A voz é melíflua, doce. Comunica numa paciência que se julga infinita. Uma herança do avô, certamente. Tara Gandhi, neta do Bapu, fala demoradamente connosco. Como se o tempo nada significasse. Desconhece, em absoluto, a ligação do antepassado ao mundo do futebol. Não gosta, aliás, de desporto. «Desculpe, nisso não o posso ajudar.»

Muda-se de assunto. Fala-se da vida, das memórias de infância, de Gandhi. «Ele era, acima de tudo, um organizador e um comunicador fantástico. Juntava centenas de pessoas, todas de diferente sensibilidade e níveis de intelecto, e conquistava-as. O seu maior feito foi juntar várias religiões, vários credos em redor dos ideais que julgava acertados para o quotidiano.»

Se o tivesse de descrever sumariamente, Tara Gandhi escolheria a palavra «compaixão». Sobre «a honra» do apelido que carrega, apenas procura demonstrar que a merece. «Usar o nome para juntar as pessoas em torno de um ideal é o que faço. Ele era um homem simples, sem luxos no dia-a-dia, e tento não me esquecer disso. Reflicto as minhas convicções nessa forma de viver.»

Tara é filha de Devdas Gandhi, o quarto e mais novo filho de Mohandas. Tem 77 anos e é a vice-presidente de uma fundação que gere o património deixado pelo avô. No último mês de Março esteve, curiosamente, em Portugal, a convite da Fundação Calouste Gulbenkian.

«Adorei a educação do povo português. Fui muito bem tratada», conta, antes de se despedir com um conselho. Um ensinamento. «Se estivermos à espera que os outros mudem, não nos aperfeiçoamos. Devíamos pensar nisso mais vezes.»