Não saber o que querer é uma abstenção perigosa. Na vida e no jogo. Com Jesualdo, o Boavista terá percebido o caminho a seguir, mas é raro alguém ganhar jogos só com meia-hora de grande qualidade. O Boavista cresce, sim, embora atormentado por hesitações compreensíveis em quem mudou de líder e quer voltar a ser grande. O empate premeia a maturidade do Santa Clara, amparado no agitador Carlos Júnior.

A escolha que se colocava ao Boavista, de pés na terra após os sonhos que os nomes fortes e o dinheiro fresco trouxeram, prendia-se com o regime em que pretende ser feliz. Mais do que táticas e posicionamentos, importava perceber as opções de Jesualdo Ferreira na estratégia. E aí já não residem dúvidas: o Bessa quer voltar a ser um forte inexpugnável.

FICHA DE JOGO E VÍDEOS DO JOGO

Escrevemo-lo convictamente porque vimos a melhor meia-hora do Boavista nesta época. E não nos estamos a esquecer do baile perfeito dado ao Benfica ainda no tempo de Vasco Seabra. Durante 30 minutos, o Boavista de Jesualdo foi o Boavista dos boavisteiros que viram o clube a crescer nos anos 70 e 80, que viram o emblema a afrontar os maiores na década de 90, que foi campeão e andou pela Liga dos Campeões no início do século.

Segurança na posse de bola, movimentações imprevisíveis na frente, a doçura de Angel Gomes e a selvajaria de Elis a entenderem-se às mil maravilhas. O problema é que o Boavista chegou aos 30 minutos só com um golo marcado – passe perfeito de Show e receção/finalização exemplares de Nuno Santos – e o Santa Clara perfeitamente vivo, apesar de atordoado.

9-0 em remates e 64-36 em posse de bola ajudavam a perceber a superioridade das ideias de Jesualdo e a audácia de um futebol que, houvesse gente no estádio, levantaria as bancadas. Não chegou. E não chegou porque guiado por um desinquietador chamado Carlos, o Santa Clara fez quatro remates – os primeiros no jogo – entre os 32 e os 38 minutos. À quarta ameaça, um belo golo de cabeça e o empate feito.

30 minutos para o Boavista, oito minutos para o Santa Clara, 1-1 no marcador. É assim o futebol.

Claro que o empate e o despertar do Santa Clara, equipa num plano evolutivo superior, levantou dúvidas e reavivou velhos fantasmas no Boavista. A equipa teve alguns minutos de tremedeira, encolheu-se até, mas o intervalo deu-lhe o chá quente e a conversa paternal que precisava.

No segundo tempo, objetivamente, a palavra-chave foi equilíbrio. Houve menos oportunidades de golo, menos futebol de qualidade, e mais agressividade, intensidade e maus fígados. O jogo podia ter caído para qualquer lado, embora seja importante lembrar que a melhor oportunidade voltou a ser do Boavista.

Alberth Elis fez um «chapéu» de abas perfeitas a Marco, a bola jurava entrar na baliza açoriana e Mikel Villanueva, em esforço, tirou-a em cima da linha. Teria sido, quiçá, um prémio justo para a certeza ideológica ensinada pelo professor Jesualdo. A aula foi boa, mas a nota ainda só é razoável.

VÍDEO: o resumo da partida