Autor: Stéphane Régy *

A última vez que Franck Ribéry vestiu o papel de líder na equipa de França calçava um par de havaianas. Isso foi há dois anos, a 19 de junho de 2010, dois dias depois de uma derrota por 2-0 contra o México, na segunda partida do Grupo B do Campeonato do Mundo na África do Sul.

O jogador do Bayern apareceu com uma roupa de praia no mais importante programa desportivo da televisão de França. Pegou no microfone e murmurou um pedido de desculpas num francês macarrónico: «Está a ser duro para nós.»

Ribery tentava ganhar a absolvição para a equipa após uma derrota confrangedora. Acabaram eliminados na primeira fase do torneio, envolvidos em vários escândalos.

Ficou famoso o abuso verbal de Nicolas Anelka, que insultou o selecionador Raymond Domenech por Nicolas Anelka, e também o «caso Zahia», em homenagem à prostituta menor apanhada meses antes com Ribéry e Sidney Govou.

Poucas horas após a transmissão televisiva, Ribéry e os companheiros recusaram-se a treinar. O extremo apareceu como um dos líderes da greve mais ridícula da história do futebol.

Resultado: a eliminação patética na primeira fase da competição para os Les Bleus, e uma suspensão de três jogos para Ribéry, por ordem da Federação Francesa de Futebol. O escândalo passou a ser conhecido pelo «motim de Knysna».

Hoje, Franck Ribéry voltou a calçar as chuteiras e deixou as havaianas de lado. E, a julgar pelas aparições nos media, expressa-se num francês correto. Provavelmente teve aulas. Apesar da mudança de atitude, a titularidade no Europeu está longe de ser garantida. Mesmo que Dunga, o ex-selecionador do Brasil, o tenha descrito descreveu-o como «o maior talento francês, juntamente com Benzema».

Ribery tem 29 anos. Aos 23 era um herói. Tinha várias coisas a seu favor: um estilo de jogo romântico, alegre, generosa, exatamente como os fãs gostam e, acima de tudo, uma história pessoal grande, um conto encantado que o conduzia dos trapos à riqueza, algures entre Emile Zola e Jules Ferry.

O jogador cresceu no bairro de Chemin Vert, em Boulogne-Sur-Mer, na região Nord-Pas de Calais, não longe de Outreau, uma área marcada pela pobreza e que veio a público em 2004 na sequência de um caso de abuso infantil. É um lugar onde um terço da população está desempregado. Franck Ribéry é o filho de um trabalhador da construção civil e de uma dona de casa.

Enquanto criança nunca saiu de férias para longe. «Exceto uma vez, à Eurodisney» nos subúrbios parisienses. Os seus primeiros passos no futebol profissional foram marcados por cicatrizes tão profundas quanto as que tem no rosto, resultado de um acidente de carro quando tinha dois anos.

«Eu estava na parte de trás do carro e o pára-brisas explodiu na minha cara». Aos 16 foi expulso da academia do Lille por causa de uma briga na escola e aos 20 estava no sul de França a jogar na terceira divisão. Foi rejeitado por Caen, Amiens e Guingamp, até chegar ao Brest.

O primeiro passo de uma ascensão irresistível, doravante, para a fama: Metz, Galatasaray, Marselha e Bayern de Munique.

Infelizmente, a seleção de França deixou de ganhar. Ribery, como os outros, passou a ser maltratado pela opinião pública. Recentemente, redefiniu os seus objetivos e quer reconquistar a admiração do povo francês.

«Eu não sou um santo, nem um homem educado. Mas também não sou desonesto», disse ao jornal L¿Équipe, em Fevereiro. Apesar da boa vontade, a relação entre França e Ribery é ainda nebulosa.

Para mudar isso, Ribéry tem apenas uma opção: tornar a seleção de França novamente vencedora. Talvez então ele seja capaz de começar a escrever o terceiro capítulo da vida: o da redenção.

* Stéphane Régy é jornalista do So Foot. Este artigo está integrado na Euro2012 Network, uma cooperação entre alguns dos melhores meios jornalísticos dos 16 países participantes na competição.