A bola estava mesmo ali e o defesa do Exeter não pensou em mais nada. Chutou-a para a frente, com toda a força possível e desesperada, em busca de qualquer coisa.

Na baliza do Forest Green estava Robert ‘Bob’ Sanchéz. O jogo chegara ao último minuto e a bola fazia a sua viagem expetável pelo ar. Inofensiva e mansa.

«Estávamos no último minuto», contou ao The Athletic o treinador do clube mais ecológico do planeta nessa época de 2018/19. «A bola bateu na área e foi em direção ao Bob. Ele tentou dominá-la, mas deixou-a passar por baixo do pé direito.»

Nesse meio ano de empréstimo ao emblema de Gloucestershire, Bob Sánchez sofreu 17 golos em 17 jogos. Manteve a baliza inviolável em duas partidas e cometeu «erros grosseiros» que não saem da cabeça de Mark Cooper, o seu ex-técnico.

Há mais. «No dérbi contra o Cheltenham, o Bob cometeu um penálti ridículo», atira o coach Cooper. «Ele não se apercebeu que tinha um adversário nas costas. Colocou a bola na relva e, quando tentou chutá-la, acertou no avançado. Empatámos 1-1.»

Dois anos e poucos meses depois desses lapsos na baliza do modestíssimo Forest Green Rovers – um clube exemplar nas questões ambientais -, Robert Sánchez chega à seleção de Espanha.

O guarda-redes é um dos três guarda-redes convocados por Luis Enrique para os próximos três jogos de qualificação para o Mundial de 2022, numa lista que também inclui o leão Pedro Porro.

VÍDEO: o «erro grosseiro» de Bob Sánchez em Exeter (aos 1m50s)

Bob Sánchez tem só 20 anos e uma carreira feita em Inglaterra. Está no sétimo ano de ligação ao Brighton e é, finalmente, titular dos Seagulls na Premier League, com um rendimento «impressionante». Principalmente para Mark Cooper, que o treinou na duríssima League Two.

«Estamos a falar dos erros, mas o Bob deu-nos grandes exibições também. Em Grimsby, um estádio cheio de gente hostil, tentaram pressioná-lo com lançamentos longos para a área. Ele saiu da baliza e agarrou-os a todos, como se fosse um veterano.»

Esse empréstimo ao Forest Green deu uma grande lição a Bob Sánchez. O espanhol, «um rapaz muito sensível», percebeu que tinha de mudar muitos aspetos na sua relação com o jogo. «Quando um clube grande empresta um guarda-redes de 20 anos, sabemos que ele não é um produto finalizado e que vai cometer muitos erros. O Robert foi vendo que ser guarda-redes não é ficar debaixo da baliza e agarrar todas as bolas.»

Nascido em La Palma, uma pequena vila próxima da cidade de Cartagena, Robert começou a jogar no clube da terra. Aos 13 anos, e já a medir quase 190 centímetros, chamou a atenção do Levante e mudou-se para as cercanias de Valência. Por pouco tempo.

«Tinha 15 anos e perguntaram-me se queria ir fazer uns testes ao Brighton. ‘Claro, é em Inglaterra!’. Sempre sonhei jogar lá e aceitei. Não tive medo, não tive saudades de casa, adorei logo tudo», contou o próprio Bob Sánchez à Marca, há uns anos.

No Brighton percorreu o trajeto normal dentro do circuito de evolução do clube: juvenis, juniores, sub21, sub23 e empréstimos a dois clubes mais pequenos. Um ao Forest Green e outro ao Rochdale, da League One, no ano seguinte.

«Tornei-me um guarda-redes muito melhor. Em Espanha tinha ganho velocidade, capacidade de reação, agilidade. No Forest e no Rochdale melhorei muito nas saídas dos postes e nas bolas pelo ar.»

Bob Sánchez fechou a época de cedência ao Rochdale com 35 jogos feitos. Voltou ao Brighton, mas à frente tinha o intocável Matt Ryan (internacional australiano, ex-Valência) e o experiente Jason Steele (nome forte nas seleções jovens de Inglaterra).

Depois, aconteceu futebol. Ryan saiu por empréstimo para o Arsenal, Steele teve um problema físico e o treinador Graham Potter olhou a sério para Sánchez. Bastaram 16 jogos seguidos na Premier League para certificar a sua qualidade e convencer Luis Enrique.

«Os meus ídolos são Iker Casillas e David de Gea. É neles que me inspiro sempre que vou para a baliza. Comecei a época como quarta opção, fui ganhar ritmo para as reservas e agora sou o titular», resumiu Bob Sánchez, ainda antes de saber que a seleção de Espanha esperava por si.

De Gea é, precisamente, um dos derradeiros obstáculos que Sánchez terá até chegar à baliza da seleção espanhola. O outro, no imediato, chama-se Unai Simón, jovem prodígio do Athletic Bilbau, também de 23 anos.

Perante esta ascensão fulminante de Bob Sánchez, o que diz o treinador que desesperou com os seus «erros grosseiros» de há dois anos? «Não estou nada surpreendido. Ele é um gigante de 1,97 metros, tem boas mãos e consegue ser fantástico. Cometeu erros graves que fizeram parte do processo de aprendizagem. Para azar meu – azar, talvez – era eu que o treinava nessa altura.»

Ricardo Zamora, José Angel Iribar, Luis Miguel Arconada, Andoni Zubizarreta, Paco Buyo, Santiago Cañizares, Iker Casillas, David de Gea.

Robert Sánchez está na fila para entrar nesta lista de elite.