A Alemanha chegou ao Campeonato do Mundo com apenas um ponta de lança «puro», Miroslav Klose, veterano à procura de se tornar o maior marcador de sempre em Mundiais. A escassez de uma referência na área foi aliás motivo de debate em torno das opções de Joachim Low. Mas essa é uma conversa mais ou menos fútil, para quem tem Thomas Müller. Três golos a Portugal como cartão de apresentação no Brasil, para começar. O primeiro «hat trick» do Mundial 2014, o oitavo golo dele em sete jogos no Campeonato do Mundo. Aos 24 anos.

Tem nome de bombardeiro mas é muito diferente do seu homónimo, Gerd Müller, o proverbial goleador alemão que foi durante muitos anos o melhor goleador dos Mundiais (hoje está a par de Klose, ambos com 14 golos, a um do brasileiro Ronaldo). É diferente do clássico avançado alemão que nos habituámos a ver, homem de área, sempre pronto a desferir uma cabeçada providencial para a baliza e para desespero dos adversários.

Müller, o Thomas, não é um 9 clássico. Não é alto, nem forte. Nem parece particularmente focado quando o vemos em campo, as meias meio enroladas, a camisola desalinhada. Mas fez da fraqueza física força.«As minhas pernas ajudaram-me. Se não podemos contar com os atributos físicos, temos de usar a cabeça e fazer os movimentos necessários para evitarmos sofrer entradas», disse uma dia ao Suddeutsche Zeitung.

Além disso, tem uma mentalidade competitiva fortíssima, dizem os treinadores com quem já trabalhou. É, antes de mais, um caso de precocidade notável. Formado nas escolas do Bayern Munique, estreou-se na equipa principal aos 18 anos e na época 2009/10, com Van Gaal, já foi presença regular na campanha que terminou com a conquista da Bundesliga, da Taça da Alemanha e com a presença na final da Liga dos Campeões, perdida para o Inter de José Mourinho.

Essa época valeu-lhe a chamada a uma seleção em mudança, muito longe já do futebol direto que caraterizava tradicionalmente a Alemanha, para o Mundial 2010. Müller encaixou como uma luva e excedeu todas as expectativas. Marcou cinco golos em seis jogos na campanha da Alemanha até ao terceiro lugar, foi o melhor marcador na África do Sul e levou o prémio de melhor jogador jovem do campeonato.

No Euro 2012 não esteve à altura de todas as expectativas, mas foi crescendo. Foi figura do Bayern Munique na época 2012/13, a temporada de todas as vitórias, incluindo a Liga dos Campeões, e voltou a sê-lo esta época sob o comando de Pep Guardiola, que também chegou a usá-lo como referência ofensiva central da equipa.

Esta terça-feira, em Salvador, fez história, para mal da seleção portuguesa. Começou por marcar com frieza a grande penalidade que colocou a Alemanha na frente, com 11 minutos de jogo.




Depois foi protagonista do lance que acabou na expulsão de Pepe. Uma disputa de bola, gestos mais bruscos, um desentendimento, Pepe a encostar a cabeça a Müller, no chão, e Portugal reduzido a dez.

Uma versão alternativa do momento:




Antes do intervalo, já depois de Hummels ter marcado o 2-0, assinou o seu segundo, perante Bruno Alves, que não conseguiu afastar a bola. E a menos de 15 minutos do final selou o hat-trick, o primeiro do Mundial 2014, após uma atrapalhação da defesa portuguesa em que apareceu para encostar.

Foi o seu jogo 50 pela Alemanha. Tem 20 golos ao todo, quatro deles na qualificação para o Brasil. E o Mundial está só a começar.

Não se fizeram esperar, claro, as comparações com craques de maior estatuto.


Ainda é cedo para tirar conclusões. Mas Müller, que o Bayern Munique segurou até 2019 antes de começar o Campeonato do Mundo, já avisou. Contem com ele.