por 2021 sem pôr pé na Mata Real, onde joga domingo, desta vez à frente de tudo e todos na Liga e onde os pacenses, seguramente, tentarão repetir a proeza.

Primeiro, um treinador expulso...

Marcelo não só estava em campo naquela noite, como foi o capitão do Paços de Ferreira. A Arábia Saudita, onde joga agora, é longe, mas não tão distante que a memória da partida se apague. «A primeira coisa que me lembro é que fizemos uma grande exibição, num jogo que foi polémico, mas que conseguimos vencer», diz ao Maisfutebol.

Se o ambiente era frio ao início pela ausência de adeptos, ele rapidamente «esquentou». «Nesse dia, começámos a vencer, depois houve um penálti um pouco polémico…»

O central brasileiro foi direto a um dos lances que tanta contestação originou – se ainda não se apercebeu, esta é uma partida da liga portuguesa -, mas quando Sérgio Oliveira marcou de grande penalidade para o FC Porto, já Pepa tinha sido expulso do banco do Paços…

«Peço desculpa pela atitude depois da expulsão. Quero valorizar o jogo épico que fizemos e que fica nas nossas memórias e na história do clube.»

De facto, Pepa podia bem realçar o jogo que a equipa fez, porque quando o FC Porto marcou de penálti, o Paços continuava a vencer, fruto, também, do que foi planeado durante a semana por ele próprio.

«Sabíamos da qualidade do adversário, até porque os jogos dos grandes são sempre mais vistos. O FC Porto era fisicamente muito forte, procurava muito a profundidade e treinámos muito essa parte», assume Marcelo.

Paços de Ferreira celebra o 1-0, autoria do israelita Dor Jan

«Era uma equipa muito física, sabíamos que tínhamos de ganhar muitos duelos e saiu bem, fisicamente e mentalmente fomos superiores. Não é todos os dias que se vence o campeão em título», conta.

Pepa foi mais pormenorizado na conferência após a partida:

«Depois de conhecermos o onze do FC Porto, dei algumas indicações aos jogadores. Sabemos que é diferente jogar o Pepe ou o Diogo Leite. O Leite deixa a bola correr para fora para ligar dentro. O Hélder [Ferreira] não podia estar na pressão ao Otávio, deixava para o Luiz Carlos para impedir que a bola entrasse dentro. Enquanto o Manafá estivesse no campo visual do Hélder, ele controlava-o. A questão da profundidade também requer muita atenção aos movimentos do Marega. Já quando ele vem em apoio, não vale a pena acompanhá-lo porque ele não é tão forte de costas.»

O FC Porto de 2020 era necessariamente diferente deste de 2022. Marega era, por assim dizer, o jogador que simbolizava o futebol portista e, admite Marcelo, causava preocupação nalguns aspetos que Pepa referira.

«O Marega era muito forte, difícil de marcar. Não é muito bom tecnicamente, mas era forte a procurar espaços e a profundidade e nós preparámo-nos para isso durante a semana.» Para o brasileiro, o dragão mudou do simbolismo Marega para Vitinha, com tudo o que isso significa: «Tenho acompanhado e ele tem muita qualidade.»

O mundo inverteu-se: para Bruno Costa e Eustáquio seguramente

O maliano joga de início, como jogam Grujic que se estreou a titular, e Evanilson. Ainda assim, nesse mundo inverso que era outubro de 2020, as figuras do jogo estão do lado pacense: Bruno Costa e Stephen Eustáquio, hoje jogadores do FC Porto.

«O Eustáquio fez um grande jogo, com a sua capacidade de levar para a frente, e faz um golo. O Bruno tem muita qualidade, procura bem o passe e tem estado muito bem no FC Porto. Surpreendeu-me um pouco ele jogar como lateral, porque ele é muito inteligente no meio. Não esperava, tem corrido bem», analisa Marcelo.  

Os dois protagonistas pacenses que agora jogam no FC Porto

Bruno Costa nem celebra o golo, o passado no FC Porto pede contenção, mas Marcelo admite que no final possa ter sido diferente: «O Bruno era um palhaço, ele o Fernando [Fonseca], no pós-jogo, quando ganhávamos, partilhavam sempre bastante alegria.»

O resultado passa de 2-0 para 2-1 e com o golo de Bruno Costa para 3-1. Otávio reduz num golaço, mas o Paços mantém-se firme e só não faz o 4-2 porque Marchesíin cumpriu todas as missões que teve nesse período.

«O pior jogo desde que estou no FC Porto»

No final, Sérgio Conceição é expulso por contestar decisões, mas volta a essa derrota quase dois meses depois, um dia antes de as duas equipas se defrontarem na Taça da Liga.

Como se vê no vídeo no final desta página, o treinador admite: a derrota na Mata Real foi «uma chapada jeitosa» e «o pior jogo» desde que assumiu o dragão.  

Ao fim de 52 jogos consecutivos de campeonato, o FC Porto continua sem uma única derrota [onze empates desde então]. Não lhe chegou para ser campeão na época passada, mas serve-lhe para, desta vez, sair da Mata Real líder da Liga, aconteça o que acontecer.