Tranquilidade absoluta com uma ameaça de chuva cada vez mais consistente. O céu carregava-se por cima de um estádio deserto, silencioso. Só se movia aquilo que o vento levantava e o som monocórdico do motor a diesel de um automóvel que entrava no parque de estacionamento tornava-se ensurdecedor. Isaías acabara de retirar a chave da ignição. O telemóvel tocara e o jogador vinha a conversar, enquanto confirmava que tinha trancado a viatura. Tudo normal. O ritual de sempre, talvez num passo mais acelerado que o habitual, para evitar qualquer surpresa do tecto de nuvens que ameaçava ceder. 

Preparava-se o derradeiro treino antes da visita do Farense. O tratador, de impermeável, tentava emendar a relva aqui e ali, penteando tufo por tufo para que as condições sejam as melhores. O tapete é bom, mas o inverno não perdoa. Isaías espreita o verde e parece imaginar a façanha que deseja. «Vai ser uma boa oportunidade para o clube se mostrar». O defesa conhece cada centímetro do estádio, mas opta por percorrê-lo uma vez mais com o olhar. O tema aviva-lhe a memória. «Já ganhámos ao Farense para a Taça de Portugal», lembra. «Foi em 94-95, na época em que subimos à I Liga. Tinhamos uma grande equipa. Jogavam cá o Sérgio Conceição e o Jordão». 

Isaías espera que a história se repita no desafio de amanhã. «Queremos mostrar que ainda estamos vivos», assegura. A vontade, de resto, já ultrapassa esta eliminatória e detém-se umas semanas mais adiante no calendário. «Queremos seguir em frente para depois apanhar um grande», assume. «De preferência o Benfica, que não está num grande momento». A perspectiva parece-lhe ideal para a realidade do Leça. «Seria bom para os cofres do clube». Unicamente? «Não podemos pensar em chegar à final, até porque o nosso objectivo prioritário é a manutenção na II Liga». Seria apenas um raro instante de visibilidade. 

Já venceu no Jamor 

O Leça esteve quase a ancorar na I Liga, mas acabou por encalhar num processo complicado que o fez retroceder à posição originária. Isaías já tinha saído para o Boavista, clube que lhe permitiu renovar o lote de recordações da Taça. «Ganhei a Taça de Portugal em 95-96 e posso garantir que é uma sensação única», revela, assumindo uma teoria que abranje todo o plantel. «Esta partida será boa para mim, mas creio que é melhor para os jogadores mais jovens, que nunca apareceram neste tipo de situações». 

Aproxima-se o Natal, época em que muitos dos brasileiros que jogam em Portugal se deslocam ao seu país para reunir com a família. Isaías, no entanto, é dos vários que permanecem por cá, contando os minutos até ao encontro anual que não conhece divisões, ordenados ou estatuto. «Vou estar com os Atletas de Cristo num hotel da Mealhada». A troca de pendras será inevitável. O defesa espera ainda receber os parabéns pelo sucesso sobre o Farense.