Laszlo Bölöni foi o treinador que lançou Cristiano Ronaldo no futebol profissional. O treinador romeno dirigiu o Sporting entre 2001 e 2003 e foi ele quem chamou pela primeira vez o jovem avançado à equipa principal dos leões, onde permaneceu até deixar o clube. O caminho de Ronaldo no Sporting cruzou-se com o de Toñito desde a estreia ao primeiro golo. Como uma coincidência. Mas a relação do jogador português com o técnico, mais do que coincidente, estava escrita no destino.

O caminho de Ronaldo e Bölöni cruzou-se um pouco antes de Alvalade, quando nenhum deles imaginava que o futuro de ambos estaria ligado. «Quando assinei contrato com o Sporting já tinha visto um torneio de juniores em Israel onde tinha apontado nas minhas folhas» - de um bloco de notas que acabou por ficar famoso em Portugal – «o nome de vários jogadores». «Anotei o nome deles sem saber que ia para o Sporting». Cristiano Ronaldo foi um desses nomes, como Laszlo Bölöni recordou para o Maisfutebol.

Chegado ao Sporting, o treinador foi ver jogos dos juniores para ver os jovens da seleção lusa que lhe tinham captado a atenção, como Hugo Viana ou Custódio, por exemplo. E, entre eles, havia um mais jovem do que os outros jovens: Esse jovem era Cristiano Ronaldo.

Durante uma paragem para as seleções nacionais da época 2001-02, Bölöni chamou vários jogadores à equipa principal, entre os quais o jovem prodígio, que acabou por, na mesma época, jogar em quatro escalões diferentes (sub-16, sub-17, sub-18 e seniores) – facto inédito no Sporting. E a decisão do treinador foi a de «não o deixar regressar ao seu grupo, ficar sempre com a primeira equipa».

O departamento médico «discordou que ele fosse utilizado logo nessa primeira época» na equipa principal e Ronaldo acabou por só realizar amigáveis. Não é por isso que Bölöni deixa de dizer que «ele foi brilhante». «Tecnicamente já fazia tudo certo, só falhava na força. Começámos a fazer com ele seis meses de trabalho físico no ginásio; o que ele aceitou facilmente», lembra o treinador romeno.

«Continua o mesmo: espetacular»

Na época seguinte à da sua estreia no Sporting como campeão nacional, Bölöni não perdoou. Ronaldo foi para estágio com o plantel sénior e foi mesmo titular no jogo de apresentação aos sócios em Alvalade, com o PSG. A estreia oficial na equipa principal do Sporting não demorou muito a acontecer, na pré-eliminatória da Liga dos Campeões dessa temporada. Cristiano Ronaldo tinha 17 anos e entrou aos 59 minutos para o lugar de Toñito na 1ª mão da eliminatória com o Inter de Milão, em agosto de 2002.

O primeiro golo de Ronaldo com a camisola dos leões surgiu cerca de dois meses mais tarde, em jogo do campeonato nacional, novamente com Toñito envolvido, pois foi o espanhol a lançar de calcanhar o então nº28 leonino para um slalom entre dois defesas que terminou em golo à saída do guarda-redes.

«Claro que me lembro desse golo e do passe que fiz. Porque, para além de ter sido uma jogada bonita, foi o primeiro golo de um grande amigo. Isso marca-nos sempre», admite Toñito. Um grande amigo que «sempre foi muito sorridente e brincalhão», que «adorava pregar partidas e contar anedotas, como um miúdo». «Ainda hoje é assim, tem esse lado bem-disposto. Quem tem a sorte de ser amigo dele sabe disso. Continua o mesmo: um miúdo espetacular», garantiu o espanhol ao Maisfutebol .

Toñito não vê diferenças de personalidade entre o Cristiano Ronaldo promessa de Alvalade e o Cristiano Ronaldo estrela planetária: «É o número um, mas, tirando isso, é o mesmo dos tempos do Sporting... com mais músculos. É a mesma pessoa, humilde e brincalhona, que luta para conseguir os seus objetivos.» Por isso, Ronaldo «queria fazer sempre tudo bem, não gostava de errar». «Destacava-se sempre pelo empenho, pela ambição» e «queria ser o melhor em tudo, nos treinos e nos jogos», refere Toñito apontando que «quando tinha de ser sério, era». E mais: «atento, empenhado, esforçado.» «Nunca o vi acanhado, nem perante os pesos pesados do balneário. Mas tinha muito respeito», descreve o espanhol.

Ficar nervoso «nunca foi coisa dele, nem mesmo com a idade com que chegou à equipa principal». Ronaldo «sempre foi ambicioso – já que queria estar na equipa principal e por isso não tinha medo (e sabia que podia estar ali) –, mas sempre foi humilde», assegura Toñito .

«Inteligente, aprende muito e rápido»

O jovem jogador que Laszlo Bölöni colocou na equipa principal do sporting aos 17 anos era, na altura, um futebolista que, «taticamente, precisava de aprender». Ronaldo «não tinha sido devidamente disciplinado nesse aspeto», analisou o treinador romeno. Mas «trabalhou para ser forte taticamente, para respeitar algumas coisas.» Bölöni explica que «Ronaldo tem de ser livre em campo». «E foi importante encontrar um bom caminho em que a liberdade e a responsabilidade têm de estar equilibradas», concluiu o técnico frisando que «o Ronaldo foi um jovem que conseguiu aprender».

«Ele tem muita fome de ser melhor e melhor, e melhor, a cada dia». Também por isso, «foi fácil trabalhar com ele», pois «é uma pessoa que tem muitas qualidades». Cristiano Ronaldo «é inteligente» e «aprende muito e muito rápido». «Explicava-lhes as coisas, no máximo, duas vezes», conta Bölöni.

O primeiro treinador do Ronaldo profissional conta então o que mais o surpreendeu; já nenhum deles estava no Sporting: «Fiquei surpreendido não pelo que jogou ou pela sua eficácia, mas pelo primeiro ano de Manchester United. Pensei que ele ia mostrar as suas capacidades um pouco mais tarde. Foi uma surpresa, fiquei muito contente logo por aquele primeiro ano. Tinha pensado que ele ia necessitar de um ano, ano e meio para chegar onde chegou naquele primeiro ano. Fiquei muito feliz.»

Toñito frisa que Ronaldo «acreditou em si e o sucesso só depende de si». «Chegou onde chegou pelo que lutou, não teve nem cunhas, nem ajudas. Teve mais dificuldades do que qualquer outro jogador e por isso eu o valorizo tanto», disse o antigo companheiro no Sporting reforçando: «Seria mentiroso se dissesse que imaginei logo que um dia seria o melhor. Mas via que ele tinha potencial, que era um miúdo prodígio, tal como o Quaresma ou o Carlos Martins. Mas ele destacava-se mais. Reunia todas as qualidades e tinha, acima de tudo e já naquela idade, uma mentalidade muito ganhadora. Queria ser o melhor e é.»

Assim, também para Bölöni, o título de melhor do mundo assenta bem ao seu antigo pupilo. «Embora não seja muito correto da minha parte dizê-lo», assume, o treinador romeno lembra-se de dizer que Ronaldo «tinha capacidades para ser melhor do que Eusébio ou Figo.» «Que me desculpem», pede. «Para mim, como trabalhei com ele, não posso ser 100 por cento objetivo, pois estou a falar com o coração» - adverte -, «mas, para mim, é o melhor, só tem a concorrência de Messi.»

«Mas quem é o melhor não é o mais importante», acrescenta o atual técnico do Al-Khor, pois, «para quem gosta de futebol, estamos a viver uma época em que a cada semana vemos estes dois jogadores». «Se o Ronaldo vai ser o melhor de sempre não é importante, importante é que vai estar sempre entre os melhores de todos, vai esta entre Pelé, Maradona, Cruijff, Platini, Figo ou Eusébio», conclui.

Fisicamente é muito forte

Toñito é peremptório: «As opiniões diferem porque cada um valoriza mais uns aspectos do que outros, mas, para mim ele, é o melhor do mundo, sem dúvida. E é o melhor desde que decidiu que queria ser jogador de futebol. Foi o melhor em todos os escalões e continua a sê-lo. E será até quando ele quiser.» A barreira dos 30 anos não será problema para o jogador português do Real Madrid. A resposta é de Böloni: «Fisicamente, o Ronaldo é muito forte. A sua competitividade não me surpreende nada. Cada época é mais e mais... Se não tiver lesões pode continuar a jogar neste nível facilmente.» E faz uma previsão: «O Ronaldo vai ficar sempre neste nível, não vai deixar-se cair para níveis medíocres ou jogar numa segunda divisão.»

O romeno fica «contente» lembrando que «um treinador não tem de esperar uma recompensa». «Eu estou orgulhoso e feliz porque consegui trabalhar no Sporting, onde tive muitos bons jogadores, e um deles foi Cristiano Ronaldo. Fico contente e orgulhoso por tê-lo apoiado nos primeiros passos no futebol profissional.»

Mas não recusa a sua quota-parte de responsabilidade: «O talento é dele, mas, com algumas palavras, com algumas decisões consegui facilitar a sua chegada ao nível onde vai continuar muito tempo.»

Laslzo Bölöni não tem atualmente contacto frequente com a sua antiga jovem promessa. «Hoje, Ronaldo é uma personalidade muito importante, tem outra vida, eu compreendo isso», diz. Mas diz também que o português, quando é preciso, está lá. «Quando precisei dele para uma ação de caridade na Roménia, ele apoiou no sorteio de uma camisola que rendeu bom dinheiro» revela.

E são também os melhores votos os que Bölöni faz questão de enviar a partir do Qatar, como súmula desta sua relação com o aniversariante português desta quinta-feira: «Desejo que Ronaldo e que a sua família sejam muito felizes. E também mais e mais Ronaldos para Portugal.»