Nunca se tinha visto uma equipa treinada por José Mourinho ser eliminada nos quartos de final da Liga dos Campeões: ainda não foi desta, parte um. Nunca se tinha visto o Real Madrid desperdiçar uma vantagem de 3-0 na primeira mão em provas europeias: ainda não foi desta, parte dois. E, no entanto, tanto no jogo de Londres como no de Dortmund estivemos perto, muito perto, de testemunhar desfechos inéditos.

Em Stamford Bridge o Chelsea tinha dois golos de desvantagem para recuperar, algo que na história das competições europeias só é conseguido em 25% dos casos. A baixa de Ibrahimovic parecia aumentar um pouco as probabilidades para os «blues» mas, se esse era o caso, a lesão prematura de Hazard, juntando-se à suspensão de Ramires, voltou a inclinar a balança para o lado do PSG.



Durante boa parte do primeiro tempo, os franceses mantiveram os «blues» a distância confortável da baliza de Sirigu, acentuando a sensação de que uma bola parada seria a melhor fórmula para o Chelsea reentrar na discussão da eliminatória. Um livre de Lampard deu a primeira confirmação, a segunda chegou num lançamento lateral de Ivanovic, desviado por David Luiz: a bola foi ter aos pés do recém-entrado Schürrle e Mourinho colheu os primeiros frutos vindos do banco. Com 1-0 ao intervalo, a reviravolta parecia mais perto, e a entrada dos «blues» na segunda parte foi a tradução perfeita para esse entusiasmo e por duas vezes, em lances consecutivos (53 e 54 minutos), a trave de Sirigu travou remates de Schürrle e Oscar.



E quando a pressão dos «blues» deu sinais de afrouxar, Mourinho antecipou o tudo ou nada, lançando Demba Ba para fazer companhia a Etoo, com 25 minutos por jogar. É justo dizer que o Chelsea passou então pela fase mais delicada, com dois remates de Cavani e um de Lucas a sugerirem que o KO na eliminatória não estava longe. Mas com a entrada do terceiro ponta-de-lança (Torres) para os dez minutos finais, o Chelsea ganhou capacidade de pressão na área, acabando por conseguir o 2-0 aos 88 minutos, num lance de ressaltos vários e com a conclusão feliz e algo trapalhona de Demba Ba – um dos jogadores menos utilizados do plantel dos «blues».



Foi o segundo golo vindo do banco, ironicamente apontado pelo único parisiense em campo, acentuou a certeza de que estávamos perante mais uma noite «vintage» de Mourinho, que aproveitou os festejos do golo para reeditar o sprint mais famoso da sua carreira, feito dez anos antes em Old Trafford. A corrida louca ao longo da lateral serviu tanto para partilhar os festejos com os jogadores como para dar instruções para uns minutos finais de sufoco, em que a frieza de Cech ajudou a segurar o apuramento até ao apito final de Pedro Proença.



Estava consumada a oitava meia-final da Liga dos Campeões na carreira de Mourinho, a quinta consecutiva ao serviço de três clubes diferentes: um recorde absoluto na competição, superando as sete de Alex Ferguson, e para mais conseguido em 12 participações por quatro clubes. Resta saber se à terceira semifinal no Chelsea, Mourinho consegue quebrar o enguiço das três anteriores, perdidas com o Real Madrid.

Ronaldo a sofrer por fora

Se houve algum «déjà vu» (ou «déjà blue», como na manchete do Daily Mirror) na forma como Mourinho garantiu esta noite a oitava meia-final em 12 presenças na Champions, já a chegada de Cristiano Ronaldo à sétima meia-final da carreira, em 11 participações, chegou de forma bastante invulgar: com o craque português no banco de suplentes, a roer as unhas até ao sabugo por força da má exibição da equipa.



As queixas sentidas no treino da véspera e o conforto dado pela tal vantagem nunca desperdiçada foram suficientes para Ancelotti deixar o português no banco. Em condições normais, o Real não lhe teria sentido a falta, tanto mais que aos 17 minutos beneficiou de um penálti que Di María não conseguiu aproveitar – com enorme mérito de Weidenfeller, que fez uma defesa fantástica.



Ao primeiro erro individual grave seguiu-se, aos 24 minutos, um outro ainda mais flagrante: num lance aparentemente inofensivo, Pepe (que decididamente se dá mal neste estádio) calculou mal o atraso de cabeça para Casillas e isolou Reus, que contornou o guarda-redes e marcou à vontade. Com o Real incapaz de pegar no jogo a meio-campo e de anular a mobilidade de Reus, as transições do Dortmund voltara m a fazer mossa ainda antes do intervalo, com Reus a aproveitar uma perda infantil de Illarramendi para iniciar e concluir um golo ainda pontuado por um remate de Lewandowski ao poste.



Ao intervalo, os merengues pareciam em risco de KO iminente, e Illarramendi pagou a fatura, sendo substituído por Isco para a segunda parte. Mas nem isso relançou a equipa de Ancelotti, que começou por beneficiar da pontaria desafinada de Mkhitaryan, em três ocasiões, e da exibição inspirada de Casillas, em outras três, para sobreviver ao inferno amarelo e garantir a quarta meia-final consecutiva.


Nas outras três, com Mourinho no comando, não conseguiu a passagem à final - e desta também não o conseguirá, se manifestar as mesmas fragilidades do jogo no Westfallenstadion. A começar pela ausência forçada de Cristiano Ronaldo: se para mais não serviu, a derrota com final feliz, nesta terça-feira, sublinhou à evidência, entre outras coisas, a falta que o moço lhes faz.