«Não sei como a vida de um reformado se pode complicar tanto». Esta foi uma das frases que Dias da Cunha utilizou para começar uma conferência que durou quase duas horas a falar dos assuntos que interessam aos sportinguistas. «O ambiente lá dentro do Sporting mudou imenso», disse a certa altura. Mas o défice e a venda de património foram os temas quentes de uma conversa longa.
«Uma directa» entre ontem e hoje entre os afazeres pessoais e o discurso que teria de preparar. O ex-presidente comentou mais do que leu o discurso e começou no tema-défice.
Dias da Cunha afirmou que «existe uma enorme imprecisão na linguagem» sobre o défice, disse que Filipe Soares Franco «mostra, no mínimo, uma precipitação na procura de argumentos para justificar a venda de património».
Aplaude Liedson e deixa questões
Apesar de «aplaudir» os novos termos de contrato de Liedson, que veio engrossar as despesas de tesouraria, Dias da Cunha deixou uma pergunta no ar sobre Soares Franco. «Como é que uma pessoa que está nesta angústia pode gastar o que gastou.» Dias da Cunha pergunta também, no seu discurso, qual é verdadeiramente o défice de tesouraria, e qual a importância desse défice para a vida do clube tendo em conta que os bancos sempre acompanharam a situação.
Neste contexto entra a questão da venda de património. Dias da Cunha está contra «a venda pura e dura» dos complexos do Alvalade XXI, como a Clínica, o Alvaláxia, o edifício sede e o Homesplace. «Os contratos estabelecidos comportam uma venda definitiva ou uma venda parcial com negociação financeira», revelou. E é esta última que Dias da Cunha defende. «Como é que se pode querer vender o Alvaláxia por cinco milhões quando ele nos custou 17? Como é que os bancos vão olhar para isto? O Sporting chegou a recusar uma proposta de 25 milhões pelo centro comercial precisamente porque o fundo holandês que fez a proposta não queria entregar a gestão do complexo ao Sporting», explicou.
O ex-presidente defende que a venda parcial, mantendo-se a gestão dos edifícios, é a forma ideal de se alienar património. Associado a este assunto está um contrato estabelecido com a MDC, proprietária dos terrenos do antigo estádio, em que se garantia que naquele espaço não seria construído qualquer centro comercial que pudesse fazer concorrência ao Alvaláxia. E Dias da Cunha questiona. «Se se for para a frente com a venda do Alvaláxia como vai ser cumprido o contrato?»
Dias da Cunha acusa Soares Franco de querer um clube «só-futebol» e vê na venda ao desbarato do património um passo decisivo para isso. Afirma que Soares Franco tem um «não-projecto» e pode acabar com 100 anos de títulos em várias modalidades. «Não é por ficar com o cofre cheio que se pode continuar a acumular prejuízos. Foi na SAD que se fizeram os grandes prejuízos na ordem dos 112 milhões de euros.»
A guerra comprada ao Benfica
Dias da Cunha lembrou que o Sporting tem «um encargo de 17 milhões» com a equipa. Mas deu um exemplo de como a gestão pode ser errada apesar dos muitos lucros. «Conheço um clube que teve um ano excelente tendo feito mais valias com jogadores e que acompanhou uma época de muitos êxitos nacionais. Mas que agora tem encargos superiores aos 40 milhões», apontou.
Para mostrar o desespero de Soares Franco, Dias da Cunha lembrou uma recente polémica. «Como é que ele compra uma briga com o Benfica sabendo que a Câmara disse que não ajudaria nem o Benfica nem o Sporting nos próximos 10 anos?»
Em toques finais, Dias da Cunha considerou Soares Franco «inconstante» pelos valores que aponta para o défice e diz que o actual presidente é «incapaz de conceber um projecto». «Não me servi do Sporting. Mas os valores dos fundadores sempre se deram mal com oportunistas e oportunismos», afirmou.
Dias da Cunha garantiu no final não ser candidato à presidência, mas nem por isso «se desinteressa» do que se passa no clube. Dias Ferreira e Guilherme Lemos, dois já candidatos, estavam lá.