Manuel Cajuda foi o padrinho de Léo Lima no futebol português. Foi ele que o lançou no Marítimo e recorda até uma frase que lhe dirigiu. «Quando o conheci disse-lhe que dificilmente estaria mais de um ano no Marítimo», conta. «É tecnicamente fabuloso, de uma criatividade espantosa, como jogador enche-me as medidas. Com a bola nos pés é do melhor calibre que existe. Tem futebol dentro dele, corre-lhe nas veias».
A transferência para o F.C. Porto, diz Cajuda, é por isso muito natural. Mas é apenas, e para já, a última página de uma história que começou há 22 anos no Rio de Janeiro (faz 23 na sexta-feira). Nos pavilhões do Bangu, de onde é natural, que o introduziram no futebol através do futebol de salão. Tal como Deco, Robinho e Ronaldo. Tinha Léo Lima então oito anos. Aos catorze passa para o futebol de onze. Sempre com a camisola dez nas costas.
Campeão mundial de sub-17 e a camisa dez no Vasco
Dois anos bastaram para o médio despertar a cobiça do Madureira, primeiro, e do Vasco da Gama, depois. Com dezassete anos, e ainda ao serviço do Madureira, sagra-se campeão mundial de sub-17 pelo escrete, ao lado de, por exemplo, Kaká, Adriano, Rochemback, e Luisão. A projecção leva-o depois para um grande do Rio de Janeiro. Cumprindo uma história já vista. O seu bisavô, Isaías Costa, tinha feito o mesmo trajecto do Madureira para o Vasco da Gama, tornando-se um ídolo vascaíno na década de 40.
Pelo meio, com apenas vinte anos, Léo Lima torna-se campeão carioca. Na final do torneio bate o Fluminense, onde brilhava Carlos Alberto, por 2-1. Naquele que foi considerado o melhor jogo do médio e que ainda hoje é muito recordado no Brasil. Uma jogada, dizem, de antologia, do portista, que num centro de letra fez a bola sobrevoar toda a defesa adversária até chegar a Souza que só teve que empurrá-la para golo do triunfo. Ele próprio, já antes, tinha feito o primeiro golo. Justamente, perante 76 mil espectadores, Léo Lima recebeu a ovação de uma vida.
O pesadelo búlgaro, quatro meses para esquecer e o futebol português
António Lopes era na altura o treinador de Léo Lima. Do futebol do agora médio azul e branco o técnico traça os maiores elogios, ao talento, à técnica individual, aos apontamentos excepcionais no passe, no remate, no drible. Até aqui não há novidade. Novidade mesmo é o elogio à personalidade, «muito forte», diz, «que lhe dá força para jogar em ambientes adversos». O episódio do passe de letra com o estádio do Maracanã cheio é o melhor exemplo. «É preciso ter uma técnica superior, mas também uma grande frieza», adianta António Lopes.
Regressando à história, estávamos em Março de 2003. Quatro meses depois Léo, juntamente com o amigo Souza que o acompanhou desde o Madureira até ao Marítimo, deixa o S. Januário. Alega salários em atraso e rescinde contrato. Deixa o Brasil e parte à aventura na Bulgária. Uma verdadeira aventura. No CSKA Sofia só receberia as luvas pela assinatura de contrato. Dos ordenados chorudos, nem cheiro. Léo Lima, e Souza, passam então quatro meses de verdadeiro pesadelo, sem dinheiro, sem ajudas e muitas vezes sem comida. Manuel Cajuda fala mesmo num Léo Lima fisicamente muito fraco que lhe chegou à Madeira. Consequências, provavelmente, da subnutrição.
Cansados de esperar pelo dinheiro que não chegava, Léo Lima e Souza rescindem contrato. Estávamos em Novembro, os mercados europeus estavam fechados, mas os jogadores preferiram assim, preferiram ficar três meses sem jogar. Só queriam sair rapidamente da Bulgária. Hoje nenhum deles fala desses quatro meses. Pedem desculpa, mas é um período que querem esquecer depressa. Sem sequer lhe tocar. Em frente, então. Para dizer, essencialmente, que o Marítimo veio logo depois. Na curva após Fevereiro de 2004. Os Barreiros seriam, porém, no caso de Léo Lima, apenas um salto para o campeão intercontinental. Onde esta terça-feira se começou a escrever um novo capítulo da história.