Duarte Gomes confirmou nesta sexta-feira que decidiu colocar um ponto final na carreira, por motivos físicos, «depois de ter esgotado de todas as formas possíveis para estar ao mais alto nível».

O árbitro da AF Lisboa explicou em conferência de imprensa que sofre de uma tendinite persistente, que o forçou já a várias intervenções cirúrgicas. 

«O grande problema foi uma tendinite e a partir daí algumas descompensações. Reconheço que a vontade e o entuasiamo fizeram acelarar recuperações de uma forma menos aconselhável porque nós não somos muito diferentes dos jogadores. Não gostamos de estar inativos, queremos recuperações rápidas e estar em campo.»

Considerado melhor árbitro nacional em 2006, com presenças em finais prestigiadas como a da Liga dos Campeões e do Europeu em 2012 como árbitro adicional, Duarte Gomes considera que fez um percurso que nunca imaginou: «Foi um percurso em que houve menos sorte no aspeto físico. Estou feliz e sou bastante realizado na arbitragem. Não tenho mágoa em abandonar com 43 anos porque prefiro fazê-lo pelo meu pé no momento em que sinto que tenho discernimento para me afastar do que eventualmente prestar um mau serviço ao futebol, estando em campo com a minha lucidez afetada por causa das lesões. Acho que faço um favor à arbitragem e ao futebol.»

Duarte Gomes garantiu que esta não é uma decisão motivada por polémicas recentes que envolveram a arbitragem. «Não saio contra o sistema», garantiu.

Pinto da Costa, em entrevista ao Porto Canal, referiu que o árbitro colocava um ponto final para não ser «um novo Marco Ferreira», que foi despromovido na última época. O árbitro responde.

«Não merecem comentário porque não são o motivo da minha saída. Não saio é contra ninguém, sempre me dei bem com os meus colegas e dirigentes, tenho uma personagem conciliadora acho eu. Não saio contra o sistema porque o mesmo sistema que beneficiou, prejudicou, e por isso é um sistema cuja regras aceitei e sou árbitro por opção. Atingi este meu limite e quero que a arbitragem continue a singrar com os elementos mais novos que tem a sua disposição.»

O juíz refere ainda que esta é uma decisão «lógica, ponderada e tranquila», após 25 anos na profissão: «Comecei com 18 anos, muito jovem, era ainda uma crainça e retiro-me aos 43, altura em que tive o discernimento, e estou grato por isso, de ouvir a voz do meu corpo e perceber que tenho algumas limitações físicas, que eu diria naturais, depois de tantos anos de carreira e muitos milhares de quilómetros em treinos e jogos.»

Sobre o futuro, o agora ex-árbitro que estava ausente desde setembro, diz que passará pela arbitragem, mas não como líder de algum órgão: «O que tenho neste momento é a ideia de terminar a carreira de árbitro e saborear a minha vida fora desse contexto. Porque sou um homem da arbitragem e não um árbitro apenas, e a arbitragem vai muito além do campo, e porque adquiri durante 25 anos, 19 dos quais no futebol profissional, 13 na UEFA e na FIFA, terei adquirido alguma experiência que seja útil para os mais novos. Há muitos caminhos diferentes na arbitragem para além do dirigismo. Não faz parte da minha pretensão ser presidente do Conselho de Arbitragem da FPF.»

Duarte Gomes explicou ainda que precisa de tempo para se desabituar de algumas rotinas e deixou várias considerações sobre as mais recentes polémicas que envolveram a arbitragem.

[A arbitragem tem sido demasiado visada esta temporada?]
«Só esta época? Nós convivemos com isso com alguma tranquilidade. Costumamos dizer que o ruído é a nossa motivação. Enquanto representantes da classe ficamos preocupados quando o ruído da frustração do erro ou do resultado dá lugar ao excesso e essa é uma linha ténue que muitas vezes é ultrapassada.»

[mas estará melhor ou pior?]
«Está mal. São permitidos excessos que se devem evitar. O que está mal é a cultura desportivas das pessoas. A educação e a formação de base. As pessoas não podem pedir um futebol pacífico e bem jogado e depois não contribuir para isso. Os maiores agentes desportivos devem ter essa responsabilidade e muitas vezes por excesso do coração ou até de linguagem acabam por não cumprir. Declarações que em nada beneficiam o futebol formam opinião pública e formam ambiente de guerrilha que todos dispensamos. Portanto acho que o bom senso deve imperar. É normal quando as pessoas não estão a vencer ou se sintam ameaçadas nas classificações tenham a tendência para ter uma postura mais explosiva. Pedimos coerência.»

[arbitragem é uma classe desfavorecida]
«É o parente pobre. A arbitragem tem uma classe muito forte liderada pelo José Gomes e com o apoio de todos os árbitros. Essa classe tem tido um contributo muito forte para a valorização daquilo que fazemos em campo. Nós estamos para o jogo como o juíz está para o tribunal. Merecemos o respeito que um juíz merece. Essa questão passará por uma estratégia diferente por quem dirige o futebol em Portugal, que devem tomar medidas regulamentares de tornar este desporto tão atrativo quanto possível, protegendo quem toma as decisões.»

[Sobre medidas a implementar]
«Medidas regulamentares que tornem os excessos de linguagem mais punitivos, medidas preventivas, ações preventivas junto dos clubes, ações de sensibilização junto dos dirigentes, dos jogadores, em início de época. Maior aproximação entre arbitragem, dirigentes de clubes e jogadores que crie empatia e confiança que se reverta em credibilidade do árbitro juntos dos jogadores. Não é uma ideia lírica.»

[sobre piores jogos da sua carreira]
«Piores jogos? Tive muitos. Cometi mutios erros e tomei muitas decisões acertadas. Sou apenas um árbitro de futebol, não sou um super-homem. Eu não sou uma televisao, já alguém dizia, eu não venço a televisão. Tenho o ângulo de campo, não o priviligeado da bancada. Tenho o suor, o cansaço a afetar a minha lucidez, não tenho uma visão raio-X de ver um corpo além do outro, se ele esta à minha frente, e portanto muitas vezes errei. Errei tanto como qualquer jogador erra. Tive erros em jogos mediáticos, com repercussão pública elevada, que me custaram até alguma coisa a nível pessoal, com ameaças, mas foram momentos de aprendizagem e tornei-me mais forte. É dificil numa carreira de mais de mil jogos apontar algum.»

[Sorteio ou nomeações?]
«Qual é a diferença de escolher árbitros ou sortear árbitros, se eles são os mesmos? Não consigo que alguém me explique isso. Tenho dez nomes e sorteá-los ou indicá-los, eles não são os mesmos? Quer que lhe fale de transparência? A transparência foi numa altura em que tinhamos sorteio e diziam que as bolas estavam quentes ou frias, ou pesadas ou leves. O que se fazia para destabilizar o sistema era dizer que havia falcatrua nas escolhas. Lembro-me bem dessas transparência. A forma de designação não é a maneira de resolver os problemas de arbitragem, é um problema mais estrutural que o tempo se encarregará de resolver.