Olhar para o Teatro dos Sonhos e vê-lo cabisbaixo, vermelho e vazio é a mais bonita das imagens nesta noite fria de 9 de Março. De um dos cantos da bancada sul ouve-se «campeões, campeões» e é possível vislumbrar a realidade. Depois de uma noite fantástica há duas semanas, o F.C. Porto foi a um dos mais envolventes palcos do mundo dar uma lição de superioridade, capacidade de sofrimento e brilhantismo.

Com o empate arrancado nos últimos instantes do encontro, a equipa do mestre Mourinho revelou estar pronta para levantar voo e ir atrás de mais impossíveis. Aos heróis das Antas, que ficarão para sempre na história, basta o elogio pelo que fizeram, tornando-se épicos. O Porto segue em frente na Liga dos Campeões.
O ambiente de uma grande noite europeia com o electrizante Old Trafford cheio que nem um ovo e os cerca de 3500 adeptos portistas a conseguirem rivalizar nos cânticos com os entusiastas da bancada oposta, a mítica Sretford End. Vítor Baía foi assobiado, mas manteve a calma, Carlos Alberto caiu muitas vezes devido às faltas de Phill Neville e foi logo acusado de estar a simular.
Após uma pressão nem muito eficaz do United nos quinze minutos iniciais, o jogo foi abrindo e à imagem do que Mourinho desejava: jogar um futebol bonito, nunca ultra-defensivo e a pensar no empate ou na vitória. Sem conseguirem rematar com perigo à baliza de Tim Howard, os portistas deixavam aquela réstia de perigo que permitia o adversário crescer quando era realmente necessário. Giggs batia Paulo Ferreira, mas Baía anulava Van Nistelrooy, embora Costinha, aos 23 minutos, tenha revelado algum nervosismo, efectuando um passe atrasado mal medido que serviu para isolar Ruud. Sem muita velocidade, o holandês cedeu espaço a Jorge Costa e o lance perdeu-se nas mãos de Baía. Ninguém sabia, mas este era o prenúncio do que estava para vir.
Cada vez mais confiantes, os dragões esqueceram-se do erro que estavam a cometer, permitindo aos diabos vermelhos garantir a vantagem que tanto desejavam e ficarem à frente da eliminatória. O mal que ninguém desejava surgiu aos 31 minutos, quando um inesperado raide de OShea na esquerda o levou até ao duelo com Paulo Ferreira, uma simulação que enganou o lateral e um cruzamento com pé direito que encontrou Paul Scholes a caminhar para a pequena área e cabecear para o fundo das redes. Um golo clássico, à Manchester United, e também uma gigantesca desilusão para as aspirações portistas.
O final de uma fase muito difícil terminou no momento em que Jorge Costa acusou uma distensão muscular na coxa direita e teve de ser substituído por Pedro Emanuel. Os restantes sete minutos da primeira parte pertenceram ao F.C. Porto, que tudo tentou para reconquistar o empate e forçou o erro de Djemba-Djemba na área, com o camaronês a «solicitar» Carlos Alberto e este a rematar de pronto para uma defesa crucial de Tim Howard. Subsistia a esperança e assim permaneceu quando um dos auxiliares de Ivanov decidiu assinalar um fora-de-jogo inexistente a Scholes, naquele que seria o 2-0 e o ponto final na eliminatória.
O United, que tinha entrado no jogo com uma postura muito defensiva, alterou a sua estrutura após a passagem intermédia pelos balneários. O Porto mantinha a calma e fazia o seu jogo sustentado, controlando uma das melhores equipas do mundo em sua casa.
Mesmo a dois minutos do fim era difícil de acreditar que um colosso tão grande pudesse ceder: Benni McCarthy, o homem do brinco de ouro, marcou com força o livre, Howard defendeu para a frente e o amuleto portista demoliu Old Trafford, fazendo um daqueles aqueles golos para o qual está predestinado. Fabuloso, simplesmente fantástico.
Naquele instante as mais de 3500 almas portistas gritaram até perderem a voz e não mais o United conseguiu marcar. Pela primeira vez em tantos anos, o colosso do futebol mundial não vai aos quartos-de-final.