O futebol também se joga para lá das quatro linhas. Neste caso, entre as quatro paredes de uma faculdade. Por um curso que Tozé Marreco, atualmente na Naval, sempre quis tirar. Depois das peripécias próprias de alguém que cedo teve de emigrar, o avançado pode, agora, finalmente dedicar-se a um projeto de vida.

«Confesso que nunca fui um aluno muito aplicado. Sabia que era importante estudar e tinha exemplos em casa, mas não posso dizer que fosse com gosto para a escola. Escolhi, por isso, um curso que me permitiria ter uma hipótese em aberto para o futuro», explica, em conversa com o Maisfutebol.

«A psicologia aplica-se a muitas áreas, não só ao futebol, como noutras. Permite-nos gerir as emoções e, por exemplo, recuperar das quebras de confiança. Um jogador de cabeça limpa rende sempre muito mais», completa, apontando também a utilidade desta ciência para os treinadores:

«Se não souberem gerir emocionalmente um grupo, também não conseguirão chegar longe. O melhor exemplo disso é, sem dúvida, José Mourinho. Não há quem saiba provocar e aproveitar tão bem as emoções como ele. Quando se pensa no abraço de despedida do Materazzi, que nem era muito utilizado, está tudo dito.»

Uma vez com o diploma na mão (está no primeiro ano), Tozé Marreco quer aproveitar os conhecimento para aplica-los no futebol. «Gostava de continuar ligado a este meio, após deixar de jogar. Não me vejo a fazer outra coisa. Assim, junto o útil ao agradável», afiança.

Refúgio Naval

Depois de passagens pelo Zwolle (Holanda), onde conheceu talvez o melhor momento da carreira, o avançado nascido em Miranda do Corvo esteve no Alavés (Espanha), Lokomotiv Mezdra (Bulgária), Servette (Suíça), Desp. Aves e U. Madeira até aportar à Figueira da Foz.

A opção pela Naval, por duas épocas, quando estava decidido a emigrar de novo, surgiu em jeito de aposta pessoal para, dada a proximidade (está inscrito na Universidade de Coimbra), poder conciliar o futebol com os estudos. A estabilidade de estar perto da mulher e da família pela primeira vez também pesou. «Rejeitei ofertas da Escócia, França, Chipe ou Roménia.» Esclarecedor.



Para trás fica uma carreira que ainda espera ver chegar a um ponto mais alto. Em outras ocasiões, faltou-lhe «um clique» e tudo poderia ter sido diferente. «Se o Nelo Vingada tivesse continuado na Académica, se calhar teria tido sucesso na I Divisão. O mesmo na seleção (sub-21)», aponta, sem querer desculpar-se com a sorte.

A bela época (2007/08) na Holanda, que lhe valeu um lugar entre os cinco melhores marcadores da II Divisão do país, deixou-o à beira do grande salto. Surgiu a possibilidade de ir para um grande e, mais tarde, o interesse de outro, mas a o sonho acabou por cair por terra.

No estrangeiro, não mais voltou a ter um ano tão produtivo como aquele ao serviço do Zwolle. «Às vezes penso que devia era ter lá continuado. Aprendi imenso. Já nessa altura tinha um treinador [de avançados] só para trabalhar comigo. Disputámos a liguilha de acesso à I Divisão, chegámos aos quartos-de-final da Taça...», recorda.

Tantos golos e nem um de penalty

O retorno a Portugal, há dois anos, permite-lhe chegar à conclusão de que está tudo mais ou menos na mesma em relação à altura em que emigrou. «Continuamos a apostar pouco nos jogadores portugueses e isso nota-se ainda mais ao nível dos pontas-de-lança», aponta.

«Alguns bons valores como o Orlando Sá, Carlos Saleiro, ou eu próprio, são desaproveitados em prol de um estrangeiro qualquer. Chegam aos camiões e, às vezes, saem logo em Agosto por inadaptação. Contratar por catálogo ou DVD dá nisto», acrescenta.

Mesmo com tantos obstáculos, Tozé Marreco ainda acredita que pode «chegar ao topo». Tem razões para isso, acrescentamos nós. Afinal, os números falam por si. «Quantos avançados portugueses haverá que, nas últimas épocas, tenham marcado 50 golos e, atenção, nenhum de penalty?»