A confissão por parte de Maria Sharapova do uso de uma substância proibida pela Agência Mundial Antidopagem a partir de janeiro foi um terramoto cujas réplicas estão a alastrar-se para além do que respeita à tenista russa – com a suspensão de patrocínios. O ténis continua a ser o veículo dos abalos, mas um epicentro sísmico aconteceu agora na fronteira entre França e Espanha.

A tensão geográfica não é inédita. Nesta quinta-feira, o lado francês voltou a agitar uma questão sensível que deixa os espanhóis furiosos. Uma ex-governante francesa afirmou que Rafael Nadal esteve sete meses afastado da competição porque terá acusado positivo em algum controlo antidoping.

«Sabe-se que a famosa lesão de Rafael Nadal, quando ele esteve parado sete meses, deveu-se certamente a um controlo positivo», disse Roselyn Bachelot no programa «Le Grand 8», do canal franês «D8». Este foi o exemplo escolhido pela antiga ministra da Saúde e dos Desportos (2007-10) para dizer que, no ténis, não se revelam os controlos antidoping positivos nem se conhecem as sanções, mas que, depois, «fica a saber-se que um jogador ou uma jogadora têm uma lesão que os deixam afastados dos courts».

Mas este não está a ser visto apenas como um caso já de si polémico pela acusação de uma ex-governante francesa a um dos maiores ídolos do desporto espanhol. A tensão entre os dois países vizinhos agora reposta já vem de trás. E tem o doping no centro da contenda.

No início da década a Espanha era campeã do mundo e europeia de futebol em título (a caminho do «bi» europeu). Rafael Nadal já estava consagrado como o rei da terra batida e também dos Internacionais de França: o tão prestigiado torneio de Roland Garros, que o espanhol ganhou pela sexta vez em 2011 (igualando Börn Borg) e pela sétima (como recorde absoluto) em 2012 – antes ganhar mais duas vezes.

Foi precisamente no final de 2011 que Yannick Noah escreveu no jornal «Le Monde» declarações polémicas falando de «Astérix», da «poção mágica» que se toma às vezes e de «Obélix» e de quem cai no caldeirão. O atual capitão da França na Taça Davis perguntava na altura «como pode uma nação dominar tanto o desporto da noite para o dia?».

«Em Espanha houve o caso Fuentes, o maior escândalo de dopagem da história e fez-se shhhh. A maioria dos clientes do médico escaparam. Talvez porque, lá o desporto tem um papel muito importante e os seus heróis estão mais protegidos do que em outros sítios», afirmou o último francês vencedor de Roland Garros, em 1983.

As afirmações de Noah a defenderem a «poção mágica para todos» foram condenadas pelo então ministro francês do Desporto (2011-12), David Douillet, com enfase no impacto que uma «institucionalização do doping» teria na saúde dos jovens do presente e adultos do futuro.

Mas a ofensiva francesa face a Espanha na questão do doping teve outros pontos quentes. O caso Fuentes de que Noah falou referia-se á condenação de Eufemiano Fuentes, médico condenado na sequência da Operação Puerto de combate ao doping. Fuentes foi implicado pela sua influência no ciclismo, mas também trabalhava com outros atletas como futebolistas ou tenistas.

A mostarda subiu de vez ao nariz dos espanhóis quando o programa «Les Guignols» (espécie «Contra-Informação» do «Canal Plus» fez uma sátira em 2012 a propósito da situação de Alberto Contador, ciclista ilibado pela justiça desportiva do seu país e condenado internacionalmente, por doping – tendo ficado sem o título da Volta a França 2010.

Em um de vários vídeos satíricos sobre desportistas espanhóis, o programa francês coloca Rafa Nadal, Iker Casillas e outros a assinarem uma petição a favor de Contador... assinando com uma seringa. Estas imagens motivaram reações institucionais desde as federações espanholas à embaixada em França.

E a resposta a uma das acusações – «Os desportistas espanhóis não ganham por acaso» – Nadal, Pau Gasol e Andrés Iniesta foram alguns que deram a cara pelo sucesso do seu país nomeando todos os outros.

O que parecia adormecido voltou agora a acordar com as declarações de Roselyn Bachelot. Por enquanto, Rafa Nadal respondeu em defesa da sua honra. «Estive limpo em toda a carreira. Nunca tentei esconder nada do que fiz. Fiz tratamento de plasma rico em plaquetas e fi-lo com células estaminais. Não tomaria algo que o meu médico não conhecesse», disse o ten ista espanhol.

A resposta mais em força chegou do seu tio e treinador Rafa Nadal. «O advogado do Rafa está a trabalhar para tomar medidas. Em vez de demonstrar a culpa é preciso demonstrar a inocência. Essta mulher é uma imbecil», afirmou à «Cadena Cope» (segundo escreve o jornal «Marca»).