Rui Pinto, criador da plataforma Football Leaks, admitiu esta segunda-feira em tribunal que não voltaria a fazer aquilo que fez, face aos custos sofridos a nível pessoal com todo o processo, assumindo ter a vida «de pernas para o ar».

«A verdade é que o crime, mesmo com boas intenções, não compensa. Sabendo o que sei hoje, não me voltaria a meter numa coisa destas. A minha vida está de pernas para o ar, a minha família tem sofrido bastante e o que me custa é o facto de todos os envolvidos nas denúncias... nenhum deles ficou em prisão preventiva», afirmou o arguido no julgamento a decorrer há cerca de dois anos no Juízo Central Criminal de Lisboa.

A prestar declarações ao coletivo de juízes pela primeira vez desde o arranque do julgamento, Rui Pinto reconheceu que «foram cometidos erros» no projeto Football Leaks, embora tenha enfatizado os «grandes benefícios» para a sociedade com a revelação de «informação que de outra maneira não teria sido conhecida».

«O dinheiro foi resolvendo as coisas e eu fui a única pessoa que ficou privada da liberdade, fiquei ano e meio privado da liberdade. Foram vários meses em isolamento, apenas com um contacto semanal com a família», referiu, mencionando ainda o caso Luanda Leaks. «Teve grande impacto nacional e internacional, mas Isabel dos Santos continua a viver tranquilamente a sua vida no Dubai e não pende sobre ela nenhum mandado. As coisas vão correndo talvez até à prescrição», destacou.

O criador da plataforma que expôs muitos documentos ligados a clubes de futebol portugueses e internacionais lembrou também a sua colaboração com as autoridades, nomeadamente as autoridades francesas, sem deixar de atirar críticas aos principais escritórios de advogados, que apelidou de «arquitetos dos maiores esquemas de branqueamento e fraude fiscal» e criticou o uso de sigilo entre cliente e advogado para proteção da prática de crimes.

«Entendo que não posso ser eu a mudar as coisas, não sou eu a mudar o mundo. Têm de ser as autoridades. Apesar disto, não deixei de tentar lutar pela transparência, até pela colaboração com as autoridades. A colaboração mais decisiva ocorreu com as autoridades francesas, que têm mostrado sistematicamente um grande desejo de contar com a minha ajuda», salientou.

Paralelamente, Rui Pinto assumiu também a sua contribuição para o lado ucraniano na guerra com a Rússia numa vertente tecnológica. «Temos entregado informação aos serviços de inteligência ucranianos. Temos feito análise de imagens de vigilância em sítios estratégicos e também a interceção de comunicações rádio utilizadas pelo exército russo. Tudo isto é open source intelligence. Como disse um soldado ucraniano, ‘A nossa sorte é eles serem muito estúpidos’», observou.

Rui Pinto, de 33 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.