Há uma década que o Farense tem andado arredado das competições profissionais. Depois de um longo período em que o clube de Faro, ainda fundado em regime monárquico, militou na I divisão, vieram as três descidas consecutivas e a desclassificação, em 2005/06, devido a dificuldades financeiras.

Na época seguinte, foi obrigado começar por baixo, pela 2ª Divisão Distrital, mas o sonho de voltar aos grandes palcos nunca esmoreceu. Agora, dez anos depois, a equipa que até esteve numa final da Taça de Portugal (em 1989/90, frente ao Estrela da Amadora), subiu à segunda liga e a cidade em peso esteve na festa.

Três anos: uma descida e duas subidas

Foi por telefone que falámos com Serrão, guarda-redes do Farense, mas o sorriso que tinha no rosto, apesar de não ser visível, era audível. É o ponto alto do guardião (e agora também treinador de guarda-redes) em Faro, mas também houve tempo para falar do oposto.

Foi há três anos que Serrão chegou ao Farense e, logo na primeira época, o clube desceu de divisão. «Só precisávamos de um empate no último jogo, mas não o conseguimos», recorda. O que o guarda-redes não esqueceu também foi a conversa que teve nesse dia com o presidente do clube.

«Disse-me assim: "Acreditas que daqui a dois anos vamos estar nas ligas profissionais? Às vezes é preciso dar um passo atrás para dar dois à frente"», começou por contar. «Eu, que nunca tinha jogado na terceira divisão, nem falei de valores. Acreditei no que ele me disse e fiquei. E valeu a pena, claro».

A valsa classificativa que o presidente tinha previsto concretizou-se mesmo. Ao tal passo atrás, seguiram-se dois para a frente e vieram mesmo duas subidas consecutivas (a última no passado domingo). «No fim do jogo, eu falei com ele e lembrei-lhe da conversa que tivemos há dois anos», confessa Serrão.

A pergunta impunha-se: E o presidente, já fez uma nova previsão? [Risos] «Não, desta vez não previu nada. Sei que ele já disse que quer chegar à I Liga, mas nós [jogadores] ainda não pensamos nisso. Só queremos festejar a subida e ainda temos que disputar o apuramento do campeão», explica Serrão.

Mas acredita que é possível uma terceira subida seguida? «Quem sabe? Costuma dizer-se que não há duas sem três», atirou. «O Farense está a renascer, está a levantar-se, e o futebol português merece clubes como este».

14 mil pessoas no São Luís

O Farense está a levantar-se e a cidade com ele. Ou é o levantar da cidade que faz mover o clube? Para o treinador Mauro de Brito, um dos segredos para esta conquista é o apoio dos adeptos. Estiveram 14 mil pessoas no São Luís no jogo com o União de Leiria, que ditou a subida.

«Muitos clubes da I Liga gostariam de ter vivido o que o Farense viveu ontem. Foi um grande evento. Ninguém ficou indiferente», disse o técnico.



(Vídeo Rodolfo Oliveira)

Há três meses, quando chegou ao clube, o objetivo de Mauro de Brito era precisamente conseguir esta festa, a subida que o Farense ambicionava. Mas eram sete os pontos de atraso em relação ao primeiro classificado e «a margem de erro era zero», explicou.

«Sabíamos que o mínimo deslize deitava tudo a perder. O segredo foi não desmotivar e conseguimos seis vitórias consecutivas. Foi um caminho muito difícil, mas assim ainda sabe melhor», garante.

Para já, Mauro de Brito não quer pensar na próxima época. «Ainda estamos a saborear a vitória. Foi uma conquista tão dura que agora estamos a descomprimir», explica.

«Depois destes meses tão intensos, de tanta pressão acompanhada de esperança, quando o árbitro apitou para o final do jogo, foi o coroar de tudo», adianta o técnico.

Ainda há campeão da II Liga para apurar numa disputa com o Académico de Viseu e o Desportivo de Chaves, mas a subida, essa já ninguém tira ao Farense. E as enchentes prometem continuar no São Luís.