No documentário Diario ai confini del calcio (Diário nos confins do futebol) o tema central é o isolamento e o protagonista é o GSD Lampedusa. Isolamento. É uma condição ligada à insularidade de um clube incomum, talvez único.

Pietro Bartolo, presidente da instituição, dá ao Maisfutebol detalhes sobre a vida do GSD. A começar pela «contradição geográfica» da própria ilha. «Fazemos parte da placa ligada ao continente africano e somos italianos. Por isso jogámos na liga regional da Sicília».

Ora, Lampedusa e Sicília distam 200 kms e estão separadas pelo Mediterrâneo. Os jogos em casa são feitos num campo que podia perfeitamente estar integrado na paisagem urbana de Tripoli, Argel ou Casablanca.

O ar é quente, irrespirável, e a paisagem torna-se desoladora nas zonas centrais. A geografia de Lampedusa é um obstáculo para o clube da terra e uma fortaleza inexpugnável para os visitantes. Quanto mais não seja pelas viagens que impõe.

«Muitos adversários preferem perder 3-0 (por falta de comparência) do que visitar Lampedusa. O ano passado vencemos cinco jogos assim. Não gostámos e não queremos isso. Queremos jogar, divertir-nos, até para esquecer a realidade dura da nossa população», refere Pietro Bartolo.

«Um treinador nosso morreu durante um treino»

Deslocar toda a equipa do GSD Lampedusa a um jogo fora é uma odisseia. De barco ou de avião, dependendo dos custos, toda a estrutura se concentra às quatro da manhã. Cinco/seis horas depois, o plantel chega a Palermo, na Sicília. A partir daí, a deslocação é feita de autocarro.

«Após o jogo, ao fim da tarde, fazemos o percurso inverso à pressa, pois na segunda de manhã estamos a trabalhar. Tudo vale a pena para abrirmos os jornais e vermos lá o nome do nosso GSD Lampedusa», explica o presidente Pietro Bartolo.

LEIA AQUI TODA A REPORTAGEM SOBRE O GSD LAMPEDUSA

As dificuldades não ficam por aqui. O pequeno campo de futebol fica em cima do mar e no inverno as condições são «terríveis». Se chove, a terra transforma-se em lama; se há uma tempestade, o Mediterrâneo galga as pequenas vedações e inunda as quatro linhas.

«Estamos a aguardar há alguns anos o piso sintético. A Associação de Futebol da Sicília prometeu-nos isso, depois de um treinador nosso ter falecido em campo».

Sim, Orazio Arena tinha 48 anos e morreu a orientar um treino do GSD Lampedusa. «Foi atingido por um relâmpago. Somos uma ilha de bravos e um clube de resistentes».

«Esta ilha já merece o Nobel da Paz»

Marcar um golo, vencer a liga regional, jogar na Taça de Itália, tudo serve de motivação para o GSD Lampedusa seguir em frente. Mas é quando se fala em ajuda humanitária que Pietro Bartolo, também delegado de saúde local, se emociona.

«Receber um imigrante em sofrimento, dar-lhe um cobertor, água e comida, isso é o que mais mexe connosco. O futebol é outra vertente, importante também, pois até temos dois rapazes tunisinos a treinar connosco. Foram os únicos a ficar cá. Esta ilha já merece o Nobel da Paz».

No último mês de julho, o Papa visitou Lampedusa e chorou as vítimas. No campo de futebol do GSD Lampedusa. Pietro Bartolo transfere toda a sua fé para as mãos do Sumo Pontífice.

«Se ele não nos ajudar a atenuar este isolamento e a resolver as crises humanitárias que nos chegam do mar, mais ninguém nos ajuda. Os políticos falam e não agem».

A homilia do Papa em Lampedusa: