O meu pub em Hammersmith». A esta zona da cosmopolita Londres chega gente de todo o mundo. Enquanto se bebe uma pint, fala-se de desporto: futebol, basquetebol, ténis, Fórmula 1, o que for. Depende de quem passa pela porta. O consumo é obrigatório e as bebidas nunca são por conta da casa. Aqui também se pode falar da NFL, mas se alguma vez se proferir a palavra «soccer» fica o aviso: Woody, o cozinheiro, tem cara de Vinnie Jones e andou na escola do Cantona. Ah, e é primo do Roy Keane. Cuidado...

«O quê? O Mundial de 1982 é o melhor!»

O meu pai, como sempre, a contrariar-me sempre que aparece cá no bar. Já é um ritual. Se lhe ofereço um copo de vinho, ele pede uma cerveja. E mistura as duas coisas, o que me tira do sério e obriga-me a soltar um óbvio: «Lá estás a estragar o vinho e a cerveja!». Enquanto me dá as costas e se foca na TV para ver os jogos, ri-se e saboreia aquilo. Vá-se lá perceber...

É impossível não entender o que ele diz, ainda assim. O Espanha 82 foi o melhor torneio do mundo dos mundiais. 

Eu não vivi o Mundial de 82. Mas o já vi. E foi fantástico.

Devia traçar-se uma linha entre o Mundial de 82 e o resto. O que ficou para trás não foi melhor. Mesmo que tivesse o Brasil de 70.

O que veio depois também não. Mesmo que tenha vindo o Maradona de 86. E o Maradona de 90, num torneio feio e que é quase só lembrado por isso.

O Mundial de Espanha era o patamar a atingir por todos os mundiais. Até porque tinha aquele Brasil. Que perdeu.

E porque a Itália chegou lá como chegou e venceu.

Porque teve o grito de Tardelli a festejar um golo à RFA.   

 

E porque teve aqueles equipamentos. Ou aquela cerimónia de abertura.

Porque criou na memória de rapazes um mundo novo, belo, e porque, como no Romantismo literário [a queda do Escrete de Zico e Sócrates era o primeiro sinal], se encaminhou para uma fatalidade: o Itália 90 veio pouco a seguir, não se esqueçam. E, para dar uma componente física à coisa, o Vicente Calderón em Madrid, tão bonito que ele era, ficou cheio de rugas.

Rapazes novos e rapazes trintões, como o meu pai na altura, imaginaram e perseguiram esse mundo novo e belo de quatro em quatro anos. Saíram sempre desiludidos.

Até agora.

Há tempos, em conversa com um amigo brasileiro de Fortaleza que apareceu por aqui, disse-lhe isto: «Espero uma grande Copa, das melhores a nível de futebol. O resto não sei porque não vou estar lá.»

Vou confessar: também não pensei que pudesse ser tão boa. Que pudesse ser como 82. Seria assim mais um France 98. 

Mas parti para este último dia dos oitavos com uma conclusão definitiva e já nem precisava deste Bélgica-EUA. 

Depois do Holanda-México comecei a escrever o Mundial 82 foi. E não é. Como fiz aliás ali em cima...

No final deste prolongamento entre belgas e Yankees, outra conclusão mais: com a idade, a concordância entre filhos e pais é maior. O meu que o diga. 

« O melhor mundial de sempre! Que nunca acabe, por favor!». 

Lá lhe ofereci um copo de Dão, que é da nossa terra. 

E lá misturou o raio da cerveja no vinho…

«O meu pub em Hammersmith» é um espaço fictício e de opinião do jornalista Luís Pedro Ferreira. Pode segui-lo no Twitter