O dia 22 do Mundial-2014 em cinco pontos:

1. Na minha opinião, as
dez melhores exibições individuais do Mundial até agora, com 56 jogos realizados e apenas oito por efetuar, são: Tim Howard no Bélgica-EUA; Ochoa no Brasil-México; Robben no Espanha-Holanda; Van Persie no Espanha-Holanda; James no Colômbia-Uruguai; Cuadrado no Colômbia-Uruguai; Muller no Alemanha-Portugal; Rais Mbolhi no Alemanha-Argélia; Shaqiri no Suíça-Honduras e Neymar no Brasil-Camarões. Mas havia outras dez hipóteses que entrariam, com toda a propriedade, neste ranking. Está a ser o Mundial das boas surpresas, do talento sustentado, da arte aliada à estratégia. Notável, por exemplo também, Manuel Neuer, o guarda-redes da Alemanha, não só pelo que tem defendido, mas pela interpretação tática, especialmente durante a partida com a Argélia, com funções de líbero que até saía da área, para que o jogo alemão continuasse a fluir. Depois de uma fase em que os Mundiais pareciam cair em excessivo calculismo e estratégias defensivas anti-futebol (Itália-90, Alemanha-2006), este Mundial vem dar-nos uma boa notícia: nunca uma tendência é definitiva, por muito sustentada que nos possa parecer.  

2. E quanto a golos, antes de elencar os que mais me encheram as medidas, há que destacar a quantidade: porque neste caso tem mesmo significado qualidade, também. 154 golos em 56 jogos, uma impressionante média de 2,8 golos por partida. Mais nove que em todo o África do Sul-2010 e ainda há oito encontros a realizar. Sinal objetivo do futebol positivo e de qualidade a que temos assistido, com essa bela contradição de termos, também, grandes guarda-redes (a prova de que os muitos golos não estão a explicar-se apenas por incompetência das defesas). Ora, então, para mim, os melhores três golos do Mundial foram, por esta ordem: aquela receção com o peito, rotação e remate potente e colocado, de fora da área e sem deixar cair, de James no Colômbia-Uruguai; o voo de Van Persie a assinar o 1-1 do Espanha-Holanda, que virou a sorte das duas seleções para o resto do Mundial; o golaço de Tim Cahill, no Austrália-Holanda. Mas, uma vez mais, tantos outros bons exemplos caberiam aqui. Curiosamente, os mesmos três jogos dariam alternativas válidas, sobretudo a lição coletiva do segundo golo colombiano ao Uruguai ou qualquer dos dois golos de Robben aos espanhóis. Que Mundial de sonho. 

3. Neymar ou James? Oscar ou Cuadrado? Habilidade associada a doses de pragmatismo do escrete ou alegria ofensiva e incrivelmente talentosa dos «cafeteros»? Um grande, enorme, Brasil-Colômbia está reservado para esta sexta à noite. Se o França-Alemanha do Maracanã promete ser a «final europeia do Brasil-14», o duelo entre brasileiros e colombianos pode bem vir a ser a «final sul-americana» de Copa tantas vezes rotulada de «americana» (mesmo que a realidade não o confirme por completo). O Brasil no limite da pressão, entre o sonho do hex a (não muito legítimo, se olharmos apenas para a escassa qualidade do futebol produzido até agora pelo escrete) e o medo puro de falhar, perante milhões de brasileiros convencidos que o título em casa é simples obrigação. Scolari vai mudar, terá que o fazer com Luiz Gustavo suspenso, deve voltar a pôr Paulinho no onze, mas o essencial a ver neste Brasil são dois aspetos que estão a falhar: como alargar leque de «desequilíbrios», para lá do craque Neymar?; porque será que o Brasil não está a jogar com a solidez da Confederações, em que a equipa atuava mais junta, não tão distantes os jogadores uns dos outros? A Colômbia é uma das melhores seleções do Mundial até agora, ataque impressionante, James fantástico, Cudrado muito eficaz, Jackson a firmar-se no onze e a faturar. Os «cafeteros» até já defendem melhor, será que vão cometer a proeza de anular Neymar? Brasil com o fator casa, mas esta Colômbia pode mesmo conseguir tudo, se continuar com a alegria e o poder ofensivo dos primeiros quatro jogos…

4. Antes ainda do estimulante duelo sul-americano da noite, a sexta-feira dos grandes desafios começa no Maracanã, nada menos do que o palco da final a 13 de julho, com um estupendo França-Alemanha. Muito provavelmente, as duas melhores seleções europeias da prova. Só uma delas sobreviverá a tão equilibrado embate, de desfecho imprevisível. No início da competição, talvez a maioria das fichas recaísse sobre a Alemanha. A França teve sér ias dificuldades em se apurar para o Brasil, precisou de grande «remontada» depois dos 2-0 perdidos em Kiev no playoff, mas entrou à última e ter-se-á agigantado com o feito. Tem talento para dar e vender, sobretudo do meio-campo para a frente, com Matuidi, Cabeye e Pogba a darem força e solidez ao meio-campo, e várias alternativas para a concretização: Giroud, Griezmann, Valbuena ou, claro, Benzema. A ausência de Ribéry pouco tem sido lembrada, perante o poder de fogo que os «Bleus» têm revelado. Mas, enfim, a máquina alemã é sempre tendencialmente vencedora, apesar dos sinais de alguma ferrugem, em momentos do jogo com a Argélia. As dificuldades foram bem maiores que muitos imaginariam, mas o poder físico alemão no prolongamento fez a diferença e são esses pormenores que podem decidir. Dado a ter em conta: a Alemanha jogou quatro horas mais tarde e, ao contrário da França, precisou de tempo extra, sendo que terá que participar no primeiro dos quatro jogos da próxima fase. Pequena vantagem francesa, ou nem por isso? 

5. Depois desta sexta em cheio com duas «finais antecipadas» do Mundial, virá um sábado não tão impactante, mas que poderá proporcionar outros dois belos jogos. À tarde, um Argentina-Bélgica, em Brasília, com favoritismo alviceleste, mas enorme expetativa para vermos que tipo de oposição belga poderá existir no «Mané Garrincha». A dupla Messi/Di Maria tem valido aos argentinos, valeu sobretudo nos minutos finais do prolongamento com a Suíça, mas fica a ideia de que, perante um conjunto belga também ele recheado de talento, a Argentina corre o risco de, desta vez, precisar de algo mais do que a magia dos detalhes de Messi e Di Maria, numa só jogada. O fantástico duelo com os EUA deu aos belgas os «quartos», confirmou argumentos ofensivos fortíssimos (Lukaku, De Bruyne, Hazard, Mertens, até Vertonghen, que se fartou de atacar…), mas também mostrou alguns erros repetidos na forma da Bélgica se apresentar coletivamente. E, com a Argentina, certamente que a equipa de Wilmots não terá… 16 remates perigosos para que Romero brilhe tão intensamente como Howard. E para fechar os «quartos», um Holanda-Costa Rica, sábado à noite, no Arena Fonte Nova, em Salvador. Aí sim, claro favoritismo para os holandeses, por muito que a Costa Rica mereça todo o crédito pelo percurso fantástico que fez nos primeiros quatro jogos. Interrogação a tirar: será que Van Gaal vai manter uma «estratégia venenosa» que foi a tempo de virar o jogo com o México e garantira, antes, três triunfos na fase de grupos, ou, perante a nítida superioridade da Holanda sobre os «Ticos», veremos uma laranja mais… dominadora?

«Do lado de cá» é um espaço de opinião da autoria de Germano Almeida, jornalista do Maisfutebol, que aqui escreve todos os dias durante o Campeonato do Mundo. Germano Almeida é também responsável pelas crónicas «Nem de propósito» e pela rubrica «Mundo Brasil», publicadas na revista MF Total . Pode segui-lo no Twitter ou no Facebook.