Não há, entre os dez primeiros países do ranking da UEFA, nenhuma Liga tão desequilibrada como a portuguesa - e tão claramente dominada por duas equipas. Esta poderia ser apenas uma frase de efeito, ditada pela observação superficial. Mas é mais do que isso e está sustentada pelos números. Veja alguns argumentos – não os únicos – que legitimam este retrato.

Temos os campeões com mais pontos

Considerando os últimos cinco anos, e incluindo a época em curso, Portugal é o país em que os campeões perdem menos pontos. Desde o registo do FC Porto de André Villas-Boas, em 2010/11, que somou 93% dos pontos possíveis, os campeões dos anos seguintes acabaram a época sempre com rendimento acima dos 80% - e o Benfica, que lidera na época em curso, vai com 86% nesta fase.

Na média dos últimos cinco títulos, os campeões portugueses tiveram de somar exatamente 86% dos pontos para garantir a festa no final. A título de comparação, mesmo noutro campeonato claramente dominado por duas equipas, o espanhol, Barcelona e Real Madrid perdem pontos com mais frequência do que Benfica e FC Porto: os campeões de Espanha, de 2010 para cá, tiveram um rendimento médio de 84%. E, como é bom lembrar, em Espanha registou-se na época passada o fenómeno At. Madrid, que quebrou a alternância de títulos entre <i>blancos</i> e blaugranas, algo que por cá não acontece desde 2002.

Os outros campeonatos onde os campeões somam, em média, mais de 80 por cento dos pontos são a Ucrânia (84%) - que até à crise politica deste ano estava a ser monopolizada pelo Shakhtar Donetsk - e a Alemanha (83%). Neste último caso, o efeito Bayern dos últimos três anos é evidente: antes, era um dos campeonatos mais equilibrados e imprevisíveis da Europa. A última equipa a conseguir quebrar a hegemonia bávara, o Dortmund, tinha chegado ao bicampeonato em 2011 e 2012 com apenas 74 e 79 por cento dos pontos, respetivamente.

Rendimento médio dos campeões nos 10 primeiros países do ranking*

Portugal, 86%
Espanha, 84%
Ucrânia, 84%
Alemanha, 83%
Itália, 78%
Inglaterra, 76%
Holanda, 76%
Rússia, 73%
Bélgica, 72%
França, 72%

* De 2010/11 para a atualidade, não contando com play-off nas Ligas com esse sistema

O terceiro ali tão longe...

Outra consequência que decorre da primeira: o desnível entre os dois primeiros e os perseguidores é o mais acentuado da Europa. Se a média percentual que separa o primeiro do segundo (8%) está em linha com o normal nas outras Ligas, já a distância entre o primeiro e o terceiro é a mais alta neste Top-10: 22 por cento, o dobro do que se regista na Premier League ou na Liga francesa, por exemplo.

O efeito prático desta distância é que só muito raramente há mais de dois candidatos «reais» ao título, ao contrário do que aconteceu, por exemplo, nas Ligas de Espanha, Inglaterra e Rússia, só para nos ficarmos pela época passada, onde o terceiro acabou a prova a apenas 3 por cento do campeão. Em Portugal, nos últimos cinco anos, a diferença entre o rendimento do campeão e o do terceiro classificado nunca foi inferior a 14%, atingindo mesmo uns espantosos 40% em 2010/11, quando o campeão FC Porto atingiu 93% e o Sporting chegou ao pódio com apenas 53%.

Diferença média entre o campeão e o terceiro nas Ligas europeias

Portugal, 22%
Alemanha, 21%
Espanha, 18%
Itália, 17%
Ucrânia, 16%
Holanda, 11%
Inglaterra, 11%
França, 11%
Bélgica, 10%
Rússia, 9%

Dois donos da bola, como só na Ucrânia

Outro dado que acentua o desequilíbrio da Liga portuguesa é a previsibilidade de atribuição dos primeiros lugares: nos últimos dez anos, só FC Porto e Benfica conquistaram o título de campeão português. A título de comparação, só na Ucrânia existe uma concentração tão grande de títulos, repartidos entre Dínamo Kiev e Shahtar Donetsk. Inglaterra, Itália e Espanha tiveram três campeões no mesmo período, e a Alemanha, antes de o Bayern tomar a competição de assalto, teve mais três equipas que chegaram ao título.

Nesse particular, a Liga mais imprevisível tem sido a francesa, com seis campeões diferentes nos últimos dez anos – uma «democratização» agora muito ameaçada pelo investimento reforçadíssimo do PSG.

Total de campeões nos últimos 10 anos

Portugal, 2
Ucrânia, 2
Inglaterra, 3
Itália, 3
Espanha, 3
Alemanha, 4
Bélgica, 4
Holanda, 4
Rússia, 4
França, 6