Em Alvalade, Domingos Paciência é sinónimo de crença e perseverança. Nem sempre foi assim. Na década de 90, as bancadas do velhinho estádio do Sporting tremiam, de resto, só de ouvir o nome do então avançado do F.C. Porto. Entre 1993 e 1996, os leões foram derrotados três vezes consecutivas no Clássico e sempre com golos de Domingos!

Bis no pantanal, em 1996

«Só Messi conduz a bola como Domingos

0-1 em 1993/94, 0-1 em 1994/95, 0-2 em 1995/96. Como as coisas mudam, de facto. O olhar atento que agora se vê no banco de suplentes, a inteligência empírica de fato e gravata, vestiam dantes azul e branco.

Em semana de Sporting-F.C. Porto, o Maisfutebol recorda os tempos em que Domingos Paciência aterrorizava Alvalade. Para Paulo Costinha, guarda-redes dos leões nesses três jogos, a baliza pareceu maior do que nunca. E o actual treinador do Sporting, um demónio de dragão ao peito.

«Andávamos sempre às turras dentro do campo. O Domingos é uma pessoa fantástica, mas lá dentro não havia amizade possível. Foi dos melhores avançados que vi em Portugal. Como guarda-redes, o Domingos era sempre um jogador a merecer especial atenção», diz ao nosso jornal.

No Sporting estava também Nélson. O campeão do mundo de sub-20 haveria de ser, anos mais tarde, colega de Domingos no F.C. Porto. O ex-lateral direito recorda a partida de 1994/95, duplamente triste para a memória colectiva dos sportinguistas. Além da entrega do título ao adversário, o dia ficou assinalado pela queda do varandim e a morte de dois adeptos leoninos.

«Sei que essa tragédia mexeu muito com ele», refere o antigo internacional português. O jogo foi decidido da marca de grande penalidade. Vujacic derrubou Domingos e o ponta-de-lança, ao contrário do que era habitual, encarregou-se do castigo máximo.

Aloísio Alves, mítico defesa do F.C. Porto, explica ao Maisfutebol. «Eu costumava marcar os penalties, mas tinha falhado já dois numa série de cinco. Havia uma regra no clube que, quando isso acontecia, passava a marcar outro. E o Domingos avançou.» O golo haveria de simbolizar a vingança perfeita de Bobby Robson, demitido pouco tempo antes por Sousa Cintra.

O F.C. Porto iniciou nessa tarde solene um ciclo histórico, como bem lembra Ljubinko Drulovic, outro dos heróis de Robson. «Começamos aí algo que marcou o futebol português: o penta. Ainda ninguém conseguiu igualar. E não ganhamos o sexto porque... olhe, acho que já estavam fartos de ver o F.C. Porto ganhar. Lembra-se de um jogo em Campo Maior?»

A alavanca emocional azul e branca foi a morte de Rui Filipe. O grupo uniu-se ainda mais, junta Drulovic. «Nessa época vivi o episódio mais triste da minha carreira. Perdemos um amigo e já tínhamos em mente dedicar-lhe aquele título. Continuámos a jogar e felizmente conseguimos prestar-lhe essa homenagem.»

A memória perene de Rui Filipe, o talento infindável de Domingos Paciência. O terror de Alvalade.

Sporting-F.C. Porto, 0-1 (1994/95)