Londres, Hull, Vaslui, Brasov, Paphos. Cinco cidades que ampliam a dimensão da palavra «emigrante». Cinco apeadeiros importantes no percurso de Sérgio Leite, um guarda-redes português que só no exterior encontrou «oportunidades para jogar e estabilidade financeira».
As 90 internacionalizações nas selecções jovens não bastaram para que Sérgio se impusesse no futebol português. Formado no Boavista, foi consecutivamente emprestado ao Maia, Sp. Espinho, Penafiel e Leça antes de interromper uma ligação de 13 anos com os axadrezados.
Desfeito esse laço, abriu horizontes e percebeu que seria mais feliz no estrangeiro. Agora, com 28 anos, está nos cipriotas do Atromitos (cidade de Paphos), depois de passagens mais ou menos fugazes por Inglaterra (Charlton e Hull City) e Roménia (F.C. Vaslui e Brasov).
«Mesmo em clubes de ligas com dimensão mais pequena é possível receber a tempo e horas, ao contrário do que sucede em Portugal. Há equipas da III divisão no Chipre que pagam mais do que qualquer formação da Liga Vitalis em Portugal», desabafa quando é confrontado pelo Maisfutebol com a instabilidade geográfica da sua carreira.
Inglaterra, onde se disputa «o melhor campeonato do mundo»
«Em Portugal começa a ser normal não receber ao final do mês». A frase abraça alguma mágoa e serve de rampa de lançamento para uma pequena viagem ao passado.
«Veja-se o que se passa agora com o Boavista. Quando eu lá estava, os salários atrasaram-se um dia, apenas um, e o presidente João Loureiro foi logo ao balneário pedir-nos desculpa. No dia seguinte tinha o dinheiro na minha conta. Agora é o que se sabe».
Compreendida a opção de Sérgio Leite, era altura de pincelar um retrato sobre os destinos que o destino lhe reservou. A começar por Londres, capital das Terras de Sua Majestade.
«Estive no topo, no melhor campeonato do mundo. Aprendi imenso, cresci muito. Só não tive oportunidades de jogar na primeira equipa. Foi a melhor experiência que tive no estrangeiro», diz com incontido entusiasmo.
«É o país onde se trata melhor o jogo e o atleta».
Roménia, país onde as carroças perseguem Porsches
Depois, a Roménia. Primeiro em Vaslui, «uma estância turística visitada por muita gente», depois em Brasov, «uma cidade pequena e rural, perto da fronteira com a Moldávia. A uni-las, os salários «a tempo e horas» e uma «desorganização» natural num país que ainda carrega a pesada herança da ditadura de Nicolae Ceaucescu.
«Há situações que acontecem e que para nós, portugueses, são completamente irracionais e impensáveis. Mas este povo considera-as normais», refere Sérgio Leite.
«Fazíamos estágios de quatro dias para um jogo no nosso estádio, porque o jogador romeno gosta de beber uns copos e alimenta-se mal em casa. Em Inglaterra, por exemplo, jogámos contra o Chelsea e só tivemos que estar duas horas antes no balneário».
«A Roménia é um país de extremos, com muitos desequilíbrios sociais. Conseguimos ver um Porsche a passar e logo atrás vai uma carroça puxada por um cavalo».
Chipre, virado para o turismo, a aprender no futebol
No Chipre, Sérgio Leite actua na II divisão. O Atromitos lidera a classificação com oito pontos de vantagem sobre o segundo classificado e o português é o titular das redes. Aqui vai o retrato social desta ilha mediterrânica.
«A qualidade de vida é excelente. O clima ajuda e as infra-estruturas são boas. Há uma clara influência inglesa, até porque o país é muito aberto ao exterior e voltado para o turismo».
Desportivamente, o país «está a aprender». «O nível futebolístico é inferior ao que se vê em Portugal, mas os atletas estrangeiros vieram trazer alguma qualidade ao campeonato».
E Sérgio Leite está a gostar tanto do Chipre que nem se importa de passar lá o Natal. «Os voos estavam completamente cheio e não arranjei passagem para Portugal. Vou ficar por cá. Eles celebram apenas no dia 25, ao contrário do que se faz no nosso país».